Em poucas palavras 97

Em poucas palavras 97

Em poucas palavras 97 – série de artigos curtos do jurista Kiyoshi Harada. Acompanhe semanalmente.

Prisão do Deputado Daniel Silveira

O Deputado foi preso em flagrante pelo Min. Alexandre de Moraes do STF por ter postado na rede social palavras ofensivas contra os Ministros e contra a instituição a que eles pertencem, e que por meio de um discurso de ódio subverteu a ordem jurídica.

A Câmara dos Deputados apreciando a questão referendou a prisão e comunicou o fato de imediato ao STF.

O grande problema reside em saber se houve ou não o estado de flagrância, caso contrário a prisão não poderia ter sido decretado senão depois de instaurado o processo criminal com decisão condenatória.

Dizer que se trata de crime continuado porque o discurso ficou postado na mídia até o momento da prisão é altamente discutível.

O crime em causa, a nosso ver, se consumou e se exauriu com a postagem do discurso.  De fato, se o discurso tivesse sido publicado em um jornal da grande circulação seria difícil sustentar o estado de flagrância pelo fato de os leitores continuarem lendo diariamente o texto de um jornal velho. Somente com a destruição de todos os exemplares daquele jornal é que o crime deixaria de existir. No caso de divulgação pela rede social, como fez o deputado, o crime continuaria por cinco ou dez anos enquanto não fosse removido. Isso atenta contra o princípio da razoabilidade na interpretação do estado de flagrância.

STF decide que o ICMS integra a base de cálculo da CPRB

A confusão jurisprudencial no STF está se alastrando cada vez mais.

O ICMS não pode integrar a base de cálculo do PIS/COFINS, nem o ISS, porém, deve integrar a base de cálculo da CPRB que tem idêntica natureza do PIS/COFINS, isto é, incide sobre a receita bruta.

Por outro lado, a CSLL integra a base de cálculo do IRPJ mesmo sendo uma despesa para o contribuinte, e o IRPJ ter como fato gerador um acréscimo patrimonial. Assim, estamos diante de uma despesa sendo tributado pelo imposto que se funda no acréscimo patrimonial.

É chegado o momento de retomar o julgamento mediante critérios estritamente jurídicos, para se livrar desse mar de confusões. E, mais a coerência se impõe até mesmo no erro.

Prisão do deputado Daniel Silveira e a reação legislativa

Ao invés de a Câmara dos Deputados aplicar os mecanismos jurídico-constitucionais previstos na Constituição vigente partiram para elaboração e aprovação, a toque de caixa, de uma PEC que versa sobre imunidade parlamentar, já apelidada de PEC da impunidade. Vários deputados despidos de paixão conseguiram frear o regime de urgência urgentíssima de sua tramitação para maior reflexão.

Nos debates havidos na Câmara para eventual relaxamento da prisão ninguém adentrou no exame do art. 53 da CF que cuida da imunidade do parlamentar, nem do estado de flagrância e muito menos da inafiançabilidade do crime que se limita aos delitos de tortura; crimes hediondos; tráfico de drogas; racismo; terrorismo; e ação de grupo armado contra a ordem constitucional e o estado democrático. Não integram esse rol os crimes de injúria ou difamação que caracterizam as ofensas proferidas contra os integrantes do STF, ainda que com veemência e truculência.

 Dentre outras coisas, essa PEC prevê que o parlamentar preso em fragrante por crime inafiançável ficará sob a custódia do Senado ou da Câmara, conforme o caso, uma inovação legislativa inusitada sob todos os aspectos.

Essa proposta de Emenda já foi questionada no STF pelo deputado Kataguiri, mas o Ministro Roberto Barroso não concedeu a sustação liminar de sua tramitação, reservando-se ao direito de posterior apreciação se e quando provocado.

O abalo do princípio da segurança jurídica

O princípio da segurança jurídica que se constitui em um dos mais importantes pilares do Estado Democrático de Direito está sendo relativizado por decisões do STF, ora interpretando contra expresso texto constitucional, ora remexendo em questões pacificadas há décadas para firmar novo entendimento, sem que tivesse havido modificação legislativa, ora inovando a ordem jurídica positivada.

Sem a estabilidade das leis e da jurisprudência da Corte Suprema não é possível a previsibilidade que dá embasamento ao princípio da segurança jurídica.

Só a título ilustrativo citemos alguns exemplos mais recentes do STF que conspiram contra o princípio aqui versado: a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/COFINS, mas a sua inclusão na base de cálculo da CPRB; a dupla tributação pelo IPI do produto industrializado importado em nome da isonomia com o produto similar nacional, tributado apenas uma vez; a interpretação extensiva da lista de serviços do ISS para enxergar tributação onde a lei não prevê; a criminalização do devedor do ICMS inovando o inciso II, do art. 2º da Lei nº 8.137/90; o retorno da tese de tributação pelo ICMS em operações em que não há circulação em sentido jurídico (troca de propriedade ou de posse); pagamento do IPVA no local do domicílio do proprietário, confundindo com o local do registro do veículo que pode ser tanto no domicílio, como na residência do proprietário conforme art. 120 do CBT, impactando as finanças dos Estados  e dos municípios onde os veículos estão registrados. Tudo isso, preocupa os estudiosos, a classe produtora, aumenta as demandas e eleva o custo Brasil.

As jaboticabas e a lição de vida

Quando se tem uma bacia cheia de jaboticabas, as pessoas vão comendo sem se preocupar em saboreá-las por inteiro. Dão uma mordida e logo as atiram fora, sem sugar o precioso líquido que se extrai da camada que envolve as sementes.

Mas, quando as jaboticabas estão se acabando, elas são cuidadosamente saboreadas chegando até mastigar suas sementes, assim como a sua casca.

Assim é a vida. Quando se é jovem, ninguém se preocupa em evitar disputas vãs, de se empolgar com coisas fúteis, de se relacionar com pessoas que nada acrescentam para você.

Mas, quando restam poucos anos de vida, as pessoas tendem a evitar discussões inúteis e escolher as pessoas com que devem se relacionar, evitando as pessoas complicadas ou limitadas que lhes causam o estresse e encurtam a vida das pessoas.

SP, 1-3-2021.

Por Kiyoshi Harada

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