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O impacto da falta de coesão do governo Bolsonaro

O Senhor Jair Bolsonaro, eleito pela expressiva maioria da população como alternativa para a retomada do crescimento econômico, estabilidade das instituições públicas e combate à corrupção, desde o início mostrou-se muito frágil na condução das políticas públicas, por conta de seu radicalismo de direita, e falta de um plano consistente nos dois primeiros anos de seu governo, situação que não foi corrigida no terceiro ano de mandato.

Ao contrário, neste ano que antecede o pleito eleitoral de 2022 e que a pandemia alcança a sua fase mais aguda, a falta de firmeza na condução das políticas públicas agravou-se sobremaneira com remanejamentos de titulares de importantes pastas ministeriais, inclusive, com a inusitada alteração simultânea no Comando das três forças singulares que compõem as Forças Armadas, causando no mínimo uma situação de desconforto no seio da corporação militar. Seguiu-se, também, o remanejamento nos cargos de segundo escalão: o Diretor da Polícia Federal foi trocado pela 3ª vez, e o cargo de Diretor da Polícia Rodoviária, igualmente, foi alterado.

O centralismo sem igual do Senhor Presidente não consegue manter nos quadros da administração pessoas com visões técnicas, pois ele promove substituições sempre que tiver contrariado seus interesses pessoais que são frequentemente confundidos com os interesses do Estado.

O quadro administrativo instável resulta em descontinuidade do serviço público e o governo acaba perdendo a sua articulação com o Poder Legislativo, por ausência de um interlocutor efetivo, estável e eficiente.

Resultado dessa desorganização administrativa do governo Bolsonaro foi a aprovação do orçamento de 2021 com três meses de atraso, contendo R$ 27,2 bilhões a título de emendas parlamentares de obrigatória execução. Essas verbas são direcionadas para as despesas de investimentos que no total monta a R$ 56 bilhões, isto é, quase metade das despesas fixadas a esse título são representadas por verbas oriundas de emendas parlamentares.

O Ministro Paulo Guedes diz que é impossível a execução desse orçamento. Sustenta que houve extrapolamento do acordo firmado como o Parlamento, inicialmente, no valor de R$ 8 bilhões e posteriormente ampliado para R$ 16 bilhões, mas, nunca no importe de R$ 27,2 bilhões.

A Câmara dos Deputados sustenta que houve acordo com o governo para chegar ao teto de R$ 27,2 bilhões. O Ministro Paulo Guedes referiu-se ao episódio como “Ministro fura-teto” sinalizando a interferência de outros Ministros na ligação com o Congresso Nacional para proceder à discussão e votação do orçamento anual de 2021, resultando no desastre retroapontado.

Não se sabe se a desorganização administrativa do Executivo resulta de incapacidade de coordenação do dirigente maior, ou se é proposital o atropelamento do interlocutor natural nessa questão que é o Ministro da Economia.

Seja como for, com vários governantes decorrentes da mistura do sistema presidencialista com o sistema parlamentarista de governo resultou no sistema promiscuista, eufemisticamente denominado de presidencialismo de coalizão.

Governar é ato de direcionar a execução das despesas públicas. É por meio da execução dessas despesas públicas que é exercido o governo.

Com tantos atores querendo governar (513 deputados) parece óbvio que o País vai à deriva. O governo deve ser de uma só pessoa legitimada pelo voto popular. O exercício do poder é solitário, não comportando compartilhamento com familiares, amigos ou parlamentares. O Presidente da República deve governar segundo as leis aprovadas pelo Congresso Nacional que, sabidamente, não tem função de governar como acontece com as execuções de verbas resultantes de emendas parlamentares.

Como são visíveis os sinais para se impedir o veto a essas emendas parlamentares, ou a sua derrubada caso se concretize o veto, poucas manobras políticas restam ao governo para superar o impasse.

O quadro econômico-financeiro do País está muito complicado. O Executivo deve fazer investimentos de acordo com o plano de governo, enquanto o Legislativo também disputa a primazia nos investimentos nas áreas de sua livre escolha, até o limite de R$ 27,2 bilhões. Quando se confundem as funções de legislar com as de executar tudo se complica. O princípio da independência e harmonia dos poderes está sendo esvaziado por sucessivas emendas que não obedecem ao disposto no inciso III, do § 4º, do art. 60 da CF. Aliás, diga-se de passagem, nenhum dos três Poderes está obedecendo a Constituição.

Como tradicionalmente a LOA jamais foi cumprida em sua integralidade por nenhum dos governantes no pós Constituição de 1988, resta ao Senhor Presidente a execução do orçamento à sua descrição de forma a melhor atender aos interesses da sociedade, promovendo as despesas de investimento onde julgar necessários e imprescindíveis para assegurar a expansão da capacidade produtiva do País, abalado financeiramente pelo longo estado de pandemia.

Uma forma de promover esses gastos de forma discricionária é a de lançar mão dos fabulosos recursos que compõem o Fundo sem nome, conhecido pela sigla DRU, composto de 30% da arrecadação de todos os tributos da União, excetuadas apenas as arrecadações da contribuição previdenciária.

Os próprios parlamentares que tornaram inviável a execução orçamentária já reconhecem que eventual execução do orçamento com desvios de verbas não caracterizaria o crime de responsabilidade.

Afinal de conta o orçamento não é um fim em si mesmo, mas, um meio para promover o bem comum, mediante execução de despesas públicas, preservando ao máximo o equilíbrio das contas públicas.

Para complicar mais ainda o que já está ruim, o Senhor Presidente abriu uma crise com o Poder Judiciário ao atacar, mediante uso de linguagem emotiva como é de seu feitio, o Ministro Roberto Barroso que acolheu o pedido de dois Senadores da República determinando a instauração da CPI da Covid-19.

Por Kiyoshi Harada SP, 12-4-2021.

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