Em poucas palavras 138

Em poucas palavras 138

Em poucas palavras 138 – série de artigos curtos do jurista Kiyoshi Harada. Acompanhe semanalmente.

Avanços tecnológicos e a devassa à intimidade das pessoas

Os avanços da tecnológica da informativa como a instalação de radar, câmaras fotográficas, monitoramento de vídeos nas estradas, nos interiores de veículos de transporte coletivo, nas vias públicas, no interior de estabelecimentos etc. trouxeram, sem dúvida, benefícios à sociedade em geral, mas, também, trouxeram efeitos colaterais indesejáveis, invadindo a intimidade das pessoas protegidas pelo art. 5º, inciso X da CF.

Imagine-se um motorista fotografado falando em um celular, que pode registrar a imagem de uma companheira ao seu lado que estivesse fazendo uma viagem às escondidas. A instalação de localizar nos veículos é muito útil para casos de roubos e furtos de veículos, mas também pode revelar dados que ferem a intimidade.

Contudo, o problema maior surge no âmbito das empresas. Instalar câmaras em todos os lugares, nos refeitórios ou vestiários pode ferir a LGPD, ainda que a pretexto de preservar a segurança da propriedade privada do empregador, ou até mesmo de prevenir a incolumidade física dos próprios empregados.

O compartilhamento de dados dos empregados hoje pode ser feito em tempo real. A LGPD, Lei nº 13.709, de 14-8-2018, de regra só admite mediante prévio consentimento o seu titular. Mas, não é o que vem acontecendo na prática. Existem até vendas de dados financeiros e patrimoniais de contribuintes, muito provavelmente vazadas por agentes da Receita Federal.

Modulação de efeitos em matéria tributária

A modulação de efeitos em matéria tributária ofende ao principio constitucional da legalidade tributária e ao princípio da isonomia, além de caracterizar um procedimento ilegítimo que precede a legalidade.

Mesmo reconhecendo a natureza constitutivo-negativa da decisão que pronuncia a inconstitucionalidade no controle concentrado, a sobrevida concedida ao preceito normativo fulminada pela decisão judicial viola o princípio da legalidade tributária (art. 150, I da CF, da mesma forma de viola o princípio da isonomia à medida que exonera da obrigação tributária aquele que deixou de pagar o tributo guerreado e, ao mesmo, tempo impede a repetição por aquele que adimpliu a sua obrigação tributária.

É um prêmio à ação dos governantes de sancionar leis eivadas de inconstitucionalidade, bem como, um estímulo aos contribuintes de não honrar seus compromissos de natureza tributária ofendendo, dest’arte, o princípio da legitimidade que precede a legalidade.

Imbróglio em torno da entrada de estrangeiros no país

Incrível a capacidade do governo brasileiro de complicar o que é fácil.

Para prevenir o perigo de contágio com a nova variante do coronavírus – Ômicron – bastaria seguir protocolo vigente no mundo inteiro, qual seja, exigência de apresentação do certificado vacinal, conhecido como passaporte vacinal.

Se vários outros países exigem esse certificado para admitir a entrada do brasileiro em seus territórios respectivos, parece lógico que o Brasil deva adotar idêntica providência em relação aos estrangeiros daqueles países.

Mas, governo preferiu complicar tudo! Não se exige o passaporte vacinal, mas, o passageiro que desembarcar no Brasil deverá fazer uma quarentena de 5 dias no destino final.

Primeiramente, 5 dias não é prazo recomendado pelas autoridades sanitárias mundiais. Em segundo lugar, quarentena no destino final significa que o passageiro poderá ir transmitindo o vírus por onde passar. Se o seu destino final for em uma cidade do interior, certamente, se ele estiver com vírus, irá transmitindo ao logo de sua caminhada por via rodoviária. Em terceiro lugar, como e quem irá fazer o monitoramente da quarentena?

Trata-se de uma alternativa manifestamente ineficiente, tanto é que se acena com a vacinação do passageiro nos aeroportos, fazendo uso de doses que faltam para os brasileiros. E mais, a vacina leva de 10 a 14 dias para fazer efeito.

Por fim, o Ministro Queiroga, da Saúde, para defender a não exigência do passaporte vacinal declarou, para o espanto de todos, que o direito à liberdade prevalece sobre o direito à vida. A declaração seria digerível se não se tratasse de ameaça à vida de terceiros!

PEC dos precatórios

Mediante fatiamento proposto pelo Senado Federal a Pec dos precatórios foi finalmente aprovada na forma da Emenda Constitucional nº 113 de 9-12-2021. Falta aprovar as demais partes fatiadas.

A prolixa, caótica, confusa e detalhista Emenda 113/2021 ao contrário do que expressa a sua ementa nada dispõe sobre o parcelamento de precatórios.

Porém, mediante alteração do § 11, do art. 100 da CF, faculta ao credor de precatório ofertar os valores de precatórios próprios ou de terceiros expedidos contra o ente federativo devedor, com autoaplicabilidade para a União para:

I – quitação de débitos parcelados ou débitos inscritos em dívida ativa do ente federativo devedor, inclusive transação resolutiva de litígio, e, subsidiariamente, débitos com a administração autárquica e fundacional do mesmo ente;

II – compra de imóveis públicos de propriedade do mesmo ente disponibilizados para venda;

III – pagamento de outorga de delegações de serviços públicos e demais espécies de concessão negocial promovidas pelo mesmo ente;

IV – aquisição, inclusive minoritária, de participação societária, disponibilizada para venda, do respectivo ente federativo; ou

V – compra de direitos, disponibilizados para cessão, do respectivo ente federativo, inclusive, no caso da União, da antecipação de valores a serem recebidos a título do excedente em óleo em contratos de partilha de petróleo.

A medida mais importante é a do inciso I que permite a compensação de precatório com a dívida ativa da União. Em relação aos demais entes da Federação as medidas enumeradas nos incisos I a V dependem do que dispuser a lei de cada ente político, isto é, nenhum efeito surtirá o disposto nesta Emenda nº 113, a exemplo da Emenda Constitucional nº 94, de 15-12-2016, que previa a compensação de créditos de precatórios com dívidas ativas inscritas conforme lei de cada ente político (art. 105 do ADCT). Nenhuma entidade política, até hoje, regulamentou essa norma do art. 105 do ADCT pelo que ela continua com eficácia suspensa.

O suspense em torno do calote de precatórios continua. É totalmente imprevisível o que sairá da cabeça do confuso legislador que tem desenhado um inferno fiscal na área da legislação tributária ordinária, agora, transposto esse inferno de Dante para o plano das emendas constitucionais, porque os mesmos legisladores ordinários compõem o Poder Reformador.

Preconceito racial prejudica a mobilidade do negro

O negro no Brasil vem sofrendo violências morais a todo instante, às vezes, físicas por conta da cor de sua pele. São agredidos nos supermercados, bares e restaurantes.

Nos transportes coletivos de passageiros não são raras as hipóteses os ônibus deixar de parar quando um negro estiver acenando, assim como, o fato de o assento a seu lado permanecer vazio mesmo estando superlotado o transporte coletivo.

Criminalização do racismo ou do preconceito racial não resolvem o problema, porque o racismo no Brasil acontece de forma velada. Não há como acusar de racista ou preconceituoso os que não se sentam ao lado do negro embora lotado o ônibus. Sentar ou ficar de pé é a opção livre de cada um. Disse o insigne Ministro Quiroga referindo-se à vacinação contra Covid 19 que a liberdade é um bem mais precioso do que a vida!

O problema é de natureza cultural que nada ou pouco mudou desde 1888, quando se deu a abolição da escravatura.

O racismo e o preconceito assemelham-se à corrupção. Por mais que se combatam por meio de legislação rigorosa aplicada pela operação lava jato, os corruptos continuam povoando o universo político.

Por Kiyoshi Harada

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