Divisão do ISS entre Municípios

Objetivando fortalecer financeiramente os Municípios, o Senador Benedito de Lira (PP-AL) apresentou substitutivo ao Projeto de Lei Complementar nº 65/2012 que estabelece alíquota máxima do ISS incidente sobre serviços prestados no âmbito do turismo rural, para incluir a repartição do imposto nas operações de administração de cartão de crédito ou débito, leasing e planos de saúde.

Conforme explicações dadas por ele, uma compra feita por um domiciliado em uma cidade de Alagoas, por exemplo, mediante utilização do cartão de crédito no Rio Grande do Sul, dos 5% cobrados a título de ISS nada cabe ao Município do Estado de Alagoas onde é domiciliado o comprador.

O substitutivo apresentado busca alterar a distribuição melhor da competência impositiva do ISS entre os Municípios mediante alteração do aspecto espacial do fato gerador do imposto, acrescentando hipóteses excepcionais à regra geral de tributação no local do estabelecimento prestador. Assim, acrescenta os incisos XXIII a XXVII ao art. 3º da LC nº 116/2003 considerando como devido o imposto no local:

a) do domicilio do tomador de serviço, no caso dos serviços prestados pelas administradoras de cartão de crédito ou débitos (inciso XXIII);

b) do domicilio do tomador dos serviços dos subitens 4.22 e 4.23 (inciso XXIV);

c) da execução dos serviços dos subitens 7.13, 7.23, 7.24 e 7.25 (inciso XXV);

d) da execução dos serviços do subitem 14.14 (inciso XXVI);

e) do domicilio do tomador dos serviços do subitem 15.09 (inciso XXVII)

Ao privilegiar o local do domicilio do tomador de serviços para considerar como sendo o local da ocorrência do fato gerador do ISS, o legislador parte do princípio de que as operações, ao menos em relação à compra com cartões de crédito ou débito, ao arrendamento mercantil (leasing) e à prestação de serviços de saúde na rede conveniada a planos de saúde, somente ocorrem porque há renda disponível no município do tomador. A utilidade social desses serviços se verifica, de fato, no Município onde se encontra o tomador. É o que consta da justificação do autor do substitutivo, Senador Benedito de Lira.

A alteração proposta tem semelhança com a tese da tributação do ICMS no destino em substituição à tributação na origem, com a única distinção de que no ISS não há circulação de serviços percorrendo várias etapas que vai da fonte ao consumo final.

Dentro desta linha de raciocínio o substitutivo consigna que no caso do leasing (item 15.09) o valor do imposto “é devido ao município declarado como domicilio tributário da pessoa jurídica ou física tomadora do serviço, conforme informação prestada por este”.

Senão houver boa fé do tomador essa alteração não surtirá efeito. Um tomador domiciliado na Capital de São Paulo, maior centro de riqueza do País, poderá procurar uma agência de financiamento situada em municípios periféricos onde o ISS é menor, para fazer a operação de leasing declarando como local de seu domicílio aquele município. Melhor seria suprimir a expressão final “conforme informação prestada por este”, com o que a comprovação do domicílio far-se-ia por meios regulares utilizados para a abertura de uma conta bancária, inscrições em repartições públicas etc.

Em relação aos serviços prestados pelas administradoras de cartão de crédito/débito, o substitutivo apresentado prescreve que “os terminais e eletrônicos ou as máquinas das operações efetivadas deverão ser registrados no local do domicílio do tomador do serviço”.

É preciso esclarecer que o tomador de serviços no caso de administração de cartão de crédito/débito é o fornecedor de bens ou serviços filiado ao sistema de cartão de crédito/débito, e não o titular desse cartão. Assim sendo, em uma despesa feita com a utilização do cartão no exterior não haveria incidência do ISS, pois o fato gerador teria ocorrido fora do território nacional. Outrossim, a base de cálculo do ISS não se confunde com os valores pagos por titulares de cartões que serão repassados aos estabelecimentos filiados ao sistema de cartão. A base de cálculo será sempre representada pela parcela de valor cobrado pela administradora do cartão em termos percentuais, incidentes sobre o valor da compra de mercadorias ou serviços. Pelo menos neste caso, a propositura legislativa ao invés de fortalecer os Municípios, como pretendido pelo nobre Senador que propôs o substitutivo, retira-lhes o poder de tributar por meio do ISS.

SP, 10-8-15.

* Jurista, com 30 obras publicadas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.

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