Em poucas palavras 104

Em poucas palavras 104

Em poucas palavras 104 – série de artigos curtos do jurista Kiyoshi Harada. Acompanhe semanalmente.

Sinais de desvirtuamento do princípio da separação dos poderes

O ativismo judiciário, as verbas oriundas de emendas parlamentares, a adoção de decretos que vão além dos limites legais são sinais indicativos de que está em curso a flexibilização do princípio da independência e harmonia dos Poderes (art. 2º da CF) protegido por cláusula pétrea (inciso III, do § 4º, do art. 60 da CF).

Apesar da existência da Polícia Judiciária na estrutura administrativa do Poder Executivo integrando os órgãos de segurança pública, os tribunais superiores vêm criando, por meio de resoluções, a chamada Polícia Judicial. As Casas Legislativas, também, criaram Polícias Legislativas nas esferas da União e dos Estados.

Falta agora, o STF criar órgão legislativo e o Poder Legislativo criar órgão de julgamento. E o Executivo criar órgãos legislativos e judiciários, para dirimir as controvérsias surgidas na aplicação das leis por membros do Executivo.

Enfim, cada Poder da República tende a ser tornar um Estado independente e soberano.

É muita despesa para o pobre contribuinte brasileiro custear este Estado paquidérmico. Uma forma de conter o agigantamento dos Poderes Legislativo e Judiciário será o de conter a expansão de despesas fixadas na Lei Orçamentária Anual que crescem anualmente muito além das necessidades ao desenvolvimento de atividades típicas de cada Poder.

O uso da operação lava jato pelos Estados Unidos para enfraquecer a nossa economia

O jornal francês Le Monde Diplomatique do dia 10-4-2021, assinada por Nicolas Bourcier e Gaspard Estrada, diretor-executivo do Observatório Político da América Latina e do Caribe (Opalc) da universidade Sciences Po de Paris, revela como os Estados Unidos utilizaram-se da operação lava jato para minar a autonomia geopolítica brasileira e acabar com a ameaça representada pelo crescimento das empresas que colocariam em risco seus próprios interesses.

Não é por acaso que o juiz Sergio Moro foi fazer palestras a convite do Departamento de estado dos Estados Unidos, onde foi ovacionado e aplaudido como paladino da Justiça que vinha superando a ação dos juízes da operação mãos limpas da Itália, no combate sistemático à corrupção.

Os membros da lava jato atuaram como peões dos Estados Unidos utilizando-se do know how que lhes foi transmitido e conseguiram levar à insolvência as principais empreiteiras do País com atuação no exterior, refletindo imediatamente no nível de crescimento econômico. Executivos experientes das tradicionais empreiteiras de renome nacional e internacional foram sendo afastados e o setor corre o risco de o espaço ser ocupado por estrangeiros.

Os agentes acusados de corrupção foram afastados e punidos, mas o principal condenado por atos de corrupção no âmbito da operação lava jato já conseguiu livrar-se de uma das condenações, por meio de artimanhas processuais jamais vistas, com reflexos nas outras três.

Enquanto isso, a corrupção no Brasil continua firme como rocha. Há quem diga que a corrupção é inerente à atuação política do Estado. A impressão que se tem é que os bilhões gastos na operação lava jato foram para o brejo.

Nem em época de pandemia os recursos destinados às ações de saúde deixaram de ser poupados por agentes públicos corruptos que desviam para seus bolsos esses recursos reunidos com muito esforço pelo Erário. E as investigações a respeito até hoje não resultaram em qualquer condenação criminal, salvo os casos específicos dos governadores do Rio de Janeiro e de Santa Catarina que estão suspensos temporariamente do exercício de suas funções por determinação das respectivas Casas Legislativas que instauraram o processo de impeachment.

Mas, é certo que a operação lava jato cumpriu, a contento, um de seus objetivos não explícitos: o desmantelamento das empreiteiras de renome internacional que estavam incomodando os países desenvolvidos.

Manifestações contra racismo nos Estados Unidos

Já se tornou quase uma rotina o uso de violências por parte da polícia americana contra os negros, causando frequentes manifestações populares contra abusos e ilegalidades cometidas pelos policiais.

Mal havia cessado as manifestações de repulsa popular pelo brutal assassinado de George Floyd, um negro de 40 anos, morto por um policial, por asfixia mediante imobilização com o joelho por nove longos minutos, no domingo do dia 11-4-2021, a policial Kim Potter atirou e matou Daunte Wright, um jovem negro de 20 anos, ao confundir a pistola com a arma eletrochoque que todos policiais portam juntamente com o revolver.

A policial foi ameaçada por populares em sua residência e agora se encontra presa, sendo que a sua fiança foi arbitrada em U$100 mil.

As reações populares ocorrem de forma automática e uniforme, sem maiores exames de cada caso concreto dentro do apaixonante discurso contra o racismo.

No caso do Daunte Wright convém verificar que ele havia cometido uma infração de trânsito ao ser abordado pelos policiais. Estes constataram que sobre ele pesava um mandado de prisão. Os policiais, então, tentaram prendê-lo, mas Daunte se atracou em luta corporal contra os policiais.

A policial Kim Potter sacou o seu revolver pensando tratar-se de uma arma eletrochoque e após alguns minutos de vacilação disparou a arma; quando percebeu que havia acionada a arma letal ficou surpresa e sem ação por algum tempo. Disso se aproveitou o Daunte Wright que mesmo ferido entrou no carro e empreendeu uma fuga até que bateu o veículo em um poste vindo a falecer.

Deixando de lado as paixões e os preconceitos, cabe aqui uma pergunta: se um branco tivesse agido e morrido dessa forma haveria a mesma manifestação popular contra a truculência policial? E formulo, ainda, a segunda pergunta: é normal alguém com mandado de prisão contra si resistir à ordem legal de prisão e mesmo baleado empreender a fuga?

Nunca deixe para amanhã o que se pode fazer hoje

Todos conhecem de cor o provérbio acima, mas, nem todos compreendem o seu real significado. Alguns exemplos ajudarão a compreender o seu sentido exato:

Depois te ligo;

Depois eu faço;

Depois eu falo;

Depois eu penso nisso;

Depois eu mudo;

Depois eu cuido das crianças;

Como se o “depois” fosse o melhor. Não é, pois:

Depois o café esfria;

Depois as prioridades mudam;

Depois o encanto desaparece;

Depois as crianças crescem;

Depois as promessas são esquecidas;

Depois o cedo se transforma em tarde;

Depois a gente envelhece;

Depois a vida acaba.

O certo é viver o presente em sua plenitude, pois o futuro é incerto.

A vida, assim como a morte, é um fenômeno biológico: nasce, cresce floresce e morre.

Deixar para amanhã o que se pode fazer hoje pode significar deixar a vida passar sem ter conseguido concretizar coisa alguma neste mundo. O melhor não é o “depois”, mas é o “hoje” fazendo diariamente tudo o que for possível fazer.

CPI da Covid-19 e crise entre os Poderes

A judicialização da política por dois Senadores da oposição (Alessandro Vieira e Jorge Kajuru), que levaram o caso ao STF para ver instaurada a CPI para investigar atos comissivos e omissivos do Presidente da República no combate à Covid-19, provocou uma crise entre os Poderes.

O Presidente da República reagiu com palavras emocionais à decisão do Ministro Roberto Barroso que acolheu o pedido determinando a instauração da CPI.

Posteriormente, o Presidente Rodrigo Pacheco do Senado Federal admitiu a ampliação do objeto da investigação solicitada pelo Senador Alessandro Vieira para investigar também o desvio de recursos financeiros transferidos pela União a Estados e Municípios para sua utilização nas ações de combate à pandemia.

Como não há como investigar eventuais desvios sem a oitiva de agentes públicos estaduais e municipais, notadamente os principais gestores das despesas públicas (governadores e prefeitos), as investigações irão esbarrar na autonomia e independências da Casas Legislativas dos Estados e dos Municípios. Aliás, os Estados do Rio de Janeiro e de Santa Catarina já abriram as suas investigações que culminaram com o afastamento temporário dos respectivos governadores das suas funções.

Eventual invasão de competência irá parar no STF ampliando o leque de confronto entre as instituições públicas, neste momento em que há necessidade da união de forças de todos os entes federativos e de todos os Poderes.

SP, 19-4-2021.

Por Kiyoshi Harada

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