Apreensão de passaporte

Apreensão de passaporte e da CNH do devedor

Várias decisões monocráticas e também dos tribunais vêm se utilizado de meio coercitivo para obrigar o devedor a cumprir a sua obrigação mediante a apreensão do passaporte e da Carteira Nacional de Habilitação – CNH – do devedor.

Trata-se, sem dúvida, de uma sanção política ao lado de outras tantas medidas, como o protesto da Certidão de Dívida Ativa – CDA –, a inscrição do nome do devedor no CADIN, a proibição de expedir certidão positiva com efeito de negativa, o arquivamento de alterações de contratos sociais na Junta Comercial, a vedação de registrar escrituras aquisitivas no Registro de Imóveis competente e a proibição de participar de certames licitatórios, dentre outras proibições.

Em matéria tributária, o Supremo Tribunal Federal proibiu o uso de sanção política para a percepção pelo fisco dos seus créditos tributários, que devem ser cobrados executivamente em que se assegura ao executado o princípio do contraditório e ampla defesa, que é um direito subjetivo de natureza constitucional, protegido em nível de cláusula pétrea.

         São seguintes dos enunciados dessas súmulas:

Súmula 70: “É inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para a cobrança de tributo”.

Súmula 323: “É inadmissível a apreensão de mercadoria como meio coercitivo para pagamento de tributos”.

Súmula 547: “Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais”.

Como se verifica, essas súmulas têm caráter ilustrativo, editadas em função de cada caso concreto submetido à apreciação da Corte Suprema.

A Súmula 323, por exemplo, foi editada para coibir a ação do fisco que promovia a apreensão da mercadoria altamente perecíveis para forçar o devedor optar entre pagar o tributo, ou perder toda a mercadoria apreendida.

Na época, firmou-se o entendimento de que a apreensão é um instrumento legal destinado tão somente à comprovação material da infração fiscal.

Logo, lavrado o competente auto de infração não se justifica a continuidade de apreensão. Daí a Súmula sob comento.

As Súmulas 70 e 547, por sua vez, têm aplicação para os casos de proibição de o devedor imprimir notas fiscais, ou bloqueio de código para impressão de nota fiscal eletrônica, inativação do CNPJ etc, hipóteses cada vez mais frequentes na atualidade caracterizada pelo uso abusivo da informática.

As sanções políticas aplicadas a devedores de tributos, ultimamente, passaram a ser aplicadas, também, na esfera de obrigações civis, como forma de abreviar o processo de cobrança por meio de morosa via de ação executiva ou de ação ordinária de cobrança.

Nos processos judiciais o credor tem encontrado inúmeros entraves a começar por recursos protelatórios contando com a morosidade da Justiça.

Outro obstáculo aparentemente intransponível diz respeito ao sumiço dos bens penhoráveis para satisfação do débito. Os bens são transferidos para terceiros (laranjas), ou desviados para os paraísos fiscais (offshores), além de ter a conta bancária praticamente gerada para impossibilitar o bloqueio on-line.

Infelizmente a ação de maus devedores inescrupulosos dão aso à utilização de instrumentos extremos que inviabilizam o devido processo legal e o princípio do contraditório e ampla defesa.

Pois bem, dentro desse quadro o STF irá julgar no dia 4-11-2021 a ADI nº 5.941 para decidir se é ou não constitucional ou não a apreensão do passaporte e da CNH do devedor, com o objetivo de assegurar o pagamento do débito sem as agruras de um processo de cobrança por via ordinária ou por meio de execução.

As três Súmulas retrocitadas estão a indicar a vedação desse tipo de sanção política como sucedâneo à ação judicial competente. Porém, em face de conjuntura atual caracterizada pela excessiva morosidade da atuação jurisdicional, de um lado, e o aumento espantoso de devedores inadimplentes que lançam mão de procedimentos condenáveis para frustrar a ação da justiça, de outro lado, não será uma surpresa se a Corte maior tolerar esse tipo de sanção política que tem previsão no CPC de 2015, para propiciar ao credor a única opção para a percepção de seu crédito.

SP, 8-11-2021.

Por Kiyoshi Harada

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