Em poucas palavras 81 – série de artigos curtos do jurista Kiyoshi Harada. Acompanhe semanalmente.
Senador suspenso por 90 tira licença por 120 dias e abre vaga para seu filho que é suplente
Durante diligências de busca e apreensão realizadas pela Polícia Federal, o Senador Chico Rodrigues, líder do governo no Senado, escondeu dinheiro em sua veste íntima.
Acolhendo a representação policial, o Ministro Luis Barroso afastou o Senador do exercício do cargo por 90 dias, proibindo-o de fazer uso das dependências do Senado.
Entretanto, o astuto Senador tirou uma licença de 121 dias para dar lugar à posse de suplente, que é seu filho.
Diante desse fato superveniente, o Ministro Barroso, no último dia 20, suspendeu os efeitos da decisão que afastou o Senador do cargo. O Ministro Presidente, Luiz Fux, por sua vez, retirou de pauta o julgamento pelo Plenário do afastamento determinado por decisão monocrática do Ministro Barroso.
Fica a pergunta: Pode o Senador afastado de suas funções por decisão da Justiça tirar licença pelo prazo superior ao do afastamento e driblar a decisão judicial? Pode um servidor público suspenso requerer e obter feiras?
Conceito de insumos em época de pandemia para fins de dedução do PIS/COFINS
A falta de conceituação legal do que seja insumo tem gerado uma sucessão de demandas judiciais em relação ao PIS/COFINS não cumulativo.
Há uma tendência da jurisprudência no sentido de utilizar o conceito de insumo para fins de industrializado, representando tudo o que é usado no processo de produção quer para agregar ao novo produto, quer para ser consumido no processo de industrialização.
Trata-se a nosso ver de um conceito restritivo que não serve para o efeito de cálculo do PIS/COFINS devido, que decorre da comercialização de mercadorias ou da prestação de serviços.
Em economia costuma-se dizer que insumo é tudo aquilo que é preciso para produzir e comercializar mercadorias ou prestar serviços, tais como matéria-prima, equipamentos, horas trabalhadas etc.
Importante lembrar que o STF considerou que as embalagens fabricadas sob encomenda configuram insumos no processo de comercialização de mercadorias sujeitas à incidência do ICMS, e não do ISS (ADI nº 4389, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe de 25-5-2011).
Dentro dessa linha de raciocínio pode-se afirmar que os kits exigidos pelos protocolos, visando combate à covid-19, como máscaras e álcool gel que todos os estabelecimentos comerciais, industriais e de serviços estão obrigados a fornecer a seus empregados, constituem insumos, cujos valores poderão ser deduzidos no cálculo do PIS/COFINS.
A paixão ofusca a mente de juristas
A paixão é própria do ser humano. Dificilmente um homem consegue deixar de se contaminar pela paixão no trato de determinadas matérias, passando a defender teses que em não aprovariam em estado de serenidade.
Trago aqui dois textos iguais ou semelhantes, um da Constituição e outro do CPP para verificar como eles foram interpretados acaloradamente no Plenário do Conselho Superior de Direito da Fecomércio no dia 14-10-2020, quando estiveram presentes dois Senadores da República.
Art. 57, § 4º da CF:
“§ 4º Cada uma das Casas reunir-se-á em sessões preparatórias, a partir de 1º de fevereiro, no primeiro ano da legislatura, para a posse de seus membros e eleição das respectivas Mesas, para mandato de 2 (dois) anos, vedada a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subsequente”.
Art. 316, parágrafo único do CPP:
“Parágrafo único. Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor da decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal.“
São dois textos de lapidar clareza. Não há o que interpretar. Todavia, no primeiro caso não se permitiu ler além do que está no texto, não distinguindo a reeleição na mesma legislatura da reeleição em outra legislatura, porque n’uma e n’outra hipótese a eleição seria imediatamente subsequente.
No segundo tema, condenaram com veemência o HC concedido pelo Min. Marco Aurélio a um perigoso traficante, fazendo uma leitura que vai além do que está escrito no texto legal com solar clareza. Por se tratar de um perigoso traficante, os debatedores entenderam que excedido o prazo legal, o juiz que decretou a prisão preventiva deve ser instado a promover fundamentadamente a reavaliação quanto à manutenção ou não da prisão, sempre que ele se omitir em seu dever de ofício.
Incriminar o motorista que deixa o local do acidente é inconstitucional
O Ministro Marco Aurélio, Relator do processo entendeu que a criminalização da conduta do motorista que deixa o local do acidente interfere no direito fundamental de ir e vir. Em sua tese vencida propôs o seguinte: Surge inconstitucional o artigo 305 da Lei nº 9.503/1997 (Código de Trânsito Brasileiro), no que versa tipo penal considerado o fato de condutor do veículo deixar o local do acidente.
O Ministro Relator distinguiu a situação de simplesmente deixar o local do acidente da outra situação em que o motorista se afasta do local sem prestar assistência às vítimas do acidente, fato que veio à luz posteriormente.
Argumentou que muitas vezes isso ocorre em virtude de receio de sofrer consequências ante o aglomerado de pessoas, ou estado psíquico, traumatizado em razão do acidente (ADC nº 35).
Com a devida vênia não se pode declarar inconstitucional o preceito legal apontado em nível de controle abstrato e concentrado.
Quem se afasta do local, sem verificar se o acidente causou ou não vítimas, corre o risco de ulteriormente vir a ser responsabilizado civil e penalmente. O receio de conseqüência tendo em vista o aglomerado de pessoas, por sua vez, constitui matéria de defesa, não podendo em função disso descriminalizar a conduta tipificada no art. 305 do CBT.
SP, 26-10-2020
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