A Instrução Normativa de nº 1.911, de 15 de outubro de 2019, da Receita Federal do Brasil regulamenta a apuração, a cobrança, a fiscalização, a arrecadação e a administração da contribuição para o PIS-PASEP/COFINS e da contribuição para o PIS-PASEP/COFINS- Importação.
Foi baixada com o fim de simplificar a legislação tributária concernente a esses tributos e facilitar a sua operacionalização.
Ocorre que ela contém 766 artigos, além de 30 anexos, sendo certo que ela revoga 52 instruções normativas.
Para se ter uma ideia de sua complexidade basta lembrar que o CTN, Lei nº 5.172, de 26/10/1966, que traça normas gerais de Direito Tributário, regula as limitações constitucionais do poder de tributar, dirime conflitos de competência tributária e disciplina onze dos treze impostos previstos na CF, contém apenas 218 artigos.
A complexidade da legislação tributária não está na quantidade de tributos como supõem os autores da Reforma Tributária em discussão no Congresso Nacional, que fundem tributos de espécies diferentes e pertencentes a entidades políticas igualmente diferentes, para formar o famigerado IBS, uma versão piorada do IVA europeu.
Basta um único tributo do tipo PIS-Cofins para espalhar o terror entre os contribuintes.
Para complicar esses dois tributos, o legislador estabeleceu o PIS-COFINS cumulativo com a alíquota de 3%, e o PIS-CONFIS não cumulativo com a alíquota de 7,6%. Só que não obedeceu a mesma sistemática de não cumulatividade do ICMS já assimilada pelos contribuintes. Inventou-se um complicado sistema de base sobre base em que o volúvel conceito de insumos, a serem abatidos da sua base de cálculo, tornou-se o foco principal da insegurança jurídica e da consequente demanda judicial que vem emperrando o Poder Judiciário.
Era de se esperar a IN da RFB de nº 1.911/19 deitasse luzes sobre os tortuosos caminhos da legislação tributária do PIS-COFINS. Mas não, ela complicou ainda mais e plantou a semente da multiplicação de demandas judiciais em potencial.
Em relação à base de cálculo dos tributos, a IN sob comento dedica, nada menos, que 32 artigos (arts. 26 a 61) com inúmeros parágrafos, incisos e alíneas que se perdem no cipoal de normas difusas e confusas. Peca tanto pelo excesso de dispositivos, como também, pela contrariedade à jurisprudência do STF e pela omissão.
Realmente, dispondo sobre a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS-COFINS, determina apenas a exclusão do ICMS devido no mês, e não daquele destacado na nota fiscal como entendeu o STF (RE nº 474.706-RG PR, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe de 17-3-2017). Na realidade, deveria ser excluído da base de cálculo do PIS/COFINS o ICMS embutido no preço da mercadoria, embora bastante trabalhoso por envolver necessidade de seu cálculo por dentro.
Outrossim, a IN sob exame é completamente omissa quanto à dedução do valor da própria contribuição social da sua base de cálculo, não respeitando aqueles contribuintes que têm a seu favor coisa julgada nesse sentido, ou ainda, uma medida liminar que assegure esse direito. E nada dispõe, também, acerca da exclusão do ICMS da base de cálculo da contribuição previdenciária sobre a receita bruta.
Finalmente, veda arbitrariamente o crédito do PIS/Cofins no ICMS-ST.
Sobre as alíquotas a IN sob análise dedica os artigos 62 até 101, onde são contempladas inúmeras hipóteses de redução de alíquotas a zero, elaboradas com requintes de inusitado sabor burocrático. Fico a imaginar, como é possível tantas alíquotas diferenciadas para tão poucos tributos. E o art. 258 volta à questão das alíquotas do PIS/COFINS descrevendo quase uma página inteira de códigos de atividades (TIP) que só se consegue identificá-los com auxílio de uma lupa.
Inúmeros artigos versam sobre a base de cálculo das contribuições sociais do PIS/COFINS (artigos 171 a 230).
Elenca diferentes deduções para “n” hipóteses especificadas. A dedução dos insumos utilizados é a principal dedução. O insumo é definido como “bens e serviços considerados essenciais ou relevantes, que integram o processo de produção ou fabricação de bens destinados à venda ou de prestação de serviços”. Adotou-se, portanto, o conceito utilizado pela legislação do IPI e aceito pela jurisprudência do STJ que afastou o conceito dado pelas Instruções Normativas números 247/02 e 404/04 da SRF por implicar intensa restrição conceitual (REsp nº 1.221.170/PR, Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em caráter repetitivo, DJe 24-4-2018).
Após definir o que são insumos a IN em questão enumera esses insumos nos incisos I a X, do § 1º do art. 172, dando caráter de taxativo. O que é pior, o seu § 2º exclui do conceito de insumos, “entre outros”, os bens e materiais enumerados nos itens I a VIII, conferindo caráter de exemplificatividade. A tripla confusão é patente: primeiro define o que são insumos; depois enumera os insumos contidos na definição, e finalmente excluem do conceito de insumos os materiais, dentre outros, especificados. Deixou-se uma margem de manobra para ir incluindo outras hipóteses de exclusão do conceito de insumos. E assim, essa IN irá sendo alterada no curso do tempo.
Concluindo, além de tornar mais complexa e mais confusa a legislação do PIS/COFINS, a Instrução Normativa sob comento tem um elevado grau de potencialmente provocar inúmeras demandas judiciais.
A epidemia de normas de que falava o mestre Ruy Barbosa Nogueira na década de 80 está mais do presente nos dias atuais.
Kiyoshi Harada, sócio fundador da Harada Advogados Associados e Presidente do Instituto Brasileiro de Estudos de Direito Administrativo, Financeiro e Tributário – IBEDAFT.