Em poucas palavras 116

Em poucas palavras 116

Em poucas palavras 116 – série de artigos curtos do jurista Kiyoshi Harada. Acompanhe semanalmente.

Prefeitura de São Paulo e o famoso PPI

A Prefeitura engendrou uma forma original de parcelamento especial de débitos de forma permanente, podendo ser reativado por ato do Executivo a qualquer tempo, por um período determinado.

Só que o que era positivo de início transformou-se em um instrumento de extorsão tributária.

Exigências tributárias são feitas de forma absurda, mente caracterizadora do crime de excesso de exação fiscal.

Desenquadramentos do regime da SUP são feitos periodicamente: ora porque o elevado valor do faturamento estaria a caracterizar estrutura empresarial; ora porque a sociedade contém a palavras “Ltda”, indicativa de sociedade mercantil; e ora porque há profissionais de especialidades diferentes; ora porque a sociedade está registrada na Junta Comercial etc.

Agora, confundem-se, deliberadamente, prestação de serviços por meio de consórcios com a administração de consórcios, para elevar o valor da taxa de licença e funcionamento.

Utiliza-se o Valor de Referência Fiscal para exigir o recolhimento do ITBI, apesar de declarado inconstitucional pelo Órgão Especial do TJSP, contando com a não impugnação judicial em razão do custo da ação com dispêndio de honorários advocatícios e custas.

Lavram-se autos de infração manifestamente improcedentes para acenar com o ingresso no programa especial de parcelamento, o famoso PPI, mediante redução de multas e juros.

STF autoriza inquérito contra o Presidente Bolsonaro

A Procuradoria-Geral da República requereu e obteve da Ministra Rosa Weber do STF a autorização para instauração de inquérito contra o Presidente da República para apurar eventual crime de prevaricação no episódio que envolveu a compra da vacina Covaxin por preço superfaturado.

Anteriormente, o Vice- Procurador-Geral havia solicitado à Ministra Rosa Weber que se aguardasse o término das investigações da CPI para só depois posicionar-se acerca da representação penal formulada por três Senadores. A Ministra não concordou com esse posicionamento, porque o Ministério Público não pode portar-se com mero espectador das atividades da CPI.

Certamente o Presidente irá sustentar que determinou a investigação ao Ministro da Saúde. Este, por sua vez, alegará que repassou a ordem para um servidor graduado, e o inquérito restará arquivado.

CPI da Covid-19 caminha para o aspecto cômico

A CPI instalada para investigar um fato determinado – a omissão do governo federal no combate à Covid-19 – logo politizou-se tornando as suas sessões um local de exposições midiáticas de seus membros que, ao invés de perguntas objetivas aos depoentes, fazem longos discursos sob os mais diversos fundamentos divorciados dos objetivos da investigação parlamentar.

A CPI não tem dado tratamento isonômico aos depoentes. A conhecida médica e cientista de fama internacional, Nise Yamaguchi que tantos serviços prestou e vem prestando a este País e ao mundo, notadamente, na OMS, foi tratada com extrema grosseria, ao passo que a Luana de Araujo, ilustre desconhecida no mundo científico foi o tempo todo paparicada por tão somente dizer o que até o padeiro da esquia já sabia, ou seja, que a cloroquina não é eficaz no tratamento da Covid e que o discurso em torno de seu uso é um grande retrocesso científico.

Suas palavras soaram como suave música aios ouvidos dos senadores e da mídia leiga. Foi ovacionada e os senadores até solidarizaram-se pelo fato de ela não ter sido nomeada para o cargo que estava exercendo indevidamente, infringindo o art. 324 do CP (entrar em exercício de função pública antes de preenchidos os requisitos legais).

Dentro dessa linha de parcialidade o Presidente da CPI prendeu em flagrante o depoente Roberto Dias, militar da reserva do Exército, valendo-se de uma prerrogativa exclusiva de um juiz togado, sob o fundamento de que o depoente mentiu, como se outros depoentes tivessem contado apenas a verdade.

A prisão de investigado está sob reserva de jurisdição. Nesse conturbado contexto o Presidente da CPI fez a incabível alusão a “membros do lado podre das Forças Armadas”, como se os servidores envolvidos em acusações de corrupção estivem no Ministério da Saúde em missão do Exército.

Como era de se esperar isso gerou uma dura nota conjunta do Ministério da Defesa e dos Comandantes das três Forças Singulares, o que exigiu a pronta intervenção do Presidente do Congresso Nacional, para estancar no nascedouro o início de uma crise institucional.

Mas, os desacertos da CPI não param por aí. Na sessão de oitiva de Francieli Fantinato que começou o seu depoimento como investigada aconteceu um fato inusitado. Os senadores simpatizaram-se com a fala da depoente, e por meio de uma votação simbólica, convolaram a sua condição de indiciada para a condição de testemunha. E mais, tendo chegado à conclusão de que a CPI não tem poderes para convocar o Presidente da República, o Presidente e o Vice Presidente da CPI enviaram uma carta ao Presidente para confirmar ou desmentir o depoimento de Luis Miranda que o acusa de omissão.

Trata-se de um gesto meramente político para ganhar publicidade na mídia merecendo a esperada resposta, ou seja, o silêncio que só tende a desgastar a investigação parlamentar.

Ora, como é possível um órgão colegiado que assim se comporta exercer as mesmas prerrogativas de autoridades judiciárias envolvendo a voz de prisão? Poderes de investigação próprios das autoridades judiciais de que cuida o § 3º, do art. 58 da CF não conferem à CPI a prerrogativa de prender as pessoas no curso da investigação parlamentar. Basta examinar a jurisprudência do STF.

Aumento do Imposto de Renda

O que era para ser um projeto legislativo contendo dois artigos para corrigir a tabela progressiva do imposto de renda congelada desde 2015, transformou-se no maior monstrengo jurídico por conta de penduricalhos plantados por setores da Receita Federal. Os jabotis colocados em locais estratégicos resultaram no maior pacotaço tributário dos últimos tempos.

Conseguiu o inédito feito de provocar a rejeição por unanimidade da classe empresarial, principalmente, pela eliminação da dedução dos JCP e da criação de imposto sobre dividendos distribuídos na base de 20%, elevando consideravelmente a carga tributária das empresas.

O Ministro Paulo Guedes afirma que nos Estados Unidos a tributação de dividendos é de 22% e no Brasil é zero. Só que lá a tributação das empresas era de 21% até que recentemente foi elevada para 28% contra os 24% vigente no Brasil (15% + 9% de CSLL), alem do adicional de 10% sobre parcela que ultrapassar de R$ 20.000,00. E mais, lá não se tributa o consumo em 50% ou 60% como no Brasil, mas em apenas 18%.

Para fazer uma comparação justa é preciso examinar a tributação como um todo.

Outrossim, há um equívoco quando o Ministro Paulo Guedes fala em isenção de bilhões de dividendos distribuídos. A distribuição é fruto de lucros obtidos pelas empresas que já pagaram o imposto por isso. Esse imposto é típico das empresas.

Não há que se tributar na física o que já foi tributado na jurídica, que representa mera antecipação do devido pela pessoa física. Se tributar o lucro e a sua distribuição ao mesmo tempo há que se dosar as alíquotas de um e de outro, de sorte que a sua soma se situe no mesmo patamar dos países que tributam apenas na apuração do lucro, ou somente na sua distribuição.

Também não faz sendo a afirmativa do Ministro de que a reforma proposta é neutra: em nada aumenta a carga tributária vigente. Se assim é por que está remexendo em tudo? Só pelo desejo de complicar tudo?  Onde a neutralidade em criar uma alíquota de 20% sobre dividendos distribuídos e reduzir em 5% a tributação da pessoa jurídica?

Dezenas de associações empresariais entregaram uma carta ao Presidente Arthur Lira para que o projeto seja sustado para melhores estudos, dando-se preferência ao projeto de reforma administrativa para reduzir as despesas do Estado.

Privatização dos correios

O governo federal enviou ao Congresso Nacional o projeto legislativo prevendo a privatização dos correios.

Esse projeto de lei foi alvo de impugnação por meio de Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI – em virtude do que dispõe o art. 21, X da CF que prescreve no sentido de a União “manter o serviço postal e o correio aéreo nacional”.

Sabemos que os correios de há muito extrapolaram os limites do citado dispositivo constitucional, passando a atuar diretamente na exploração de atividade econômica fazendo concorrência com o setor privado.

Todavia, o STF estendeu à ECT a imunidade tributária recíproca, abarcando não apenas os serviços típicos referidos no texto constitucional, como também, os demais serviços. Até mesmo os veículos da ECT foram isentados por diversas Ações Originárias Cíveis impetrados perante o STF.

Penso que não será possível a venda total das ações da ECT como pretende o governo, sem prévia alteração do art. 21, X da CF por via de uma Emenda.

Mas, é possível cindir a ECT para preservar em mãos da União exclusivamente o serviço postal e o correio aéreo nacional, podendo tudo o mais passar para a iniciativa privada.

E uma vez cindida a ECT, nada impede de a União conceder à empresa privada a exploração de serviço postal e de correio aéreo nacional por meio de concessão do serviço público.

SP, 22-7-2021.

Por Kiyoshi Harada

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