Consta do subitem 17.14 da lista anexa à Lei Complementar nº 116/2003 de forma bem sucinta:
17.14 – Advocacia
O conteúdo da advocacia está definido no art. 1º da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994 (Estatuto da Advocacia) nos seguintes termos:
“São atividades privativas de advocacia:
I – a postulação a qualquer órgão do Poder Judiciário e aos juizados especiais;
II – as atividades de consultoria, assessoria e direção jurídicas.
- 1º – Não se inclui na atividade privativa de advocacia a impetração de habeas corpus em qualquer instância ou tribunal.
- 2º – Os atos e contratos constitutivos de pessoas jurídicas, sob pena de nulidade, só podem ser admitidos a registro, nos órgãos competentes, quando visados por advogados;
- 3º – É vedada a divulgação de advocacia em conjunto com outra atividade”.
Todos os atos previstos nos incisos I e II são privativos de advogados regularmente inscritos nos quadros da OAB, com exceção da impetração de habeas corpus.
A tributação pelo ISS dessas atividades desenvolvidas pelo advogado ou sociedade de advogados ocorre por meio de um regime especial, na forma dos §§ 1º e 3º, do art. 9º do Decreto-lei nº 406/68, mantidos pela Lei Complementar nº 116/2003. E de conformidade com as reiteradas decisões plenárias do STF e das duas Turmas daquela Alta Corte de Justiça do País aqueles preceitos do citado art. 9º foram recepcionados pela Constituição de 1988 com caráter de lei complementar.
Os serviços concernentes à advocacia, referidos no art. 1º do Estatuto da Advocacia, quando contratados por interessados mediante pagamento de honorários advocatícios geram a obrigação de pagar o ISS pelo regime especial de tributação por alíquota fixa.
Acontece que algumas municipalidades vêm tributando pelo ISS os honorários de sucumbência, ao arrepio da lei de regência nacional do ISS, Lei Complementar nº 116/2003 que em seu art. 1º define o fato gerador nos seguintes termos:
“Art. 1º. O imposto sobre serviço de qualquer natureza de competência dos municípios e do Distrito Federal tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses preponderantes do prestador.”
Depreende-se do exame deste texto legal que não basta a previsão na lista de serviços, como é o caso do item 17.14 sob exame, sendo necessária a efetiva prestação do serviço advocatício.
Tributar honorários de sucumbência é confundir com os honorários advocatícios pactuados entre as partes interessadas. Mais do que isso, é confundir serviços de advocacia, mero objeto do ISS, com a prestação efetiva dos serviços advocatícios que é o fato gerador do imposto.
Essas legislações municipais, que tributam os honorários de sucumbência, incidem no mesmo equívoco de alguns doutrinadores que, com suposto amparo na doutrina do abalizado Bernardo Ribeiro de Moraes, afirmam que o ISS incide sobre os “serviços de qualquer natureza”.
De fato, Ribeiro de Moraes ao tratar do objeto do ISS afirma:
“De acordo com o seu objeto, o ISS se apresenta como um imposto que grava os ‘serviços de qualquer natureza, conforme discriminação constitucional de renda tributárias (Emenda Constitucional nº 1, de 1969, art. 24, nº II)”[1].
Porém, conforme assinalamos no nosso livro, o renomado Bernardo Ribeiro de Moraes ao discorrer sobre o fato gerador do ISS, asseverou:
“Já dissemos que o ISS que o que se grava ‘é a efetiva prestação de serviços’, a venda de um bem e material.
Embora as legislações dos municípios, via de regra não tenham se utilizado da expressão ‘efetiva prestação de serviço’, mas apenas ‘prestação de serviço’, para o conceito de incidência do ISS, o elemento efetiva prestação não pode ser dispensado. Quem ler ‘prestação de serviço na legislação municipal deve entender atividade efetiva de prestação de serviço” [2]
O que são alcançados pela tributação do ISS são os serviços de advocacia contratados pelos clientes do advogado. É preciso que haja uma efetiva prestação de serviços que decorre da relação jurídica formada entre o tomador do serviço e o prestador do serviço, sem o que não há que se cogitar de ocorrência do fato gerador do ISS.
Ora, no caso de honorários de sucumbência, pagos pela parte vencida na demanda judicial, não se vislumbra nenhum vínculo jurídico entre o advogado, beneficiário dessa verba sucumbencial, e a parte vencida na demanda judicial. Simplesmente, não existe a efetiva prestação de serviço pelo advogado à parte que sucumbiu na ação judicial, e que por essa razão tornou-se devedora da verba honorária de sucumbência.
Não serve de justificativa a tributação do advogado ou da associação de advogados sob o regime do Simples, aonde o ISS incide sobre a receita bruta, conforme prescrição do § 3º, do art. 18 da Lei Complementar nº 123/2006 na redação dada pela Lei Complementar nº 155/2016. E nessa receita bruta estão incluídas receitas de qualquer espécie, inclusive, a verba honorária de sucumbência, sendo ela tributada na forma do anexo IV na Lei Complementar nº 123/2006 com alterações introduzidas pela Lei Complementar nº 147/2014.
No regime normal de tributação cada tributo é tributado segundo prescrições das leis específicas, e no caso do ISS, a base de cálculo é o preço do serviço prestado (art. 7º da Lei Complementar nº 116/2003), e não a receita bruta.
Por tais razões, a Prefeitura de São Paulo entendeu que era devido o ISS na percepção de verba de sucumbência, em se tratando de contribuinte sob o regime de Simples (Solução de Consulta SF/DEJUG nº 20, de 9-11-2016, da Secretaria de Finanças da Prefeitura de São Paulo).
SP, 26-3-18.
[1] Doutrina e prática do imposto sobre serviços. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1975, p. 81.
[2] Conf. nosso ISS doutrina e prática, 2ª Edição. São Paulo. Atlas, 2014, p.59