Jurista e professor.
Presidente do IBEDAFT
Aumento dos tributos na contramão da conjuntura atual
Na contramão da conjuntura econômico-social a Assembleia Legislativa de São Paulo está discutindo o PL nº 205/2020, de iniciativa de Deputados do PT, que aumenta o ITCMD por meio de alíquotas progressivas que variam de 4% (alíquota vigente) até 8% (alíquota máxima permitida por Resolução do Senado Federal), de conformidade com o montante da herança ou da doação.
É mais uma contramedida à política de contenção de tributos para permitir a retomada gradativa da atividade econômica duramente atingida pelo isolamento social imposto para a preservação da saúde da população.
O Deputado João Maia (PL-RN) apresentou o PL nº 2.358/2020 instituindo a CIDE-Digital – Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico que incide sobre a receita bruta de serviços digitais prestados por empresas de tecnologia. O produto de sua arrecadação é canalizado para o FNDCT – Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico. Trata-se de um tributo de natureza puramente arrecadatória, burlando a autorização constitucional de intervir no domínio econômico por via de contribuição social.
O Senado Federal, por sua vez, está discutindo a instituição do Imposto sobre Grandes Fortunas – IGF –, um imposto regressivo rejeitado por quase todos os países do mundo.
Trata-se de proposituras legislativas que atuam na contramão da conjuntura atual, caracterizado pela perda de capacidade contributiva. O momento é de conceder moratórias tributárias e não de onerar mais.
Autores dessas propostas legislativas integram o time daqueles que rezam com a seguinte cartilha: é proibido dar certo!
Perigo institucional no ar
Indignado com a liminar do Ministro Alexandre de Morais, que impediu a posse de Alexandre Ramagem no cargo de Diretor-Geral da Polícia Federal o Presidente Jair Bolsonaro declarou que já chegou ao fim do limite, e que iria fazer cumprir a Constituição a qualquer custo.
Alguns vieram nessa declaração uma ameaça de golpe.
Penso que não é bem assim, mesmo porque soaria estranho invocar a Constituição para dar um golpe que representa exatamente uma ruptura da constitucional.
Penso que o Senhor Presidente estava se referindo ao art. 142 da Constituição que permite a qualquer Chefe de Poder requisitar as Forças Armadas para a garantia dos poderes constitucionais, quando atingido por quebra da lei e da ordem.
A única dúvida que sempre me assaltou esse polêmico dispositivo é que transfere para o Comando das Forças Armadas a tarefa de interpretar a Constituição para saber se houve a quebra da lei e da ordem e ao mesmo tempo apontar quem é o responsável por essa quebra. Todos nós sabemos que o intérprete máximo da Constituição é o STF. Daí da dúvida.
Esse dispositivo do art. 142 da CF, a nosso ver, só pode ser aplicado nos casos em que independe de interpretação constitucional como, por exemplo, na hipótese de o prédio do Congresso Nacional estiver cercado por forças de segurança nacional, para impedir a votação de uma PEC contrária ao governo.
Orçamento de guerra
O que é orçamento de guerra? Não se trata de um orçamento anual paralelo.
Trata-se de simplesmente flexibilizar a execução do orçamento anual de 2020 para dar combate a Covid-19, facilitando a realização de despesas públicas. Com esse orçamento de guerra ficam dispensados o atingimento das metas do superávit primário e nominal, a observância da cláusula de ouro e de demais princípios de direito financeiro como, por exemplo, a abertura de crédito extraordinário mediante utilização de qualquer verba do orçamento.
Enfim, há uma desvinculação das verbas do orçamento anual a exemplo da DRU. Para evitar o descontrole da execução orçamentária foi criado o Comitê-Gestor da Crise presidido pelo Presidente da República e composto por Ministros de Estado da Secretaria-Geral da Presidência da República, da Saúde, da Economia, da Cidadania, dos Transportes, da Agricultura e Abastecimento, da Justiça e Segurança Pública e da Controladoria-Geral da União. Compõem, também, esse Comitê, porém, sem direito a voto, os representantes dos Estados, Municípios, Senado, Câmara, CNJ, CNMP e do TCU.
Esse Comitê-Gestor tem por atribuição aprovar as ações de regime emergencial, criar, eleger, destituir e fiscalizar.
O orçamento de guerra terá o prazo de vigência enquanto durar o estado de calamidade pública, que vigorará ate o dia 31 de dezembro de 2020, salvo alterações supervenientes.
Pelo que temos visto ao longo dos anos em que as normas orçamentárias vinham sendo escancaradamente descumpridas é de se esperar que o Comitê-Gestor da crise não conseguirá evitar os desvios de verbas orçamentárias por parte dos executores das despesas pública.
Neste momento de crise só nos restar apelar para o patriotismo das pessoas, pois, sem a flexibilização da execução orçamentária não será possível fazer com que os recursos financeiros cheguem a tempo nos órgãos públicos empenhados na luta conta a Covid-19, bem como, nas instituições destinadas a dar assistência social aos necessitados (beneficiários do bolsa família, do auxilio emergencial de R$600,00 do BPC etc.).
O confuso bloqueio de vias públicas
O blockdawn decretado pela Prefeitura de São Paulo, sem prévio estudo e planejamento, criou um verdadeiro pandemônio no transito da Capital no dia 4 de maio deste mês. Gerou um congestionamento monstro aumentando o tempo de exposição dos motoristas e passageiros ao vírus do corona.
Profissionais da área da saúde – médicos, enfermeiros e paramédicos –, ficaram ilhados por horas nas vias da cidade, causando danos aos doentes e infectados. Impediu os doentes de procurarem os consultórios médicos. Outrossim, verifiquei pela imagem de televisão que até uma ambulância ficou entalada no meio a confusão.
Embora a mídia não tenha informado é presumível que esse bloqueio atabalhoado aumentou consideravelmente os usuários de ônibus e metrô aumentando o perigo de contaminação.
A medida foi revogada no dia 5 último, mas o Ministério Público Estadual abriu uma investigação para apurar se a Prefeitura fez estudos prévios para decretar esse bloqueio de vias públicas.
Agora, a Prefeitura de São Paulo pegou a todos de surpresa com a brusca alteração no critério de rodízio de veículos implantando o rodízio na base da placa par/impar. Como é óbvio isso causou um congestionamento monstro aumentando o sofrimento e a angústia de pessoas, prejudicando a locomoção de pessoas exercentes de atividade essenciais, como pessoal vinculado a saúde, abastecimento etc.
Medidas improvisadas, sem prévio estudo e planejamento, com visível propósito de dificultar a mobilidade do cidadão com vistas à adesão compulsória ao isolamento social, não são alternativas razoáveis. O Prefeito deveria estar preconizando medidas de prevenção da saúde mental e física da população “aprisionada” sem possibilidades de alimentação normal. Nunca é demais lembrar que a fome mata muito mais do que a Covid-19. No mundo inteiro morre uma pessoa a cada quatro segundos.
Medidas arbitrárias como as adotadas no setor de trânsito não levam a bons resultados. Amanhã poderá ser substituído esse rodízio na base de par/impar para rodízio baseado na cor do veículo: branco/azul; preto/amarelo; vermelho/azul etc. O certo é que limitação do uso de automóveis acaba superlotando os transportes coletivos, onde o perigo de contaminação é infinitamente maior.
Inquérito aberto no STF para investigar as acusações de Sergio Moro perde objeto
Como se sabe no dia 24-4-2020 o ex Ministro Sergio Moro convocou uma coletiva para fazer uma série de acusações contra o Presidente Bolsonaro, inclusive, apontando a inserção de sua assinatura no documento de exoneração a pedido do Diretor-Geral da Polícia Federal, sem que ele, então Ministro, tenha firmado o documento, e sem que o exonerado tenha solicitado sua exoneração.
Ante essas acusações o Procurador Geral da Justiça requereu a abertura de inquérito para sua apuração. O Ministro Celso de Mello abriu inquérito e determinou a apuração dessas acusações.
Acontece que em depoimento de oito horas na Polícia Federal de Curitiba o ex Ministro Sergio Mouro declarou que em nenhum momento acusou o Presidente de ter cometido crime. É verdade, mas o ex Ministro descreveu a conduta tipificada no art. 299 do Código Penal (falsidade ideológica). Quanto às razões que levaram à exoneração do Diretor-Geral da Polícia Federal Sérgio Moro asseverou que a pergunta deve ser feita ao Presidente. Declarou, outrossim, expressamente que o Presidente em momento algum solicitou o relatório da inteligência do PF.
Se não há imputação de crime, porque negado pelo ex Ministro Sergio Moro, o inquérito deve ser arquivado por perda de objeto. Não cabe o STF investigar o Presidente da República por outras eventuais infrações que não sejam de natureza penal.
Isolamento horizontal
O isolamento social horizontal, sem se atentar para as condições econômicas das pessoas, não pode dar certo. Ameaças de prisões, multas, bloqueio de vias públicas, alteração repentina das regras do rodízio etc. não são suficientes para manter todos em suas casas.
Milhares de pessoas pobres, que não possuem reservas financeiras, saem de casa para assegurar o pão de cada dia. Não pode o Estado condenar essas pessoas a morrer de fome. É preciso dar meios para que essas pessoas possam sobreviver sem sair de casa.
É verdade que o governo federal instituiu o auxílio emergencial de R$600,00 mensais. Mas, quer em razão da burocracia, quer em função de despreparo dos beneficiários para se habilitarem no programa emergencial, milhares de pessoas até hoje não conseguiram receber, desde que se iniciaram seus pagamentos em abril. E mais, muitos dos que conseguiram o crédito em sua conta bancária foram vítimas de larápios informatizados que se apropriaram desses auxílios governamentais.
Dentro desse quadro não há como manter isoladas essas pessoas carentes. O poder público deve agir com rigor contra aqueles que estão frequentando praias, organizando reuniões festivas ou simplesmente perambulando pelas ruas sem ter nada o que fazer.
SP, 11-5-2020.