Em poucas palavras 144 – série de artigos curtos do jurista Kiyoshi Harada. Acompanhe semanalmente.
Vacinação infantil e suas dificuldades em caso de recusa dos pais
Interessante questão foi trazida pelo Portal Migalhas em sua edição nº 5.274, de 21-1-2022, versando sobre vacinação de crianças. Resumamos a matéria.
Existem posições de juízes, tribunais e do STF fixando a tese da obrigatoriedade da vacinação infantil tendo em vista que a assistência à saúde é um dever do Estado.
O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA –, por sua vez, dispõe pela obrigatoriedade da vacinação infantil:
“Art. 14. O Sistema Único de Saúde promoverá programas de assistência médica e odontológica para a prevenção das enfermidades que ordinariamente afetam a população infantil, e campanhas de educação sanitária para pais, educadores e alunos.
§1º É obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias.”
E o STF decidiu por essa obrigatoriedade exatamente com fulcro no aludido artigo (ARE nº 1.167.879, Rel. Min. Roberto Barroso).
O grande problema, contudo, é de natureza operacional.
Quem vai recorrer ao Judiciário? Os pais da criança evidentemente não! O Conselho Tutelar? Sim, mas, é preciso que alguém próximo à criança faça a representação. O Conselho Tutelar que não tem o jus postulandi, uma vez cientificado, deverá acionar a intervenção do Ministério Público para requerer a vacinação junto ao Poder Judiciário.
Uma vez decida pela vacinação, como fazer cumprir a ordem judicial? Se não cabe a vacinação compulsória em relação a adultos, muito menos caberá contra as crianças. Resta a imposição de sanções políticas obedecidos os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
Medida como as de busca e apreensão do menor pelo Conselho Tutelar para vacinação compulsória não nos parece razoável, nem a destituição do pátrio poder, como cogitada em algumas decisões monocráticas, pois essas medidas causam um mal maior do que a simples abstenção à vacinação, uma vez que retira a criança do convívio familiar.
PEC dos combustíveis
Convencido de que os preços de combustíveis são caros em virtude da elevada alíquota incidente, o governo federal pretende patrocinar a PEC dos combustíveis para a redução dessa alíquota, aprofundando o processo de banalização de emendas. É simplesmente inacreditável. Dentro desse raciocínio logo teremos a PEC do arroz, do feijão etc., igualmente, responsáveis pela aceleração do processo inflacionário.
É verdade que a incidência de alíquota elevada, com inversão do princípio constitucional da seletividade das alíquotas em função da essencialidade de produtos e serviços, é uma das causas da excessiva onerosidade dos combustíveis. Mas, esse problema poderia ser resolvido judicialmente, na esteira da decisão do STF que decretou a inconstitucionalidade da alíquota de 25% incidente sobre a energia elétrica.
Contudo, o problema maior está na paridade do preço de combustível com o preço internacional do barril de petróleo, bem como, com a variação cambial.
Se o governo é acionista majoritário tem como interferir na política de preços da Petrobrás, que é uma empresa estatal cumprindo relevante interesse coletivo que fundamenta a sua existência (art. 173 da CF). Não se trata de mera empresa privada perseguindo apenas lucros e dividendos.
Por fim, Lei Complementar de aplicação em âmbito nacional poderia estabelecer uma base de cálculo menor para cálculo do ICMS, com fundamento no art. 146, III, a da CF.
Os Estados nesse caso estariam simplesmente aplicando essa lei complementar de natureza cogente, e não estariam reduzindo o valor do ICMS por vontade própria, razão pela qual fica afastada a incidência do art. 14 da LRF (impacto orçamentário e medidas de compensação), como apontada pelos articulistas dessa desastrosa PEC.
Rede ingressa com ação no STF contra nota técnica do Ministério da Saúde
Contrariando as deliberações da Conitec o Ministro Queiroga divulgou nota técnica no Ministério da Saúde onde foi inserida uma tabela que considera eficaz o tratamento precoce e ineficaz a vacina.
A Rede de Sustentabilidade ingressou com ADI contra a referida nota técnica responsabilizando o Ministro. A Ministra Rosa Weber requisitou informações do Ministro no prazo de 5 dias.
Como se sabe, o Ministro tão logo soube da ação retirou a aludida tabela da nota técnica.
Estranha atuação do TCU
Como se sabe o TCU vem investigando a administradora Alvarez & Marsal, uma empresa que propiciava assessoramento das empreiteiras em regime de recuperação judicial, depois de alcançadas pelas ações da operação lavra jato.
O motivo dessa investigação prende-se ao fato de que o juiz Sérgio Moro, então juiz da lava jato, depois que deixou o cargo de Ministro da Justiça e da Segurança Pública foi contratada pela Alvarez & Marsal para prestar-lhe assistência jurídica.
O TCU quer saber quanto o juiz Sérgio Moro recebeu a título de honorários dessa administradora que assessora empresas, cujos dirigentes foram condenados pelo ex juiz Sérgio Moro.
Em que pese os aspectos éticos da questão não é da incumbência do TCU investigar movimentação de recursos privadas. A missão do TCU é a de fiscalizar e controlar despesas públicas que não estão envolvidos no caso. E também não cabe à Corte de Contas proceder investigação policial.
Por tudo isso, é bastante estranho toda essa movimentação em torno dessa matéria. O que está por trás disso tudo?
Difal e o nicho de palestras, seminários e lives
Desde o advento da Lei Complementar nº 190, de 4-1-2022 o debate em torno do aspecto temporal de sua vigência e aplicação, 4-1-2022 ou 1-1-2023, vem ganhando espaço na mídia especializada, envolvendo convites para participação em seminários, palestras e lives.
Na verdade, bastam 5 minutos de exposição para explicar que o princípio da anterioridade só se aplica em casos de instituição ou majoração de tributos. Não é o caso da LC nº 190/2022, exigida pelo STF, que se limita a regular o disposto no inciso VII, do § 2º, do art. 155 da CF, isto é, matéria estranha ao direito tributário, inserindo-se exclusivamente no campo do direito financeiro.
É verdade que no STF há ações defendendo posições antagônicas, mas, é verdade, também, que a repartição de receitas tributárias não faz parte do direito tributário, apesar de topologicamente inserida no Capítulo do Sistema Tributário Nacional.
SP, 31-1-2022.
Por Kiyoshi Harada