FGTS e correção monetária

A correção monetária tem sua origem na década de 60 como meio de repor o poder aquisitivo da moeda. Ela nada acresce, limitando-se a atualizar o poder de compra da moeda que tem curso forçado.

Inicialmente, a jurisprudência do STF admitia a correção monetária nos casos previstos no contrato; em casos de atraso no pagamento de indenizações decorrentes de desapropriação; nos casos de indenizações por ato ilícito, posteriormente generalizada para todas as hipóteses de responsabilidade civil, e em casos expressos em lei. Diversas leis foram editadas a respeito, como a Lei nº 4.357/64 referente a débitos tributários; Lei nº 4.595/64 referente ao SFN; Lei nº 4.380/64 referente ao SFH etc.

Com o advento da Lei nº 6.899, de 8-4-1981, passou a ser devida a correção monetária incidente sobre débitos de qualquer natureza resultante de condenação judicial. Segundo o Decreto regulamentador de nº 86.649/81 a correção monetária era feita pela ORTN, depois OTN.

No que tange ao FGTS temos que a Lei nº 5.107, de 19-9-66, que o criou determinava a correção monetária dos depósitos das contas vinculadas em nome dos empregados agrupados no Fundo, por meio de legislação específica (art. 3º). Essa Lei foi revogada pela Lei nº 7.839/89, por sua vez, revogada pela vigente Lei de nº 8.036, de 11-5-1990, cujo art. 13 prescreve a correção monetária dos depósitos efetuados nas contas vinculadas com base nos parâmetros para atualização dos saldos dos depósitos de poupanças, além da capitalização de juros de 3% a.a. Após a centralização dos depósitos existentes nas contas vinculadas na CEF, a atualização monetária e a capitalização de juros passaram a correr à conta do Fundo, sendo o respectivo crédito efetuado na conta vinculada de cada empregado no 1º dia útil de cada mês (§ 2º, do art. 13).

Nos termos do art. 9º e parágrafos dessa Lei os recursos do FGTS são aplicados nas áreas de habitação, saneamento básico e infra-estrutura urbana. Os projetos de saneamento básico e de infraestrutura urbana devem ter caráter complementar dos programas habitacionais. Por isso, fala-se em vinculação dos recursos do FGTS aos projetos habitacionais, dentro da política governamental de inclusão social.

Essa sistemática de correção dos recursos do FGTS pela TR, e consequentemente dos depósitos em contas vinculadas em nome dos empregados, passou a ser questionada a partir do momento em que o STF repeliu a aplicação dos índices de poupança para corrigir os valores consignados nos precatórios judiciais, como previsto no § 12, do art. 100 da CF na redação dada pela Emenda Constitucional de nº 62/09, conhecida como “emenda do calote”, que sequer respeitou a coisa julgada, determinado a aplicação de novo critério de correção a partir da vigência da aludida Emenda.

Desenvolveu-se o seguinte raciocínio:

Se a TR não serve para atualizar os débitos resultantes de condenação judicial, também, não deve servir para atualizar os recursos do FGTS que, em última análise, vai repercutir no montante do valor depositado na conta vinculada de cada empregado.

Poder-se-ia argumentar que a distinção encontra amparo no princípio da isonomia. Contudo, uma coisa é a correção monetária do débito resultante de condenação judicial; outra coisa bem diversa é a correção monetária dos recursos do FGTS que não tem natureza de dívida contratual ou decorrente de condenação judicial. A razão do discrímen autoriza a distinção sem que se possa invocar a quebra do princípio de isonomia. Por isso, o art. 27 da Lei nº 12.919/13 que aprovou a Lei de Diretrizes Orçamentárias para o exercício de 2014 prevê a correção dos valores consignados nos precatórios, durante o exercício de 2014, pela variação do IPCA-E do IBGE.

Todavia, como vimos, a correção monetária surgiu para reposição do poder aquisitivo da moeda em face da inflação que atinge os valores de quaisquer espécies.

Colocada a questão nesses termos não há como deixar de concluir que os valores depositados mensalmente na conta vinculada de cada empregado à razão de 8% do seu salário, se não forem corrigidos pelo indexador que reflita a real diminuição do poder aquisitivo da moeda, irá sofrendo perdas sucessivas com o passar do tempo, gerando uma situação de grave injustiça social. Não se pode perder de vista que a finalidade do FGTS é a propiciar ao empregado o levantamento daqueles valores depositados, evidentemente, de forma atualizada, em caso de injusta despedida a título de indenização por tempo de serviço prestado. O FGTS surgiu como sucedâneo da extinta estabilidade no emprego após dez anos de serviço, ou seja, o FGTS substituiu a estabilidade no emprego que assegura ao empregado o reajuste periódico de seus salários até além dos índices inflacionários.

Por tais razões, as opiniões de juristas e Ministros do STF estão divididas, sustentando ambas as correntes argumentos igualmente relevantes.

O único obstáculo que enxergamos na tese do tratamento isonômico na correção, tanto dos valores expressos em precatórios, como dos recursos depositados no Fundo, é a vinculação de seus recursos aos programas habitacionais.

Realmente, os prestamistas da “casa própria” não teriam como arcar com as correções das prestações mensais pelo índice de variação que não seja aquele representado pela remuneração dos saldos das cadernetas de poupança. A aplicação do IPCA sobre os valores das prestações acarretaria situações de insolvência.

Por isso, as inúmeras decisões judiciais condenando a CEF a corrigir os recursos do FGTS por um índice que espelhe a real inflação poderão causar sérios problemas financeiros ao agente gestor do FGTS que tem aplicado seus recursos nos programas habitacionais.

Como se verifica, a questão deve ser analisada sob um enfoque múltiplo, levando em conta os efeitos colaterais de uma decisão que poderá atingir o próprio empregado, titular da conta vinculada, e ao mesmo tempo prestanista da “casa própria.”

Diferente será a hipótese de uma decisão proferida no bojo de uma ADI, quando os seus efeitos poderiam ser modulados levando-se em conta os recursos injetados no financiamento da casa própria.

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