Em poucas palavras 94

Em poucas palavras 94

Em poucas palavras 94 – série de artigos curtos do jurista Kiyoshi Harada. Acompanhe semanalmente.

Imunidade de deputados estaduais impugnada pela ABM

A Associação dos Magistrados do Brasil – AMB – ingressou com ADIs contra dispositivos das Constituições do Rio de Janeiro e do Estado de Rio Grade do Norte que prescrevem a imunidade de deputados estaduais nos mesmos moldes previstos para os senadores e deputados federais no art. 53 da CF.

Segundo a AMB tais dispositivos das Constituições estaduais violam os princípios democrático, republicano e da separação dos Poderes, uma vez que impossibilitam o Poder Judiciário de exercer a jurisdição.

A PGR manifestou-se pela improcedência das ADIs.

Realmente, os pedidos são improcedentes, pois as Constituições guerreadas limitaram-se a reproduzir o que está no art. 53 da CF, com fundamento no § 1º, do art. 27 da CF, conforme dispositivos abaixo transcritos:

“”Art53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.

Art. 27. O número de Deputados à Assembléia Legislativa corresponderá ao triplo da representação do Estado na Câmara dos Deputados e, atingido o número de trinta e seis, será acrescido de tantos quantos forem os Deputados Federais acima de doze.

 § 1º Será de quatro anos o mandato dos Deputados Estaduais, aplicando-se-lhes as regras desta Constituição sobre sistema eleitoral, inviolabilidade, imunidades, remuneração, perda de mandato, licença, impedimentos e incorporação às Forças Armadas.

Ante a lapidar clareza dos textos constitucionais retrotranscritos não cabe à ABM questionar a independência e harmonia dos Poderes nos limites desenhados pelo legislador constituinte original.

Condomínio pode expulsar condômino por mau comportamento?

O condomínio ajuizou contra a condômina-inquilina e o proprietário da unidade autônoma uma ação judicial para vê-la afastada do prédio, por seu comportamento agressivo e atitudes antissociais que perturbam a paz e a harmonia entre os demais moradores.

Entretanto, o pedido foi negado em primeira instância, e a sentença foi mantida em segundo grau de jurisdição.

Conforme o Relator, Des. Costa Wagner, a improcedência do pedido não significa concordância com a conduta da ré, mas apenas ausência de amparo legal. Segundo o magistrado, a aplicação de sucessivas multas em valores altos, no intuito de forçar a mudança de comportamento, é a medida a ser tomada no caso. Também é possível ajuizar ação na esfera penal em caso de ocorrência de ameaça ou lesão corporal.

Para o Relator “o que não se pode, repita-se, por ausência de previsão legal, é expulsar a ré, que é pessoa idosa e em situação de extrema vulnerabilidade, ainda mais diante do estado de calamidade pública gerado pela pandemia da Covid-19″, completou o magistrado. A decisão se deu por unanimidade (Processo 1029307-52.2018.8.26.0001).

Certamente, o estado de vulnerabilidade e o fato de estarmos em meio à pandemia deve ter influenciado na decisão, mas, esse entendimento não é pacífico na jurisprudência. Há decisões permitindo a interdição de uso de unidade autônoma pelo proprietário que causa transtornos aos demais moradores do prédio por seu comportamento egoístico e antissocial. Ele poderá locar a unidade, mas, não poderá nela residir. É a solução que mais se ajusta ao fim social do direito.

Hipnose investigativa

Nos Estados Unidos é comum a polícia utilizar-se da hipnose como técnica de investigação.

Há relatos de casos em que uma testemunha que não reconheceu o acusado como o autor do crime, após ser submetida a uma sessão de hipnose apontou com segurança o acusado como sendo a pessoa que cometeu o homicídio. Em consequência o acusado foi condenado à pena de morte, e está aguardando o dia de sua execução.

Recentemente, a questão foi parar na Suprema Corte Americana. Mas, a Corte não conheceu a matéria, acenando com a necessidade de a hipnose investigativa ter previsão na lei de cada Estado. Saiu-se pela tangente. O problema quando houver previsão legal e a questão for levada à Corte Suprema.

Fosse no Brasil, com previsão ou sem previsão, o STF iria adentrar no exame do mérito e decidir de uma forma ou outra, suprindo a lacuna da lei.

Conflito de competência no STF provocado pelo ex juiz Sergio Moro

O ex juiz Sergio Moro, por meio de sua esposa, advogada inscrita na seccional de Curitiba, ajuizou a Reclamação nº 45.729 dirigido ao Ministro Edson Fachin contra ato do Ministro Ricardo Lewandowski que liberou à defesa do ex-presidente Lula as mensagens obtidas na chamada operação “spoofing”.

Sustenta que aquelas informações correspondem aos dados roubados de celulares de Procuradores da República pelos Hackers, e que a competência para deliberar sobre a matéria seria do Ministro Edson Fachin a quem estão afetos os processos relacionados com o ex presidente Lula.

Na reclamação, Moro pede a revogação da liminar concedida pelo Min. Ricardo Lewandowski.

A área técnica do STF pediu orientação do presidente Min. Luiz Fux para proceder a distribuição da referida reclamação, porque o Regimento Interno da Corte não contempla a hipótese versada na Reclamação, pois, o reclamante não é parte no processo a justificar sua distribuição ao Min. Edson Fachin, e por outro lado, o processo não poderia ser distribuído, também, ao Ministro cujo ato é impugnado.

O estranho nisso tudo é o interesse demonstrado pelo ex juiz Sergio Moro na utilização ou não de dados supostamente obtidos por meios ilegais. Ele é um cidadão comum como qualquer um de nós.

O ex Ministro Sergio Moro continua assumindo o protagonismo, desde a sua saída ruidosa do Ministério da Justiça e da Segurança Pública, ora por iniciativa própria, ora por ação da mídia que vem trazendo à tona fatos do passado que em nada contribuem para preservar a sua boa imagem como juiz que foi.

Caos orçamentário

Já está incorporado na cultura dos legisladores não aprovarem o PLOA no prazo constitucional, obrigando o governo efetuar despesas sem prévia autorização legislativa.

O orçamento de 2021 ainda não foi aprovado, mas discute-se muito a flexibilização do orçamento (inexistente) alegando estado de pandemia. Créditos suplementares também são abertos por conta de verbas previstas no futuro orçamento.

Há, sem dúvida, uma preferência do Legislativo de efetuar gastos sem obediência ao princípio da legalidade. A PEC nº 565/06 que prevê a não interrupção da sessão legislativa sem aprovação do projeto de lei orçamentária continua engavetado.

Embora não haja mais regra semelhante à do art. 68 da Constituição de 1969 (Emenda 1/69) que permitia ao Presidente da República promulgar o projeto de lei orçamentária na omissão do Legislativo, a interpretação sistemática do § 2º, do art. 35 do ADCT permite a promulgação do projeto orçamentário pelo Executivo se o Legislativo deixa de devolvê-lo até o final da sessão legislativa.

Conclui–se, portanto, que a inaprovação do orçamento anual é conveniente e desejada tanto pelo Legislativo, como pelo Executivo. Quando aprovado tardiamente, o orçamento é solenemente ignorado.

Quanto maior a quantidade de normas constitucionais voltadas para a execução orçamentária, mais e mais o orçamento é descumprido. E nada acontece, salvo quando o País perde a governabilidade, hipótese em que se saca do bolso do colete algum preceito orçamentário descumprido para decretar o impeachment.

SP, 8-2-2021.

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