A Lei nº 13146 de 06 de julho de 2015, que instituiu o Estatuto da Pessoa com Deficiência, cria uma terceira medida protetiva às pessoas em situação de vulnerabilidade. Além dos conhecidos institutos da tutela e curatela, constantes no Código Civil surge a Tomada de Decisão Apoiada.
A tutela é um conjunto de direitos e obrigações conferidos pela lei a um terceiro, para que proteja a pessoa do menor não antecipado e que não se encontra sob o poder familiar.
Os filhos menores são postos em tutela em caso de falecimento dos pais ou sendo estes julgados ausentes e no caso de os pais decaírem do poder familiar.
Existem dois tipos de tutela, a testamentária onde é definida a nomeação de tutor pelos genitores por testamento ou outro documento autêntico e a tutela legítima quando não há testamento e a lei a deferirá a um de seus parentes consanguíneos, ouvindo-se, se possível, o menor. Tal nomeação será feita pelo juiz que deverá observar a ordem legal que segue:
a) os ascendentes, preferindo o de grau mais próximo ao mais remoto;
b) os irmãos ou os tios, sendo preferido o mais próximo ao mais remoto e, no mesmo grau, o mais velho ao mais moço.
Entretanto, em qualquer dos casos, o Juiz pode alterar a ordem legal acima escolhendo o mais apto para exercer a tutela, sempre atendendo aos interesses do menor.
O Juiz por decisão judicial deferirá a tutela dativa para suprir a falta de tutor testamentário ou tutor legítimo.
Incumbe ao tutor, quanto à pessoa do menor, dirigir-lhe a educação, defendê-lo e prestar-lhe alimentos, conforme haveres em condição, reclamar do juiz providências, se houver por bem, quando o menor necessitar de correção.
Cabe, ainda, ao tutor, sob a inspeção do juiz, administrar os bens do tutelado, em provento deste, cumprindo seus deveres com zelo e boa fé.
Compete, ainda, ao tutor, sem autorização do juiz.
a) representar o menor, até os dezoitos anos, nos atos da vida civil, e assisti-lo, após essa idade, nos atos em que faz parte;
b) receber as rendas e pensões do menor e as garantias a ele devidas;
c) fazer-lhes as despesas de subsistência e educação, bem como as de administração, conservação e melhoramentos de seus bens;
d) alienar os bens do menor destinados a venda;
e) promover-lhe, mediante preço conveniente, o arrendamento de bens de raiz.
O tutor, mediante autorização do juiz pode:
a) pagar as dívidas do menor;
b) aceitar por ele heranças, legados ou doações, ainda que com encargos;
c) transigir;
d) vende-lhe os bens móveis, cuja conservação não convier, e os imóveis nos caso em que for permitido;
e) propor ação em juízo e defender o menor nos pleitos contra ele movidos.
Os tutores são obrigados a prestar conta da sua administração.
A tutela cessa com a maioridade ou a emancipação do menor ou quando cair sob o poder familiar por reconhecimento ou adoção.
A curatela é o encargo público cometido, por lei, a alguém para administrar os bens de maiores incapazes, impedidos de fazê-los por enfermidade ou deficiência física.
A curatela é sempre deferida pelo juiz em processo de interdição que pode ser promovido pelo pai, mãe, tutor, cônjuge (desde que não seja separado judicialmente), por parente próximo sucessível ou colateral até o quarto grau excluído os afins e, ainda, pelo Ministério Público.
Aplicam-se à curatela a disposições legais concernentes a tutela, desde que não contrariem a sua essência e seus afins.
Igualmente à tutela, na curatela também há que se observar a ordem legal para a escolha do curador, não sendo possível a escolha dentre esses o juiz nomeará um curador dativo.
A lei em comento traz uma terceira medida protetiva, acrescentando o art. 1.783-A ao Código Civil que dispõe:
“A tomada de decisão apoiada é o processo pelo qual a pessoa com deficiência elege pelo menos 2 (duas) pessoas idôneas, com as quais mantenha vínculos e que gozem de sua confiança, pra prestar-lhe apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil, fornecendo-lhes os elementos e informações necessários para que possa exercer sua capacidade”.
Na tomada de decisão apoiada o beneficiário conservará a capacidade de fato. É uma figura bem mais elástica do que a curatela. Não se trata de um modelo limitador da capacidade de agir, mais de um remédio personalizado para as necessidades existenciais da pessoa, no qual as medidas de cunho patrimonial surgem em caráter acessório.
A tomada de decisão não surge como substituto da curatela, mas lateralmente a ela, em caráter concorrente, jamais cumulativo.
A própria lei dispõe que “para formular pedido de tomada de decisão apoiada à pessoa com deficiência, os apoiadores devem apresentar termo em que constem os limites do apoio a ser oferecido e os compromissos dos apoiadores, inclusive o prazo de vigência do acordo e o respeito à vontade, aos direitos e aos interesses da pessoa que devem apoiar”.
Caberá a doutrina e a jurisprudência desenvolver os critérios objetivos para apartar a sutil delimitação entre o âmbito da aplicação de cada uma dessas medidas.
A experiência demonstra que o curador tem unicamente o papel de administrador dos bens patrimoniais e a tomada de decisão apoiada vai além, pois, o incapacitado terá dois conselheiros e ele não sofrerá interdição total de sua capacidade atendendo ao princípio da dignidade da pessoa humana na dupla acepção: protetiva e promocional das situações existentes. O bem maior a se preservar é a pessoa do deficiente físico ou com enfermidade, então o espírito de amor, respeito e solidariedade devem ser o norte das decisões.
SP, 23-10-15.
* Advogada em São Paulo. Sócia fundadora da Harada Advogados Associados. Juíza arbitral pela Câmara do Mercosul. Autora da obra Coletânea de artigos de direito civil, Rideel, 2011. Ex Inspetora Fiscal da Prefeitura de São Paulo. e-mail: felicia@haradaadvogados.com.br