Os efeitos da sucessão estão regulados no art. 133 do CTN nos seguintes termos:
“Art.133. Apessoa natural ou jurídica de direito privado que adquirir de outra, por qualquer título, fundo de comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou profissional, e continuar a respectiva exploração, sob a mesma ou outra razão social ou sob firma ou nome individual, responde pelos tributos, relativos ao fundo ou estabelecimento adquirido, devidos até a data do ato:
I – integralmente, se o alienante cessar a exploração do comércio, indústria ou atividade;
II – subsidiariamente com o alienante, se este prosseguir na exploração ou iniciar dentro de seis meses, a contar da data da alienação, nova atividade no mesmo ou em outro ramo de comércio, indústria ou profissão.
§1º O disposto no caput deste artigo não se aplica na hipótese de alienação judicial:
I – em processo de falência;
II – de filial ou unidade produtiva isolada, em processo de recuperação judicial.
§2º Não se aplica o disposto no §1º deste artigo quando o adquirente for:
I – sócio da sociedade falida ou em recuperação judicial, ou sociedade controlada pelo devedor falido ou em recuperação judicial;
II – parente, em linha reta ou colateral até o quarto grau, consanguíneo ou afim, do devedor falido ou em recuperação judicial ou de qualquer de seus sócios; ou
III – identificado como agente do falido ou do devedor em recuperação judicial com o objetivo de fraudar a sucessão tributária.
§3º Em processo da falência, o produto da alienação judicial de empresa, filial ou unidade produtiva isolada permanecerá em conta de depósito à disposição do juízo de falência pelo prazo de um ano, contado da data de alienação, somente podendo ser utilizado para o pagamento de créditos extraconcursais ou de créditos que preferem ao tributário.” ( §§1º a 3º acrescidos pela LC nº 118, de 9-2-2005).
Quem adquirir o fundo comercial, ou estabelecimento comercial, industrial ou de serviço e continuar explorando a atividade do alienante sob a mesma ou outra denominação social responde pelos débitos tributários existentes até a data da aquisição na forma prevista adiante:
I – integralmente, se o alienante cessar a exploração da respectiva aquisição;
II – subsidiariamente com o alienante, caso este continue a exploração ou iniciar, dentro de seis meses, nova atividade, no mesmo ou diferente ramo.
Convém recapitular antes de mais nada o conceito de fundo de comércio. Não há unanimidade na doutrina quanto a esse respeito, sendo certo que ele não se confunde com o conceito de ponto comercial. Pode-se dizer genericamente que o fundo de comércio é designação que abrange a soma de bens corpóreos (instalações, máquinas, móveis etc.) e incorpóreos (marca, nome comercial, ponto comercial etc.) que compõem um estabelecimento comercial, industrial ou profissional. A expressão que mais se adequa aos dias atuais é o fundo empresarial que abrange toda a atividade econômica de natureza especulativa.
Dessa forma, o adquirente do fundo comercial ou fundo empresarial é equiparado ao adquirente do próprio estabelecimento onde se exerce a atividade empresarial. Posto isso, analisemos as duas hipóteses de responsabilização do sucessor.
Criticáveis são os textos dos incisos I e II do caput do art. 133 do CTN por falta de clareza.
A palavra integralmente constante do inciso I conduz à interpretação de que libera o alienante que deixa de exercer a atividade, ainda que solvente, reservando ao adquirente apenas a ação de regresso.
Hugo de Brito Machado sustenta que a palavra integralmente que está no inciso I, do art.133 do CTN, quer dizer solidariamente. Dessa forma, para esse autor “o devedor alienante do fundo de comércio ou estabelecimento comercial continua respondendo, como devedor que é, pelos tributos relativos ao fundo de comércio ou estabelecimento que alienou. E como a responsabilidade assumida pelo adquirente é solidária, a Fazenda Pública pode cobrar o seu crédito de um, ou do outro, ou dos dois. Não há benefício de ordem, nem a responsabilidade integral do adquirente elide a responsabilidade do devedor”.[1]É, sem dúvida, uma interpretação que se harmoniza com o sistema jurídico vigente.
Entretanto, em caso de responsabilização integral do adquirente pelos débitos tributários da empresa sucedida, como é a tendência do fisco em geral mediante interpretação literal do inciso I sob exame, devem ser transferidos ao sucessor, também os direitos da sucedida e não apenas os encargos. A sucessão implica transferência de direitos e obrigações tributárias da sucedida ao sucessor. Assim, se a empresa alienante do seu fundo comercial ou de seu próprio estabelecimento estava sob o regime de parcelamento (REFIS), a transferência do débito tributário para o sucessor não deve implicar rompimento do regime especial de pagamento do tributo. Deve o fisco assegurar a sub-rogação do sucessor nos direitos e obrigações do sucedido e não exigir o pagamento integral do débito dando por rescindido o regime especial de pagamentos parcelados.
Na hipótese prevista no inciso II a responsabilidade do adquirente é subsidiária, isto é, cabe a invocação do benefício de ordem, incabível na hipótese do inciso I que trata de responsabilidade solidária no nosso entender. No caso do inciso II é indispensável para a caracterização da sucessão a aquisição do fundo comercial ou do estabelecimento e a continuidade pelo adquirente da atividade do alienante. O objetivo da norma do art.133 é exatamente o de alcançar a unidade produtiva evitando que o contribuinte escape do dever de pagar tributo transferindo essa unidade produtiva a um terceiro.
Contudo, esse inciso II poderá gerar sérias dúvidas se aplicado literalmente. Suponha-se que o adquirente quite a dívida do alienante, que veio à luz, por exemplo, no terceiro mês da aquisição e que o alienante só no quinto mês deu início à nova atividade.
Os textos devem ser interpretados conjugadamente no sentido de que: a) o fisco exigirá as dívidas anteriores à alienação diretamente do adquirente, se o alienante cessar a exploração da atividade e não iniciar outra dentro do prazo de seis meses; b) diretamente do alienante, se este continuar com a atividade ou iniciar outra no prazo de seis meses, mas sem prejuízo da responsabilidade do adquirente nas hipóteses de insolvência do alienante, de seu desaparecimento ou da impraticabilidade da cobrança contra ele.
Os §§1º, 2º e 3º foram introduzidos pela LC nº118/2005, que veio à luz em função da nova Lei de Falências, Lei nº11.101/2005, a fim de excluir a responsabilidade tributária por sucessão na hipótese de alienação judicial em processo de falência, ou de filial ou unidade produtiva isolada, em processo de recuperação judicial.
Nas hipóteses do §1º não haverá responsabilidade tributária integral ou subsidiária da pessoa física ou jurídica adquirente. A exclusão de responsabilidade tributária vai de encontro ao objetivo da nova Lei de Falências que é a manutenção da unidade produtiva em dificuldade econômico-financeira, atenta à finalidade social da empresa de sorte a não interromper a atividade produtiva, assegurar o nível de emprego e acautelar os interesses dos credores em geral, por meio de um plano viável de recuperação da empresa devedora.
O §2º, por sua vez, prescreve hipóteses de inaplicação da exceção prevista no parágrafo anterior, a fim de prevenir possíveis fraudes na sucessão empresarial. Dessa forma, não se opera a exclusão de responsabilidade quando o adquirente for sócio da falida ou da empresa em recuperação judicial; for parente do devedor falido ou em recuperação judicial; ou for identificado como agente do falido ou do devedor em recuperação judicial com o objetivo de fraudar a sucessão tributária etc.
Por derradeiro, o §3º disciplina a administração do produto da alienação judicial que deverá permanecer em conta de depósito à disposição do juízo da falência pelo prazo de um ano a contar da data da alienação, somente podendo ser utilizado para o pagamento de créditos extraconcursais ou de créditos que preferem ao tributário. Os créditos extraconcursais são aqueles referidos no art.84 da Lei nº11.101/2005: a) remunerações devidas ao administrador judicial e seus auxiliares, e créditos derivados de legislação do trabalho relativos a serviços prestados após a decretação da falência; b) quantias fornecidas à massa pelos credores; c) despesas com a arrecadação, administração, realização do ativo e distribuição de seu produto, bem como custas do processo de falência; d) custas judiciais relativas às ações e execuções em que a massa falida tenha sido vencida; e) obrigações resultantes de atos jurídicos válidos praticados durante a recuperação judicial, ou após a decretação da falência, e tributos relativos a fatos geradores ocorridos após a decretação da falência, respeitada a ordem estabelecida no art.83 da Lei nº11.101/2005.
[1] Comentários ao código tributário nacional. São Paulo: Atlas, 2003, v. II, p.565.