O aspecto espacial do fato gerador do ISS define o município competente para tributar*

O município competente para tributar o ISS é dado pela definição do local da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária.

O art. 3º da Lei Complementar, lei de regência nacional do ISS, define o local da prestação dos serviços nos seguintes termos:

Art. 3º.  O serviço considera-se prestado, e o imposto, devido, no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, exceto nas hipóteses previstas nos incisos I a XXV, quando o imposto será devido no local: (Redação dada pela Lei Complementar nº 157, de 2016) (Vide ADIN 3142)

I – do estabelecimento do tomador ou intermediário do serviço ou, na falta de estabelecimento, onde ele estiver domiciliado, na hipótese do § 1º do art. 1º desta Lei Complementar;

II – da instalação dos andaimes, palcos, coberturas e outras estruturas, no caso dos serviços descritos no subitem 3.05 da lista anexa;

III – da execução da obra, no caso dos serviços descritos no subitem 7.02 e 7.19 da lista anexa;

IV – da demolição, no caso dos serviços descritos no subitem 7.04 da lista anexa;

V – das edificações em geral, estradas, pontes, portos e congêneres, no caso dos serviços descritos no subitem 7.05 da lista anexa;

VI – da execução da varrição, coleta, remoção, incineração, tratamento, reciclagem, separação e destinação final de lixo, rejeitos e outros resíduos quaisquer, no caso dos serviços descritos no subitem 7.09 da lista anexa;

VII – da execução da limpeza, manutenção e conservação de vias e logradouros públicos, imóveis, chaminés, piscinas, parques, jardins e congêneres, no caso dos serviços descritos no subitem 7.10 da lista anexa;

VIII – da execução da decoração e jardinagem, do corte e poda de árvores, no caso dos serviços descritos no subitem 7.11 da lista anexa;

IX – do controle e tratamento do efluente de qualquer natureza e de agentes físicos, químicos e biológicos, no caso dos serviços descritos no subitem 7.12 da lista anexa;

X – (VETADO)

XI – (VETADO)

XII – do florestamento, reflorestamento, semeadura, adubação, reparação de solo, plantio, silagem, colheita, corte, descascamento de árvores, silvicultura, exploração florestal e serviços congêneres indissociáveis da formação, manutenção e colheita de florestas para quaisquer fins e por quaisquer meios; (Redação dada pela Lei Complementar nº 157, de 2016)

XIII – da execução dos serviços de escoramento, contenção de encostas e congêneres, no caso dos serviços descritos no subitem 7.17 da lista anexa;

XIV – da limpeza e dragagem, no caso dos serviços descritos no subitem 7.18 da lista anexa;

XV – onde o bem estiver guardado ou estacionado, no caso dos serviços descritos no subitem 11.01 da lista anexa;

XVI – dos bens, dos semoventes ou do domicílio das pessoas vigiados, segurados ou monitorados, no caso dos serviços descritos no subitem 11.02 da lista anexa; (Redação dada pela Lei Complementar nº 157, de 2016)

XVII – do armazenamento, depósito, carga, descarga, arrumação e guarda do bem, no caso dos serviços descritos no subitem 11.04 da lista anexa;

XVIII – da execução dos serviços de diversão, lazer, entretenimento e congêneres, no caso dos serviços descritos nos subitens do item 12, exceto o 12.13, da lista anexa;

XIX – do Município onde está sendo executado o transporte, no caso dos serviços descritos pelo item 16 da lista anexa; (Redação dada pela Lei Complementar nº 157, de 2016)

XX – do estabelecimento do tomador da mão-de-obra ou, na falta de estabelecimento, onde ele estiver domiciliado, no caso dos serviços descritos pelo subitem 17.05 da lista anexa;

XXI – da feira, exposição, congresso ou congênere a que se referir o planejamento, organização e administração, no caso dos serviços descritos pelo subitem 17.10 da lista anexa;

XXII – do porto, aeroporto, ferroporto, terminal rodoviário, ferroviário ou metroviário, no caso dos serviços descritos pelo item 20 da lista anexa.

XXIII – do domicílio do tomador dos serviços dos subitens 4.22, 4.23 e 5.09; (Incluído pela Lei Complementar nº 157, de 2016)

XXIV – do domicílio do tomador do serviço no caso dos serviços prestados pelas administradoras de cartão de crédito ou débito e demais descritos no subitem 15.01; (Incluído pela Lei Complementar nº 157, de 2016)

XXV – do domicílio do tomador do serviço do subitem 15.09. (Redação dada pela Lei Complementar nº 175, de 2020)

§ 1º No caso dos serviços a que se refere o subitem 3.04 da lista anexa, considera-se ocorrido o fato gerador e devido o imposto em cada município em cujo território haja extensão de ferrovia, rodovia, postes, cabos, dutos e condutos de qualquer natureza, objetos de locação, sublocação, arrendamento, direito de passagem ou permissão de uso, compartilhado ou não. (Vide ADIN 3142)

§ 2º No caso dos serviços a que se refere o subitem 22.01 da lista anexa, considera-se ocorrido o fato gerador e devido o imposto em cada Município em cujo território haja extensão de rodovia explorada.

§ 3º Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no local do estabelecimento prestador nos serviços executados em águas marítimas, excetuados os serviços descritos no subitem 20.01.

§ 4º  Na hipótese de descumprimento do disposto no caput ou no § 1o, ambos do art. 8º-A desta Lei Complementar, o imposto será devido no local do estabelecimento do tomador ou intermediário do serviço ou, na falta de estabelecimento, onde ele estiver domiciliado. (Incluído pela Lei Complementar nº 157, de 2016)

§ 5º Ressalvadas as exceções e especificações estabelecidas nos §§ 6º a 12 deste artigo, considera-se tomador dos serviços referidos nos incisos XXIII, XXIV e XXV do caput deste artigo o contratante do serviço e, no caso de negócio jurídico que envolva estipulação em favor de unidade da pessoa jurídica contratante, a unidade em favor da qual o serviço foi estipulado, sendo irrelevantes para caracterizá-la as denominações de sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de representação ou contato ou quaisquer outras que venham a ser utilizadas. (Incluído pela Lei Complementar nº 175, de 2020)

§ 6º No caso dos serviços de planos de saúde ou de medicina e congêneres, referidos nos subitens 4.22 e 4.23 da lista de serviços anexa a esta Lei Complementar, o tomador do serviço é a pessoa física beneficiária vinculada à operadora por meio de convênio ou contrato de plano de saúde individual, familiar, coletivo empresarial ou coletivo por adesão. (Incluído pela Lei Complementar nº 175, de 2020)

§ 7º Nos casos em que houver dependentes vinculados ao titular do plano, será considerado apenas o domicílio do titular para fins do disposto no § 6º deste artigo. (Incluído pela Lei Complementar nº 175, de 2020)

§ 8º No caso dos serviços de administração de cartão de crédito ou débito e congêneres, referidos no subitem 15.01 da lista de serviços anexa a esta Lei Complementar, prestados diretamente aos portadores de cartões de crédito ou débito e congêneres, o tomador é o primeiro titular do cartão. (Incluído pela Lei Complementar nº 175, de 2020)

§ 9º O local do estabelecimento credenciado é considerado o domicílio do tomador dos demais serviços referidos no subitem 15.01 da lista de serviços anexa a esta Lei Complementar relativos às transferências realizadas por meio de cartão de crédito ou débito, ou a eles conexos, que sejam prestados ao tomador, direta ou indiretamente, por: (Incluído pela Lei Complementar nº 175, de 2020)

I – bandeiras; (Incluído pela Lei Complementar nº 175, de 2020)

II – credenciadoras; ou (Incluído pela Lei Complementar nº 175, de 2020)

III – emissoras de cartões de crédito e débito. (Incluído pela Lei Complementar nº 175, de 2020)

§ 10. No caso dos serviços de administração de carteira de valores mobiliários e dos serviços de administração e gestão de fundos e clubes de investimento, referidos no subitem 15.01 da lista de serviços anexa a esta Lei Complementar, o tomador é o cotista. (Incluído pela Lei Complementar nº 175, de 2020)

§ 11. No caso dos serviços de administração de consórcios, o tomador de serviço é o consorciado. (Incluído pela Lei Complementar nº 175, de 2020)

§ 12. No caso dos serviços de arrendamento mercantil, o tomador do serviço é o arrendatário, pessoa física ou a unidade beneficiária da pessoa jurídica, domiciliado no País, e, no caso de arrendatário não domiciliado no País, o tomador é o beneficiário do serviço no País.” (Incluído pela Lei Complementar nº 175, de 2020)

Em razão do princípio da territorialidade das normas jurídicas, o local da ocorrência do fato gerador identifica o município tributante.

Ocorre que a Federação Brasileira é composta de 5.570 municípios e os prestadores de serviços (pessoas jurídicas e físicas), apesar de se localizarem no território de um determinado município, salvo em casos raros de sucursais ou filiais em diversas localidades, prestam serviços para tomadores situados nas mais diferentes comunas, inclusive, para clientes localizados no exterior do país.

Logo, se fosse observar o princípio geral de territorialidade das normas tributárias municipais, os contribuintes do ISS, em sua grande maioria, teriam que pagar o imposto em todos os municípios onde fosse prestado o serviço inviabilizando, por exemplo, o critério da tributação por alíquota fixa dos advogados ou de sociedades por eles formadas, que atuassem nas diferentes comarcas.

Por isso, esse preceito, em perfeita harmonia com o art. 102 1 do CTN, estabelece uma exceção ao princípio da territorialidade, estabelecendo como regra geralem matéria de ISS, o local do estabelecimento prestador como sendo o local da prestação do serviço, ou seja, o local da ocorrência do fato gerador ou local onde o imposto é devido.

Como já foi salientado, o STJ, na vigência do diploma legal anterior, que continha idêntico dispositivo, firmou entendimento de que o local da prestação define o município tributante, não só, em razão do princípio da territorialidade, como também, para evitar a fraude consistente na manutenção apenas formal do estabelecimento no território do município circunvizinho com menor carga tributária.

De fato, na Região Metropolitana de São Paulo inúmeros estabelecimentos de prestadores de serviços, notadamente, empresas de leasing, fugiram do município da Capital para os municípios circunvizinhos, sendo que algumas delas mantêm estabelecimentos praticamente virtuais fora de São Paulo, onde a alíquota é mais elevada, ou seja, de 5%. Mas, isso é problema da fiscalização e não da justiça, que deve aplicar a lei vigente. Não é possível, a pretexto de interpretar a lei, inverter os seus expressos termos.

De qualquer forma, a atual lei de regência nacional do ISS, ao contrário da anterior, que só excepcionava a hipótese de construção civil, estatuiu vinte e cinco hipóteses excepcionais de tributação no local da prestação do serviço. Com o veto aos incisos X e XI restaram vinte e três hipóteses em que o sujeito ativo do imposto será o município em cujo território for prestado o serviço. O legislador nacional encampou, parcialmente, a jurisprudência do STJ.

Com exceção do inciso XVI, concernente aos serviços de vigilância, segurança e monitoramento de bens e pessoas, que podem ser executados à distância, todos os demais casos excetuados implicam a presença física do prestador do serviço no local de sua execução.

O § 1º, referente aos serviços que se estendem ao longo de diversos municípios (item 3.04), fixa a competência tributária de cada município pelo princípio geral da territorialidade. O fato gerador considera-se ocorrido em cada município, em cujo território haja extensão de ferrovia, rodovia, pontes, cabos, dutos e condutos de qualquer natureza, objetos de locação, sublocação, arrendamento, direito de passagem ou permissão de uso, compartilhado ou não. A mesma coisa acontece com os serviços de rodovia pedagiada, conforme se verifica de seu § 2º.

E aqui é oportuno esclarecer que continuam em vigor os §§ 4º 2, 5º 3 e 6º 4 do art. 9º do Decreto-lei nº 406/68, acrescidos pela Lei Complementar nº 100/1999, que incluiu no rol de serviços tributáveis a exploração de rodovia pedagiada. Sem esses parágrafos, não reproduzidos na nova lei nacional do ISS, a tributação dos serviços de exploração de rodovia teria desaparecido do mundo jurídico, pois o fato gerador do imposto exige a presença da definição legal da respectiva base de cálculo, sem o que, não se pode considerar instituído o imposto.

A pretexto de colocar termo às discussões quanto ao local de pagamento do ISS, o art. 1º da Lei Complementar nº 157, de 29-12-2016, e, ao depois, a Lei Complementar nº 175/2020, alterou a redação do art. 3º da Lei Complementar nº 116/03 introduzindo os parágrafos 4º a 12.

Instituiu-se, dessa forma, a quarta modalidade de local do pagamento do imposto, ou seja, no local do domicílio do tomador dos serviços mencionados nos seguintes incisos: a) no inciso XXIII que engloba os serviços previstos nos subitens 4.22 (planos de medicina de grupo ou individual); 4.23 (outros planos de saúde); e 5.09 (planos de assistência médico-veterinária); b) no inciso XXIV pertinente aos serviços especificados no subitem 15.01 (serviços prestados pelas administradoras de cartão de crédito/débito e demais aí descritos); c) no inciso XXV que se refere aos serviços previstos nos subitens 15.09 ( (leasing).

Em que pese a boa intenção do legislador, a inovação legislativa, além de onerar os custos operacionais, trouxe uma dificuldade muito grande na conceituação do local do domicílio do tomador, um conceito vago e impreciso e de fácil manipulação, a exemplo do que vem acontecendo com relação ao IPVA em que os proprietários de veículos estão apresentando domicílios fictícios para licenciar os veículos no Estado da Federação onde a alíquota for menor.

Ora, para eliminar a discussão em torno do assunto bastava tão só explicitar o que está implícito no caput do art. 3º, da Lei Complementar nº 116/03 para consignar que se entende por “estabelecimento prestador” aquele procurado pelo tomador de serviços. Não importa que outros estabelecimentos da mesma empresa tenham participado no processo de aperfeiçoamento da prestação efetiva do serviço, sempre representado pelo estabelecimento contatado pelo tomador de serviços.

Em razão disso, o Ministro Relator da ADI nº 5835 MC/DF, tendo como principal fundamento a dificuldade de aplicação da nova regra, suspendeu a eficácia do artigo 1º da Lei Complementar nº 157/2016, na parte que modificou o art. 3º, XXIII, XXIV e XXV, e os parágrafos 3º e 4º do art. 6º da Lei Complementar nº 116/2003, bem como, por arrastamento, suspendeu a eficácia de toda legislação local editada para sua direta complementação (ADI nº 5835 MC/DF, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJede 4-4-2018).

Porém, sobreveio a reação legislativa. O Congresso Nacional aprovou a Lei Complementar nº 175/20 insistindo no pagamento do ISS no local do domicílio do tomador em relação àqueles mesmos subitens de serviços previstos na Lei Complementar nº 157/16, instituindo, contudo, um regime de transição na forma adiante estabelecida:

2021 – 33,5% da arrecadação para o município do estabelecimento prestador e 66,5% para o município do tomador;

2022 – 15% da arrecadação para o município prestador do serviço e 85% para o município do tomador;

2023 em diante, 100% ao município do tomador.

Para viabilizar esse procedimento altamente dispendioso, a Lei Complementar nº 175/2020 reproduziu a norma da Lei Complementar nº 157/16, instituindo o mecanismo consistente no Padrão Nacional de Obrigações Assessórias do ISS a cargo dos contribuintes.

Assim, o que antes era simples tornou-se bastante complexo dificultando a operacionalização do ISS, na contramão do discurso de simplificação tributária que tem sido usada como bandeira para empreender reformas tributárias radicais que mais complicam do que resolvem.

Essa Lei Complementar nº 175/2020, que onera sobremaneira os custos da prestação de serviços, introduzindo fatores de insegurança jurídica, padece dos mesmíssimos vícios da LC nº 157/2016.

Efetivamente, examinando o mérito da ADI nº 5835, o STF por maioria de votos proferiu a seguinte decisão:


Decisão: O Tribunal, por maioria, extinguiu parcialmente o processo pela perda superveniente de objeto em relação ao art. 3º, inciso XXV, da Lei Complementar 116/2003, na redação conferida pela Lei Complementar 157/2016, e em relação ao art. 6º, § 3º, da Lei Complementar 116/2003, na redação conferida pela Lei Complementar 157/2016, confirmou os efeitos da medida cautelar deferida na Ação Direta 5.835, e, por fim, julgou procedente o pedido para declarar a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei Complementar 157/2016 e do art. 14 da Lei Complementar 175/2020, bem como, por arrastamento, dos artigos 2°, 3°, 6°, 9°, 10 e 13 da Lei Complementar 175/2020, nos termos do voto do Relator, vencidos parcialmente os Ministros Nunes Marques e Gilmar Mendes. (ADI nº 5835/MC/DF, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 27-7-2023).

Esperamos que a “guerra” entre o Judiciário e o Legislativo cesse por aqui, em respeito à segurança e tranquilidade que merecem os contribuintes.

SP, 22-4-2024.

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* Texto publicado no Migalhas, edição nº 5.835 de 23-4-2024.

1 Permite que norma de lei complementar confira eficácia extraterritorial às normas tributárias estaduais e municipais.

2 § 4º Na prestação do serviço a que se refere o item 101 da Lista Anexa, o imposto é calculado sobre a parcela do preço correspondente à proporção direta da parcela da extensão da rodovia explorada, no território do município, ou da metade da extensão de ponte que una os dois municípios.

3 § 5º A base de cálculo apurado nos termos do parágrafo anterior:

I – é reduzida, nos municípios onde não haja posto de cobrança de pedágio, para sessenta por cento do seu valor;

II – é acrescida, nos municípios onde haja posto de cobrança de pedágio, do complemento necessário à sua integralidade em relação à rodovia explorada.

4 § 6º Para efeito do disposto nos §§ 4º e 5º, considera-se rodovia explorada o trecho limitado pelos pontos equidistantes entre cada posto de cobrança de pedágio ou entre o mais próximo deles e o ponto inicial ou terminal da rodovia.

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