Kiyoshi Harada
Jurista e professor, presidente do IBEDAFT
O Congresso Nacional aprovou o projeto de lei ampliando os destinatários do Benefício de Prestação Continuada – BPC – para os idosos com mais de 65 anos e de baixa renda.
Por esse projeto legislativo aprovado, o pagamento do BPC, que estava limitado a quem ganhava até R$ 261,25 (um quarto do salário mínimo), foi ampliado para R$ 522,50. Com isso, houve uma despesa adicional de R$ 217 bilhões, não computados no orçamento em curso.
Por tais razões, o Executivo vetou esse projeto de lei aprovado pelo Parlamento Nacional à revelia do governo.
Contudo, o veto foi rejeitado pelo Congresso Nacional criando um impasse jurídico.
Esse adicional de despesa veio em um dos piores momentos que o país está enfrentando. De um lado, a sensível queda de arrecadação tributária como consequência da crise econômica, agravada pela pandemia (Covid-19) e a diminuição das receitas patrimoniais da União, decorrente de queda de ações da Petrobrás na Bolsa de Valores, e de outro lado, gastos imprevistos com medidas preventivas e tratamento da população com sintomas ou contaminadas pelo vírus oriundo da China.
Faltou sensibilidade política dos parlamentares e a confusão se instaurou.
Fala-se em uma alternativa para não aplicar esse aumento do BPC.
O governo pensa em acionar do Tribunal de Contas da União – TCU – para vetar o pagamento desse adicional, por falta de previsão da respectiva fonte de custeio.
Entretanto, a regra do § 5º, do art. 195 da CF não se aplica em relação ao BPC:
“§ 5º Nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio”.
O benefício de que trata esse parágrafo 5º, a nosso ver, se refere ao benefício da previdência social organizada sob forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial” (art. 201 da CF).
A percepção do BPC não tem caráter contributivo, podendo ser percebido pela população carente em geral, independentemente de contribuição previdenciária. Trata-se, na verdade de um benefício assistencial, e não previdenciário. Por isso, não tem pertinência a observância de “critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial”.
Muito embora a assistência social integre a seguridade social ao lado da saúde e da previdência social (art. 194 da CF) com esta não se confunde, apesar de a reforma da previdência ter introduzido alteração na área de assistência social. Aliás, essa reforma extrapolou os limites da previdência social, tanto é que até incursionou até na área do Judiciário.
Parece não caber ao TCU vetar o pagamento da diferença com base no § 5º, do art. 195 de CF. Também é problemático àquela Corte de Contas vetar o pagamento do BPC acrescido, sob o argumento de que ultrapassa os limites das despesas fixadas no orçamento, pois, isso implicaria seleção pela Corte de Contas de políticas públicas a serem executadas. Diante da falta de recursos financeiros não cabe ao TCU decidir que políticas públicas deverão ser parcialmente atingidas, porque isso implicaria ato de gestão, sem terem os seus ministros legitimidade para tanto, ao atuarem como sócios do governante legitimamente eleito pelo povo.
Dessa forma, tudo indica que para a hipótese sob exame deva ser providenciada a abertura de crédito adicional suplementar (arts. 40 e 41, I da Lei nº 4.320/64) no curso da execução orçamentária, como vem acontecendo na generalidade dos casos, mediante prévia autorização legislativa. Não há porque fugir da regra para esse caso específico. Já se tornou uma praxe gastar mais do que a verba fixada na dotação inicial.
Mas esta não é uma questão pacífica. Muito provavelmente ela acabará sendo judicializada.