Daniel Silveira e a discutível tornozeleira
A mídia não cansa de noticiar a falta de uso da tornozeleira eletrônica pelo deputado Daniel Silveira. O deputado por sua vez alega que o aparelho está com defeito.
Agora, o Ministro Alexandre de Moraes aplicou a multa de R$ 405 mil por descumprir a medida cautelar e determinou o bloqueio de suas contas bancárias bem com o desconto de 25% mensais dos vencimentos do parlamentar até que se complete o total da multa aplicada.
A matéria é bastante confusa porque o uso da tornozeleira determinada no curso da ação penal não restou confirmado, salvo melhor juízo, na decisão condenatória, pelo que não foi objeto de indulto.
Aliás, a pena de prisão de 8 anos e 9 meses de um regime inicial fechado é incompatível com o uso da tornozeleira.
Após a condenação definitiva, na fase de execução penal é possível a decretação dessa medida cautelar na hipótese de convolação da pena de prisão em regime fechado para prisão domiciliar, ou liberdade condicional.
Mas, esse não é o caso por conta da anistia decretada pendente de apreciação pelo STF.
Entretanto. O decreto de anistia surte o efeito desde a sua publicação, o que impede a sua prisão. A extinção das penas, contudo, depende tão somente de atuação do STF que na dicção do art. 738 do CPP deveria ocorrer de imediato. É, realmente, um caso bastante singular.
Limites da coisa julgada em matéria tributária
Um dos mais importantes temas de direito tributário – limites da coisa julgada em matéria tributária – estará sendo julgado pelo Plenário Virtual do STF entre os dias 5-5-2022 a 13-5-2022.
Trata-se de julgamentos conjuntos dos RREE nºs 955.227 e 949.297, ambos com repercussão geral reconhecida (Temas 885 e 881, respectivamente).
A matéria é da mais alta importância jurídica, porque muitos contribuintes que obtiveram coisa julgada a ser favor para se verem livres do pagamento de tributo que questionaram, passados anos, são surpreendidos com brusca alteração do posicionamento da Corte Suprema que passa considerar constitucional aquele tributo antes condenado, Isso acontece, às vezes, sem que tenha havido alteração dos membros da Corte.
Nessa hipótese, pergunta-se, a coisa julgada continua intocável por se inserir no âmbito protegido por cláusulas pétreas?
Se sim, estaremos diante de duas castas de contribuintes em relação a um único tributo: os que não precisam pagar e os que precisam pagar. A única diferença, no caso, é que aquele tem a coisa julgada a seu favor ingressou com a ação antes daqueles que não lograram êxito nas demandas defendendo a mesma tese. Flexibilizar a coisa julgada é coisa séria. Implica, de certa forma, retroagir os efeitos da decisão contrária.
Necessidade de distinguir não incidência pura da não incidência expressa em lei
Na prática está havendo muita confusão entre a não incidência pura e a não incidência legalmente qualificada.
A não incidência pura é figura dependente da incidência tributária. O campo que ficou fora dos limites da definição do fato gerador de um imposto configura não incidência.
A não incidência legalmente qualificada é aquela expressa em lei implicando modificação parcial da hipótese de incidência. Por isso, muitos doutrinadores consideram como caso de isenção.
Quando a Constituição determina o estorno do ICMS na hipótese de isenção ou de não incidência está se referindo à não incidência legalmente qualificada.
Não faz menor sentido a Fazenda pleitear o estorno, quando o STF decide que em determinado caso não incide o imposto porque não ocorreu o respectivo fato gerador (transferência física de uma mercadoria de um estabelecimento para outro do mesmo titular situado em outro Estado).
Redução linear do IPI suspensa por liminar concedida pelo Min. Alexandre de Moraes
Como se sabe, o Decreto nº 11.052/2022 reduziu à alíquota 0 (zero) o IPI incidente sobre produtos classificados no código 2106.90.10 Ex 01 (Preparações compostas, não alcoólicas (extratos concentrados ou sabores concentrados), para elaboração de bebida da posição 22.02, com capacidade de diluição superior a 10 partes da bebida para cada parte do concentrado) e o Decreto nº 11.055/2022, que alterou a TIPI aprovada pelo Decreto nº 10.923/2021, reduzindo em 35% o IPI incidente sobre os produtos em geral.
Segundo o Ministro Relator, Alexandre de Moraes, o IPI é um dos principais instrumentos de incentivos à ZFM cujos privilégios foram constitucionalizados pelo art. 40 do ADCT, para desenvolvimento de polo industrial na Região Amazônica.
Com esse fundamento o Min. Alexandre de Moraes suspendeu liminarmente o Decreto nº 11.052/2022 e o Decreto nº 11.55/2022, este apenas no tocante à redução das alíquotas que alcançam os produtos também produzidos na ZFM, a fim de preservar o privilégio exclusivo da ZFM.
A ZFM foi implantada em 1967. Desde então 55 anos se passaram sem que a Região Amazônica tenha se transformado em polo de indústrias e de agronegócios, conforme previsão do Decreto-Lei nº 288/1967. Os produtos lá produzidos não são nada competitivos tendo em vista os custos de transportes para os grandes centros consumidores do País. É preciso uma política de expansão populacional da Região formando grandes centros urbanos.
A ZFM transformou-se em um grande centro distribuidor de créditos do IPI. Sua manutenção passou a conflitar com os objetivos do MERCOSUL criado pelo Tratado de Assunção de 26-3-1991.
STJ decide que é impenhorável o bem da família dado em caução pelo devedor
A Lei nº 8.009/90 proíbe a penhora do bem de família, entendo-se como tal o imóvel residencial próprio do casal, ou de entidade familiar que deixam de responder por qualquer tipo de dívida, civil, comercia, fiscal ou previdenciária (art. 1º).
Contudo, o art. 3º prevê várias hipóteses excepcionais dentre as quais:
“V para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou entidade familiar”;
[…]
“VII obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação”.
O TJSP havia permitido a penhora do bem dado em caução, sob o fundamento de que os donos do imóvel haviam admitido a penhora do imóvel oferecido em caução e que a caução se aproximaria da hipoteca prevista no inciso V retrotranscrito.
Contudo, a 4ª Turma do STJ entendeu em sentido contrário. Mesmo com a oferta, o imóvel com condição de bem de família ainda é impenhorável e não deixa de ser protegido.
Argumentou, ainda, que os direitos à moradia e à dignidade não poderiam ser renunciados e, também, que não poderiam as regras da hipoteca ser aplicados ao caso concreto (Resp nº 1.789.505).
Tanto a hipoteca como a caução têm o mesmo objetivo de garantir o credor contra eventual inadimplemento do devedor, de maneira que o TJSP, no nosso entender, aplicou corretamente o direito ao caso concreto em que os próprios devedores ofereceram o imóvel em caução.
Outrossim, se é permitida a penhora de bem de família do fiador de contrato de locação, conforme previsão do incido VII do art. 3º da Lei nº 8.009/90 e jurisprudência do STF, afigura-se bem estranho que não possa penhorar o bem de família espontaneamente oferecido em caução pelos devedores.
Infelizmente, esse tipo de conflito jurisprudencial que resulta da flexibilização do art. 3º da Lei nº 8.009/90 traz insegurança jurídica.