Em poucas palavras 79 – série de artigos curtos do jurista Kiyoshi Harada. Acompanhe semanalmente.
Financiamento de campanhas e o voto de cabresto
Vedado o financiamento de campanhas por pessoas jurídicas, dentre outras razões, por violação dos princípios da isonomia, da democracia, da proporcionalidade e do princípio republicano, por maioria de votos, após intenso debates plúrimos (ADI nº 4650, Re. Min. Luiz Fux, DJe de 8-3-2016), esse financiamento privado foi substituído por dinheiro público. Todo cidadão passou a ser obrigado a custear as despesas de campanhas dos políticos.
Só que esses candidatos a cargos eletivos podem continuar recebendo donativos de pessoas físicas, bem como despender recursos próprios até o limite global das despesas por candidatos.
Quem elabora a Lei do Fundo Partidário e fixa os valores para financiar as campanhas de cada eleição, que atualmente atinge a cifra de bilhões de reais, são os que estão no exercício de mandatos. Rios de dinheiros públicos são desperdiçados, pois essas despesas não contribuem para a renovação dos representantes, nem para a melhoria de qualidade da representação popular.
Assim, pode-se dizer que o financiamento público de campanhas políticas veio como sucedâneo do antigo “voto de cabresto”. O tempo passa, mas a história se repete, nunca avançando de forma linear. É o corsi e ricorse de que falam os italianos.
Ministro Gilmar Mendes suspende o processo conduzido pelo Juiz Bretas do Rio
Como se sabe, o juiz Bretas, da 7ª Vara Criminal, responsável pela condução de processos oriundos da operação lava jato no Rio de Janeiro, havia ordenado busca e apreensão generalizada em 75 endereços de advogados e de empresas com base na delação premiada do ex Presidente da Fecomercio-Rio, Orlando Diniz que implica autoridades com foro privilegiado.
O caso ficou conhecido como a maior investida da história contra a advocacia. Gerou reclamações de advogados e da OAB junto ao STF.
O Ministro Gilmar Mendes em decisão liminar acatou as reclamações e suspendeu o processo até o julgamento do mérito pelo Plenário da Corte.
STF declarou inconstitucionalidade do aumento da Taxa Siscomex
A Taxa de utilização do Sistema Integrado de Comércio Exterior – SISCOMEX –foi instituída pela Lei nº 9.716/98 e é cobrada por ocasião do registro da Declaração de Importação (DI).
A Portaria nº 157/11 do Ministério da Fazenda majorou o valor dessa taxa que era de R$30,00 para R$185,00. A Corte Suprema, atenta à sua jurisprudência dominante, que acolhe a natureza tributária dessa taxa, por maioria de votos, entendeu ser inconstitucional essa elevação que supera a atualização do valor original pelos índices de correção monetária (RE nº 1.258.934/SC, Rel. Min. Dias Tóffoli, Plenário Virtual, j. 29-9-2020).
Por não ter havido modulação de efeitos cabe a repetição de indébito dos valores não alcançados pela prescrição.
É possível a privatização da ECT?
Fala-se muito, ultimamente, em privatização da ECT. É verdade que essa estatal, prestadora do serviço postal e do correio aéreo nacional, protegida pela imunidade recíproca por decisão do STF, vem prestando outros serviços alheiros aos serviços de correios e telégrafos, concorrendo com empresas do setor privado.
Todavia, os defensores da privatização não podem esquecer o preceito constitucional do art. 21, X da CF:
“Art. 21 Compete à União:
X –manter o serviço postal d o correio aéreo nacional”
Não pode a União livrar-se de um serviço público que a Constituição lhe cometeu.
A solução para o desvirtuamento das finalidades da ECT, bem como da prática de atos corruptivos no seio dessa empresa estatal, não está na sua extinção ou na sua privatização, mas, na correção de rumos e na apuração e punição dos infratores.
Inacreditável discussão sobre estorno do ICMS na saída de mercadoria decorrente de comodato
Alguns setores da doutrina especializada continua entendendo que no comodato, por se caracterizar a não incidência tributária deve proceder ao estorno dos créditos das operações anteriores ao teor do inciso II, do § 2º do art. 155 da CF. E a jurisprudência dos tribunais, também, não estava pacificada até que nos autos do RE nº 1.141.756, em sede de repercussão geral, decidiu, por maioria de votos, pela manutenção do crédito do ICMS pela saída de celular em regime de comodato, promovida por empresa de telefonia móvel.
Contudo, a decisão não foi nada pacífica. Houve divergências, com argumentos vários e conflitantes entre si.
Ora, não faz sentido a continuidade da discussão sobre o tema, desde o momento em que o STF sumulou a não incidência tributária no caso de comodato, conforme o verbete de nº 573: Não constitui fato gerador do Imposto de Circulação de Mercadoria a saída física de máquinas, utensílios e implementos, a título de comodato.
A discussão que ainda perdura revela insuficiência no conhecimento da teoria geral do fato gerador, elemento nuclear, básico e fundamental para o início do estudo de direito tributário. Se o fato concreto ocorrido não estiver situado dentro do campo de incidência tributária delimitado pelo fato gerador da obrigação tributária, obviamente, não cabe falar em desoneração tributária por meio de isenção ou não incidência de que trata o preceito constitucional retrorreferido. Sustentar o contrário seria o mesmo que alguém perdoar a dívida de quem nada deve.
No caso de transferência de mercadoria de um estabelecimento para outro (Súmula 166 do STJ) acontece a mesma coisa, ou seja, não há ocorrência do fato gerador pelo que descabe a cogitação de estorno do crédito do ICMS. Não é preciso se debruçar sobre cada caso concreto de não incidência por inocorrência do fato gerador, bastando o domínio da teoria geral do fato gerador da obrigação tributária em todos os seus aspectos.
Leia também a edição anterior.