Em poucas palavras 146

Em poucas palavras 146

Em poucas palavras 146 – série de artigos curtos do jurista Kiyoshi Harada. Acompanhe semanalmente.

Prova de vida, uma exigência desnecessária

Incrível a falta de criatividade e de boa vontade para infernizar a vida de aposentados e pensionistas com a esdrúxula exigência de prova de vida, como se as fraudes se limitassem ao uso de nomes de falecidos.

Estamos em plena era da informática, com avanços tecnológicos que permitem às fontes pagadoras (União, Estados e Municípios e respectivas autarquias e estatais) saber se determinada pessoa continua viva.

Basta acionar o sistema integrado de cadastros fiscais e verificar se a pessoa apresentou a declaração do imposto de renda. Outros dados como a renovação da carteira de habilitação, comparecimento às últimas eleições, inscrições nos órgãos de classe etc. permitem saber que a pessoa está viva.

Essa prova de vida, que antes era feita perante a agência bancária onde o interessado mantém a sua conta corrente, foi abolida exatamente em época de pandemia, o que revela despreparo e inaptidão para o exercício de cargo/função pública de quem determinou essa proibição. Ao que saibamos nenhum banco aceita a presença de um morto em suas dependências!

Tornaram-se rotineiras as manifestações extra-autos dos Ministros do STF

Com frequência cada vez mais intensiva os Ministros da Corte Suprema vêm se manifestando nas redes sociais a respeito de várias questões político-sociais, comprometendo eventual atuação sua nas futuras ações que versem sobre essas questões.

Como se sabe, o apresentador Monark, durante podcast transmitido ao vivo, defendeu a existência de um partido nazista que estaria dentro da lei, bem como fez a defesa do antissemitismo que seria resguardada pela liberdade de expressão.

Em razão da repercussão dessa fala do Monark, o Ministro Gilmar Mendes, em 8 de fevereiro último, protestou pelo Twitter contra as ideias nazistas prestando solidariedade à população judaica.

O insigne Ministro declarou que “Qualquer apologia ao nazismo é criminosa, execrável e obscena. O discurso do ódio contraria os valores fundantes da democracia constitucional brasileira”.

Ora, na eventualidade de alguém fundar um partido nazista e a questão ir parar no STF, o Ministro Gilmar Mendes estaria impedido de participação da votação.

Muito barulho em torno da redução de tributos incidentes sobre combustíveis

Governo e Congresso Nacional estão empenhados na política de redução dos preços de combustíveis.

Fala-se em PEC dos combustíveis para que os Estados não tenham que cumprir as medidas previstas no art. 14 da LRF (impacto econômico-financeiro e compensação do imposto reduzido). Ora, uma Lei Complementar reduzindo a base de cálculo da tributação dos combustíveis (art. 145, III, a da CF) traria o mesmo efeito, sem necessidade de banalizar as Emendas.

O Executivo, por sua vez, fala em reduzir apenas os preços do diesel para afastar o fantasma da greve dos caminhoneiros. É curar a dor de barriga do momento. Aproveita a conjuntura para tirar proveito político: distribuir vale-gás para os vulneráveis.

Nessa discussão até o Banco Central entrou na dança mostrando preocupação com as medidas anunciadas.

Não remover a causa que reside na paridade do preço do combustível com o preço do mercado internacional do petróleo e paridade cambial seria a mesma coisa que você ir retirando a água do tanque sucessivamente com caneca, canecão, balde para evitar o transbordamento das águas, sem fechar a torneira.

O governo não quer mexer na causa, supostamente respeitando a autonomia da Petrobrás, porque lhe convém continuar recebendo polpudos dividendos e fantásticos royalties do petróleo, na condição de dona das riquezas naturais, tendo como parâmetro a paridade cambial e a paridade do preço internacional do barril de petróleo que não pára de subir.

Ilicitude de dados bancários obtidos pelo Ministério Público sem autorização judicial.

Desde o advento da Lei Complementar nº 105/2001, cujo art. 6º permite que a Receita Federal quebre o sigilo bancário, sempre que haja procedimento fiscal ou processo administrativo tributário e a juízo da autoridade fiscal  competente seja reputado indispensável a obtenção desses dados, a jurisprudência do STF tem sido vacilante, ora permitindo a quebra sem interferência do Poder Judiciário a pretexto de que há mera transferência do sigilo do banco para o órgão da Receita Federal, ora decidindo que a quebra desse sigilo está sob reserva do Judiciário (RE nº 389808, DJe 10-5-2011).

Decorridos seis anos dessa decisão o Plenário do STF firmou a tese em sentido contrário, sob a sistemática de repercussão geral (tema 225) afirmando que “o art. 6º da LC nº 105/2001 não ofende o direito ao sigilo bancário, pois realiza a igualdade em relação aos cidadãos, por meio do princípio da capacidade contributiva, bem como estabelece requisitos objetivos e o translado do dever de sigilo da esfera bancária para a fiscal”.

Contudo, em relação ao órgão ministerial o STF mantém a antiga jurisprudência batendo-se pela necessidade de intervenção do Judiciário para quebrar o sigilo bancário (RE nº 215.301, DJ 28-5-1999.

Esse posicionamento foi observado no último dia 9 de fevereiro pela 3ª Seção do STJ que determinou que as informações sigilosas de dois leiloeiros sejam retiradas do processo em que são acusados de estelionato. STJ reconheceu, pois, ilicitude dos dados fiscais e bancários obtidos pelo MP, por meio da Receita Federal, sem autorização judicial (RHC 83.233 e RHC 83.447).

Refis um mal necessário

O programa de parcelamento de débitos fiscais sob diferentes denominações, Paex,

Refis, Pert etc. encontra no atual Ministro da Economia o principal opositor porque, em tese, ele pode estimular o contribuinte a não recolher os tributos, preferindo aguardar o advento de uma legislação que propicie reduções e moratória para a liquidação de seus débitos.

Muitos especialistas comungam com esse posicionamento.

Mas devemos ser pragmáticos, olhando para o estoque de dívida ativada da ordem de R$ 3 trilhões. Pergunta-se, a PGFN está aparelhada para cobrar esses créditos? O Judiciário daria conta de tantas execuções fiscais?

Daí os Refis da vida que é muito mais eficaz do que o frustrado programa de transação tributária que de transação só ostenta o nome. Por outro lado, o governo não tem técnicos capazes de implementar a compensação tributária sem que implique no esvaziamento das receitas tributárias. Por isso ficam repetindo o parcelamento segundo o modelo legislativo existente limitando-se a mudar sua roupagem jurídica.

SP 14-2-2022.

Por Kiyoshi Harada

Leia também as edições anteriores

Relacionados