Kiyoshi Harada
O IPI, assim como o ICMS, é um imposto não cumulativo, isto é, compensa-se na saída o imposto incidente na etapa anterior.
Em relação ao ICMS há disposição constitucional expressa das hipóteses em que não se permite a apropriação do crédito, bem como da obrigatoriedade de anular os créditos das operações anteriores (art. 155, § 2º, II, a e b da CF).
São os casos de isenção e de não incidência expressa que quando previstas na Constituição significa imunidade tributária.
Sempre criticamos a determinação constitucional de estorno dos créditos das etapas anteriores, porque o estado pode aumentar a sua arrecadação por meio de isenção.
De fato, quanto mais próximo do final do ciclo de comercialização for concedida a isenção, maior será o montante dos créditos a serem estornados. A isso denominamos de isenção de efeito invertido e pervertido1.
O estorno deveria limitar-se apenas à etapa que antecede imediatamente à etapa da isenção. Não faz sentido, por exemplo, perder R$ 10 com a isenção e ganhar R$ 25 ou R$ 30 por meio de estorno de créditos de todas as etapas anteriores à concessão de isenção ou de não incidência expressa.
No IPI não há semelhante dispositivo, limitando-se a prescrever que o imposto “será não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores.
A expressão final “com o montante cobrado nas anteriores”, por óbvio, pressupõe-se que nessas operações anteriores tenha havido uma industrialização, isto é, produto que tenha sido submetido a qualquer operação que lhe modifique a natureza ou finalidade ou aperfeiçoe para o consumo” (art. 46, parágrafo único do CTN)
Dentro desse amplo conceito, o sangue humano acondicionado, a madeira cerrada, o peixe ornamental etc. são considerados produtos industrializados, assim como frutas embaladas, por exemplo.
Analisemos, agora, o tema deste artigo.
A jurisprudência do STJ tem variado periodicamente, ora decidindo a favor da Fazenda vedando o crédito dos insumos, ora favorecendo o contribuinte permitindo o crédito dos insumos utilizados na fabricação de produtos imunes.
Mas, até o ano de 2021, a jurisprudência do STJ era pela negativa do crédito, favorecendo a Fazenda.
Contudo, no dia 1-2-2022, no julgamento do Tema nº 1247, em sede de recursos repetitivo, portanto, com efeito vinculante, a primeira seção do STJ decidiu pela possibilidade de o contribuinte ter direito ao crédito do IPI sobre insumos ou matérias-primas usados na fabricação de produtos imunes (EResp nº 1.213.143)
Esse posicionamento decorre do caráter não cumulativo do IPI.
Realmente, a não se permitir os créditos relativos a insumos utilizados na fabricação de produtos imunes acabaria tributando indiretamente o produto acabado, pois os valores dos insumos integram o valor do produto industrializado imune.
Por isso, o art. 11 da Lei nº 9.779, de 19 de janeiro de 1999 prescreveu:
“Art. 11. O saldo credor do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, acumulado em cada trimestre-calendário, decorrente de aquisição de matéria-prima, produto intermediário e material de embalagem, aplicados na industrialização, inclusive de produto isento ou tributado à alíquota zero, que o contribuinte não puder compensar com o IPI devido na saída de outros produtos, poderá ser utilizado de conformidade com o disposto nos arts. 73 e 74 da Lei no 9.430, de 27 de dezembro de 1996, observadas normas expedidas pela Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda.”
O STJ interpretando conjugadamente o art. 153, § 3º da CF e o art. 11 da Lei nº 9.779/1999 firmou a tese, em caráter vinculante, que os insumos ou matérias-primas utilizados na fabricação de produtos imunes podem gerar créditos do IPI.
SP, 21-4-2025.
* Texto publicado no Migalhas, edição nº 6.088, de 29-4-2025.
1 Cf. nosso Direito Financeiro e Tributário, 33ª edição, 2023, p. 570