Na prática é comum deparar-se com a exigência de ISS sobre os serviços de construção civil executados pelo proprietário do terreno e por conta própria. O fato de a incorporadora, dona do terreno onde é erigida a construção do prédio, ser uma pessoa jurídica não tem a menor relevância jurídica.
Essa exigência do fisco municipal revela insuficiência de conhecimento quanto à teoria do fato gerador do Imposto sobre Serviços. Com efeito, parte da doutrina argumenta que o imposto recai sobre o serviço previsto na lista de serviços.
Ora, não basta que o serviço esteja contemplado na lista de serviços tributáveis. O elemento material do fato gerador do ISS é a prestação efetiva do serviço e não o serviço em si que é mero objeto do imposto. Sem que exista uma obrigação de fazer não há que se falar em incidência do ISS. Se é a proprietária do imóvel quem executa a obra de construção civil em terreno de sua propriedade não existe o objeto a ser tributado, porque não existe a obrigação de fazer. Pela simples razão de que ninguém presta serviço a si próprio.
Irrelevante a atividade mercantil do proprietário-construtor que vende as unidades autônomas do prédio, inclusive na planta. É que os adquirentes de futuras unidades autônomas não celebram contrato de prestação de serviços com a incorporadora, mas sim contrato de compromisso de compra e venda da futura unidade autônoma. Nesse sentido a Ementa do acórdão do STJ:
“EMENTA: TRIBUTÁRIO. INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA. IMÓVEIS CONSTRUÍDOS SOBRE TERRENO PRÓPRIO E POR CONTA PRÓPRIA DO INCORPORADOR. ISS. INEXISTÊNCIA DE FATO GERADOR.
1. O incorporador imobiliário, tal como definido no art. 29 da Lei 4.591/65, não pode, logicamente, figurar como contribuinte do ISSQN relativamente aos serviços de construção da obra incorporada. Com efeito, se a construção é realizada por terceiro, o incorporador não presta serviço algum, já que figura como tomador. Contribuinte, nesse caso, é o construtor. E se a construção é realizada pelo próprio incorporador, não há prestação de serviços a terceiros, mas a si próprio, o que descaracteriza o fato gerador. É que os adquirentes das unidades imobiliárias incorporadas não celebram, com o incorporador, um contrato de prestação de serviços de construção, mas sim um contrato de compra e venda do imóvel, a ser entregue construído. Precedentes.2. Recurso improvido” (Resp n° 922956/RN, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJe de 01-07-2010, Julgamento em 22/06/2010). Independentemente do vulto da obra de construção civil, ou da atividade lucrativa do proprietário do terreno que promove a incorporação imobiliária, sem a efetiva prestação de serviço não há incidência do ISS. Sabemos que o grupo Votorantim, para garantir a autossuficiência de energia elétrica em suas fábricas vem construindo com recursos próprios diversas usinas geradoras de eletricidade por meio de técnicos e operários pertencentes ao seu quadro de empregados. Não há na hipótese prestação de serviços que possa ser objeto de tributação pelo ISS.
* Jurista, com 32 obras publicadas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.