PARECER
por
KIYOSHI HARADA e MARCELO KIYOSHI HARADA
Interessado: SINDICATO DOS AGENTES FISCAIS DE RENDAS DO ESTADO DE SÃO PAULO – SINAFRESP
Assunto: Publicação de críticas à política tributária do Estado por Agente Fiscal de Rendas e infrações estatutárias imputadas pelo Poder Público
CONSULTA
O Consulente, por meio de seu Diretor Jurídico Mestre JOSÉ MÁRCIO RIELLI e pelo seu advogado THIAGO DURANTE DA COSTA solicita parecer jurídico sobre a questão concernente a situação envolvendo o agente fiscal de rendas filiado ao sindicato, … denunciado na Corregedoria da Fiscalização Tributária – CORFISP, por ter publicado no Jornal Folha de São Paulo, em 24/11/2016, artigo intitulado “A crise paulista bate à porta”, aonde expressa a sua opinião sobre a queda da arrecadação tributária adotada criticando a falta de transparência do Governo de Geraldo Alckmin a respeito da concessão de benefícios fiscais e os danos causados pela expansão dos regimes de substituição tributária e, ao final, assina o artigo como auditor da Receita Estadual de São Paulo e coordenador da Administração Tributária, eleito pela primeira lista tríplice do Fisco Paulista.
O Consulente esclarece que promoveu eleição para apresentar à Secretaria da Fazenda uma lista tríplice com nomes para ocupar o cargo de Coordenador da Administração Tributária, responsável pela Coordenadoria da Administração Tributária, que, por sua vez, é responsável pela arrecadação dos tributos estaduais e fiscalização do cumprimento de obrigações tributárias. Esclarece, ainda, que essa iniciativa faz parte de uma série de reivindicações da classe dos Agentes Fiscais de Rendas do Estado de São Paulo que buscam melhorias de trabalho na arrecadação tributária e transparência na Secretaria da Fazenda.
Informa que o Sr. Corregedor-Geral da Corregedoria da Fiscalização Tributária determinou a instauração de apuração preliminar contra o Sr. …, por entender que o mesmo “incorreu em conduta funcional disciplinarmente reprovável, à vista de constar dos autos do Processo em referência notícia informando que houve publicação de matéria no jornal Folha de São Paulo na coluna Tendências/Debates de 24/11/2016, intitulada “A crise paulista bate à porta””, cuja autoria foi atribuída ao averiguado indicando ser “Auditor da Receita Estadual de São Paulo e Coordenador da Administração Tributária…”, entretanto, nesta data a função de Coordenador da Administração Tributária, juntamente com a reputação e reconhecimento social inerentes a função estavam designados a …. Deste modo, o autor, ao se autointitular Coordenador da Administração Tributária, poderia, em tese, ter o objetivo de ver publicado o seu artigo em jornal de grande circulação.”
O Consulente apresenta-nos o artigo intitulado “A crise paulista bate à porta”, publicado no jornal Folha de São Paulo no dia 24/11/2016, de autoria do Auditor Fiscal de Rendas …, bem como, as conclusões da apuração preliminar de violação estatutária instaurada contra o autor da publicação que vão adiante transcritos.
“A crise paulista bate à porta
A gravidade da crise fiscal no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul tem impedido que a devida atenção seja dispensada ao Estado de São Paulo, que enfrenta preocupante queda da arrecadação tributária. Entre janeiro e agosto deste ano a redução foi de 7,9%, um recorde. Já o PIB paulista caiu menos, 4,6%.
Em períodos de drásticas crises como a que vivemos, é natural que a arrecadação acompanhe o declínio do PIB. Entretanto, esse “descolamento” excessivo que se verifica em São Paulo é extremamente perigoso e faz crer que a crise econômica pode não ser a única justificativa. Como explicar, então, os 3,3% pontos percentuais adicionais no rombo orçamentário?
Políticas tributárias equivocadas do governo entre 2008 e 2016 ajudam a configurar esse cenário, sobretudo por dois motivos: a concessão de benefícios fiscais sem acompanhamento técnico e a implantação desmedida da substituição tributária do imposto (ST).
No que tange aos benefícios fiscais, a falta de transparência do governo Geraldo Alckmin a respeito do assunto impede o aprofundamento da análise, visto que os regimes especiais são tratados como atos secretos, sendo publicado apenas breve extrato de seu teor no Diário Oficial do Estado.
As estimativas de renúncias tributárias informadas nas Leis de Diretrizes Orçamentárias (LDO) são extremamente sucintas, impedido qualquer tipo de exame. Nem mesmo a autoridade tributária tem acesso a tais informações.
Entre 2011 e 2016, contabilizando apenas dois únicos benefícios concedidos por decretos, sem autorização do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), chega-se a R$ 3,5 bilhões a menos no Orçamento.
Esse é apenas um dos exemplos notórios e públicos.
Já os danos causados pela expansão dos regimes de substituição tributária do imposto são mais previsíveis. Em 2008, o governo paulista resolveu ampliar esse regime de tributação para situações em que os ganhos não eram evidentes.
As substituições tributárias concentram na indústria ou nos atacadistas tributos que seriam de responsabilidade de toda a cadeia de produção e distribuição.
O recolhimento antecipado do ICMS sobre os estoques e o “boom” do consumo a partir de 2008 deram ao governo a impressão de que arrecadaria mais devido à implantação do regime da ST.
Esgotado esse efeito inicial, o governo passou a recorrer a pequenos ajustes para cima nas margens de valor agregado, utilizado para estimar os preços finais dos produtos sujeitos ao regime.
O fato é que a substituição tributária, por concentrar a arrecadação em um único membro da cadeia de produção e distribuição, aumenta o prêmio do sonegador. Esse efeito está se tornando gradualmente mais nítido. Por exemplo, um produto com ICMS de R$ 2 na fábrica, se estiver sujeito à ST com um ICMS final de R$ 6, triplicaria o valor da possível evasão fiscal.
Ao invés de reconhecer seus erros, o governo estadual passou a lançar mão de programa de anistia de multas fiscais aos sonegadores de impostos, sem alcançar os resultados esperados.
Atualmente, segundo um estudo do Banco Mundial, raríssimos são os países que utilizam a substituição tributária, entre os quais a Argentina.
A recessão só fez evidenciar a falência da gestão tributária paulista. A arrecadação segue caindo mais do que o PIB e essa sangria só terá fim com a supressão dos benefícios fiscais e com a redução de regimes de substituição tributária.
Até lá, o governo seguirá demonstrando que pode ser atribuído um custo ao compadrio e ao amadorismo.
…. é auditor da Receita Estadual de São Paulo e coordenador da Administração Tributária, eleito pela primeira lista tríplice do Fisco Paulista.”
Conclusões da apuração preliminar instaurada pela
Portaria CORFISP/AP nº 32/2007, inserta nos autos
do processo nº 24329-1171236, do ano de 2016, da
Corregedoria da Fiscalização Tributária – CORFISP
A douta CORFISP concluiu que o Agente Fiscal de Rendas … violou o disposto nos incisos XIII e XIV do artigo 241 da Lei nº 10.261/08, Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado de São Paulo, bem como do disposto no inciso V, do art. 15, da Resolução SF nº 51/07 a seguir transcritos, além de verificar outras transgressões disciplinares que possam ser constatadas durante a execução dos trabalhos de apuração:
Lei nº 10.261/08:
“Artigo 241 – São deveres do funcionário:
……………………….
XIII – estar em dia com as leis, regulamentos, regimentos, instruções e ordens de serviço que digam respeito às suas funções; e
IV – proceder na vida pública e privada na forma que dignifique a função pública.”
Resolução SF nº 51/07:
“Art. 15. É vedado ao Agente Fiscal de Rendas:
…………………
V – promover ou sugerir publicidade que resulte em dano à imagem de órgão público.”
A CORFISP – Corregedoria da Fiscalização Tributária – concluiu que a autoria da matéria publicada no jornal Folha de São Paulo, na coluna Tendências/Debates em 24/11/2026 intitulada “A crise Paulista bate a porta” é do Agente Fiscal de Rendas …, tendo em vista que o apurado confirmou a autoria da matéria, indicando que houve alteração externa somente no local da vírgula “entre CAT e eleito”, na indicação de seu nome como autor. Mas, reconheceu que o texto publicado foi aprovado por uma equipe editorial do SINAFRESP.
A E. Corregedoria afirmou, também, que restou comprovada a materialidade, ou seja, a existência de conduta funcional disciplinarmente reprovável, apurando-se que houve claro e manifesto dano à imagem de órgão público, baseando-se no fato de que a empresa Folha de São Paulo promoveu imediato direito de resposta à Secretaria da Fazenda em 25/11/2016, um dia após a publicação do artigo do agente fiscal de rendas …, em consonância com os preceitos da Lei nº 13.188, de 11-11-2015, que no seu art. 2º garante ao ofendido em matéria divulgada, publicada ou transmitida por veículo de comunicação social o direito de resposta ou retificação, gratuito e proporcional ao agravo.
Entendeu que a Folha de São Paulo, ao assegurar o direito de resposta à Secretaria da Fazenda, atestou o dano à imagem, pois segundo a Lei nº 13.188/2015 é necessário que o conteúdo da matéria divulgada atente contra a honra, a intimidade, a reputação, o conceito, o nome, a marca ou a imagem de pessoa física ou jurídica identificada ou passível de identificação.
Além disso, os autores do desagravo publicado no jornal Folha de São Paulo, no dia 25/11/2016, …, Secretário da Fazenda do Estado de São Paulo e …, Coordenador da Administração Tributária da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo também consideraram prejudicial a publicação promovida.
Concluiu, também, pela dupla usurpação da função pública pelo agente fiscal de rendas …; primeiro porque ele exerceu atividades privativas da área de Comunicação da Assessoria do Gabinete do Secretário, órgão setorial do Sistema de Comunicação do Governo do Estado de São Paulo – SICOM na Secretaria da Fazenda, que tem as funções previstas no art. 25, VI[1] do Decreto nº 60.812, de 30-09-2014, sem a devida autorização, ao publicar matéria “na condição de auditor da Receita Estadual de São Paulo e coordenador da Administração Tributária, eleito pela primeira lista tríplice do Fisco Paulista, conforme publicado, ou na condição de auditor da Receita Estadual de São Paulo e coordenador da Administração Tributária eleito pela primeira lista tríplice do Fisco Paulista”, pois a exceção a regra do art. 25, VI do Decreto nº 60.812, de 30-09-2014 somente se materializa com a expressa autorização do Secretário de Estado (art. 143, II, ‘j’ do Decreto nº 60.812/2014 [2]).
Em segundo lugar, porque o apurado se autointitulou Coordenador da Administração Tributária, cuja titularidade não lhe pertencia de fato ou de direito.
Em suas conclusões a Corregedoria ainda reproduziu trecho da manifestação do Sr. …, signatário da informação nº 0008/CAT, que assina pelo Sr. …, então Coordenador da Administração tributária que entendeu que houvera transgressão disciplinar do Sr. … começar pela qualificação apresentada, pois na SEFAZ-SP inexiste o cargo ou a função de auditor da receita estadual, como se intitulou o Sr. …, haja vista que as autoridades fiscais ocupam o cargo de agente fiscal de rendas, engano esse que persistiu quando o Sr. … se apresentou como Coordenador da Administração Tributária, se mostrando “cristalina a macula da fé pública pela conduta do servidor, ao atribuir a si mesmo falsa qualificação, para lograr vantagem sobre a reputação e o reconhecimento social inerente ao cargo de Coordenador da Administração Tributária do Estado de São Paulo, com o objetivo de ver publicado em jornal de grande circulação o seu artigo”.
Após apontar a dupla usurpação de competência a CORFISP entendeu caracterizadas violações no âmbito dos Direitos Administrativo e Penal, pois, segundo ela, há indícios de materialidade de violação aos preceitos do art. 328 do CP[3], conduta essa que poderá merecer da autoridade competente interpretação diversa ao apreciá-la à luz dos preceitos do art. 299 do CP[4] que versa sobre a falsidade ideológica.
Segundo a Corregedoria há concomitância de crimes, contra a fé pública e a Administração (art. 299 e 328 do CP). A publicação do dia 24/11/2016 seria a consumação do ato de ofício que somente poderia ser praticado pela Assessoria do Gabinete do Secretário da Fazenda.
Diante disso, o Sr. …. pode ter praticado, em tese, crime na esfera administrativa ao teor do art. 302 do Estatuto dos Funcionários Públicos Civis[5], cabendo aos superiores hierárquicos decidirem pela conveniência e oportunidade de elaborarem notícia destes fatos às autoridades judiciais.
Em suas conclusões, os Srs. Corregedores ainda entenderam que se realmente verificadas as situações descritas pelo Sr. … em seu artigo ele deveria ter representado aos seus superiores, conforme determina o art. 241, II do Estatuto dos Funcionários Públicos Civis[6]., que nada tem a ver com a questão.
Por fim, os Srs. Corregedores apontaram em suas conclusões a violação do art. 241, XIII[7] do Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado de São Paulo, bem como do dever de prestar exatas e verídicas declarações a respeito de seu endereço residencial (Decreto nº 52.691/2008, de 1º/02/2008 e Resolução SGP nº4, de 10/03/2008), pois apesar de o Sr. … residir na Rua do Colégio Nossa Senhora do Bom Conselho, 12, apto. 51, Jardim das Nações, Taubaté desde abril 2011, como declarou na sua oitiva, vinha informando desde 15/02/2005 residir na Av. Sebastião Rosa, nº 1911, bairro Capitão Mor, Araperi, São Paulo e assim confirmando todos os anos em seu recadastramento anual. A justificativa para tanto era a de que ele não tinha o ânimo definitivo de se fixar nesse endereço. Nesse diapasão, a autorização para o Sr. … residir fora da sede da localidade de trabalho também considerava que ele residia em Araperi. Diante disso, a Corregedoria entendeu que ocorreu o crime de falsidade documental, porque “quando a informação inserida nos bancos de dados da Administração, geram diligência e termo de constatação, conforme documento de fls. 157 verifica-se a efetividade de o dano.”
Diante dos fatos narrados, solicita nosso parecer sobre o assunto, formulando os seguintes quesitos:
- O autor do artigo está exercendo o seu direito de expressão garantido pela Constituição Federal?
- Na condição de servidor público da Secretaria da Fazenda do Estado, pode o autor do artigo manifestar críticas contra aquele órgão que digam respeito à forma de trabalho, planejamento, arrecadação tributária e outros assuntos?
- O artigo escrito pelo Agente Fiscal de Rendas… diz respeito a interesse público?
- A produção e publicação de artigos por parte de agente fiscal de rendas, servidor público estadual, depende de prévia autorização de superior hierárquico, ou do Secretário da Fazenda? Existe proibição contida no Estatuto dos Servidores Públicos Civis do Estado de São Paulo (Lei 10.261/68)?
- Ao se identificar como “Coordenador da Administração Tributária eleito pela lista tríplice” o autor cometeu alguma ilegalidade? Houve algum prejuízo para a administração pública ou ao interesse público? Houve crime de falsidade ideológica?
- O autor cometeu alguma ilegalidade ao deixar de comunicar suposta irregularidade?
- Na apuração preliminar houve levantamento de suposto cometimento de crime de falsidade ideológica, pelo fato de autor não ter atualizado seu domicílio perante a Secretaria da Fazenda. Esta situação configura o mencionado ilícito penal?
- A publicação do artigo na Folha de São Paulo atingiu a imagem e a honra da entidade política e de seus órgãos?
PARECER
Tudo começou com a publicação do artigo na Folha de São Paulo onde o Agente Fiscal manifestou sua opinião acerca da política tributária do Estado, ao seu ver, equivocada, quer pela concessão excessiva de benefícios fiscais que implica perda preciosa de arrecadação, quer pela expansão das hipóteses de substituição tributária que ensejaria sonegação fiscal. Esse texto, na verdade, resultou de um estudo feito pelo SINAFRESP por sugestão do averiguado, como reconhecido pela douta CORFISP.
Ambas as críticas são construtivas e espelham a realidade. É verdade que o Estado de São Paulo não se equipara ao falido Estado do Rio, onde os incentivos fiscais, muitos deles concedidos sem a interveniência do Confaz [8], atingiram a perda de arrecadação de 166,7 bilhões no período mencionado no artigo incriminado, ou seja entre 2008 e 2016. No âmbito federal os incentivos fiscais que em 2007 representavam 1,7% do PIB saltaram para 4% do PIB em 2017. Não é por acaso que as contas públicas da União estão com um rombo de 170 bilhões implicando necessidade de suprimir benefícios trabalhistas e previdenciários por via de reformas pretendidas pelo governo federal.
O que o Agente Fiscal … escreveu não é novidade. São fatos do conhecimento público porque divulgados pela mídia (jornais, revistas, entrevistas de rádio/televisão, simpósios, congressos jurídicos e até em teses de mestrado/doutorado).
A substituição tributária também é matéria do conhecimento público. Os governantes em geral, não tendo mais como encurtar os prazos de recolhimento de impostos, partiram para a arrecadação antecipada mediante artifício legislativo de instituir a figura do fato gerador presumido que está inserto no § 7º, do art. 150 da CF, fruto de lob dos governantes estaduais. Como muito bem demonstrado no artigo incriminado “o fato é que a substituição tributária, por concentrar a arrecadação em um único membro da cadeia de produção e distribuição, aumenta o prêmio do sonegador. Esse efeito está se tornando gradualmente mais nítido. Por exemplo, um produto com ICMS de R$ 2,00 na fábrica, se estiver sujeito à ST com um ICMS final de R$ 6,00 triplicaria o valor da possível evasão fiscal”.
Onde a infração disciplinar, onde o crime por divulgar fatos públicos e notórios de pleno conhecimento dos contribuintes e da sociedade em geral?
Outrossim, não procede a acusação de que o articulista do Jornal “ao se autointitular Coordenador da Administração Tributária, poderia, em tese, ter o objetivo de ver publicado o seu artigo em jornal de grande circulação”.
Primeiro, porque visar a publicação de seu artigo é um desejo natural de todo articulista. Não tem nada de ilegal ou imoral. Ninguém escreve um artigo de interesse específico da classe e de interesse geral da sociedade, como é o caso do artigo impugnado pela douta CORFISP, para deixar guardado em uma gaveta.
Segundo, a expressão “fulano de tal é auditor Fiscal da Receita Estadual de SP eleito pela 1ª Lista Tríplice do Fisco Paulista para Coordenador da Administração Tributária”, que a CORFISP enxergou a figura de usurpação de função pública, deve ser interpretada no seu contexto, e não isoladamente. Evidente o engano do articulista na referência feita à lista do “Fisco Paulista”, quando o certo seria a lista do “SINAFRESP” que procedeu à eleição. É um insulto à inteligência do homem comum supor que o fisco procede eleição; o fisco, quando muito, nomeia ou indica para nomeação o candidato eleito pela classe! Quis o averiguado simplesmente referir-se ao fato de que ele foi eleito pelos seus pares para figurar na lista tríplice para o cargo de Coordenador da Administração Tributária. Ao contrário do aduzido pela douta CORFISP a introdução de uma VÍRGULA pelo Jornal entre a expressão “Coordenação da Administração Tributária” e a palavra “eleito” faz toda diferença em bom português! Sem vírgula, como estava no texto original, significa, tão somente, que o averiguado quis revelar o fato de que foi eleito pelo Sindicato da classe, o que de fato aconteceu, como reconhece a averiguação preliminar. A aposição de VÍRGULA acaba qualificando o averiguado como Coordenador da Administração Tributária eleito, cargo que sequer existe legalmente.
Igualmente equivocada a expressão “Auditor Fiscal da Receita Estadual”, cargo que sequer existe no âmbito estadual; a denominação correta do cargo é “Agente Fiscal de Rendas”. Só falta afirmar que houve tentativa de usurpar o cargo de auditor fiscal da União que é a denominação dada pela legislação federal aos agentes fiscalizadores do tributo. No Município de São Paulo a denominação é a de Inspetor Fiscal. Enfim, Agente Fiscal de Rendas, Auditor Fiscal da Rendas, Inspetor Fiscal são agentes públicos encarregados da fiscalização e arrecadação tributária. O nomen iuris, por si só, nada significa.
Apontou-se a violação dos incisos XIII e XIV, do art. 241 da Lei nº 10.262/08 e do art. 15 da Resolução SF nº 51/07 que assim prescrevem:
“Artigo 241 – São deveres do funcionário:
…
XIII – estar em dia com as leis, regulamentos, regimentos, instruções e ordens de serviço que digam respeito às suas funções; e
XIV – proceder na vida pública e privada na forma que dignifique a função pública.”
Resolução SF nº 51/07:
“Art. 15. É vedado ao Agente Fiscal de Rendas:
…
V – promover ou sugerir publicidade que resulte em dano à imagem do órgão público.”
São absolutamente improcedentes as violações imputadas ao averiguado.
Na realidade, o Agente Fiscal averiguado, ao utilizar a expressão incriminada pela Corregedoria quis simplesmente explicitar o fato de que ele foi eleito pela classe para o cargo de Coordenador da Administração Tributária. Trata-se de mero pleito do SINAFRESP ao qual está filiado o averiguado para introduzir o critério de apresentação de lista tríplice que existe em relação a outras carreiras do funcionalismo público. O certo é que, de fato, as eleições aconteceram e o averiguado figurou na lista tríplice por escolha de seus pares, para oferecer a lista oficiosamente à superior administração a título de sugestão. Onde a infração ao revelar a sua eleição pelos colegas do quadro de fiscalização tributária agrupados no SINAFRESP?
O invocado inciso XIII, nenhuma pertinência tem com os fatos articulados na peça acusatória. Em nenhum momento o averiguado faltou com a observância das leis e demais instrumentos normativos que digam respeito ao exercício de suas funções.
O outro inciso, o de nº XIV diz respeito ao decoro na vida pública e privada que dignifique a função pública. Na verdade, o artigo publicado na Folha tem elevado cunho didático e alcance prático de interesse dos próprios órgãos fazendários e da Administração Pública em geral, à medida que aponta de forma clara e objetiva a perda da arrecadação do Estado, como se não bastassem as notícias veiculadas diariamente pela mídia. A única diferença é que o artigo impugnado aponta as causas da queda de arrecadação, o que revela a necessidade de combater as causas ao invés de ficar remediando mediante medidas paliativas de aumentar a carga tributária. O texto foi revisado pela equipe editorial do SINAFRESP que promoveu sua publicação, sendo certo que é de autoria do averiguado. E, também, a introdução de VÍRGULA entre a expressão “CAT” e a palavra “eleito” foi feita pelo Jornal à revelia do averiguado. Como já demonstrado anteriormente essa vírgula muda completamente o sentido da frase.
Longe de configurar infrações dos apontados incisos XIII e XIV do art. 241 da Lei nº 10.261/68 e o inciso V, do art. 15 da Resolução SF nº 51/07 os fatos narrados pelo averiguado encontram suporte no art. 242, inciso I da mesma lei que assim prescreve:
“Art. 242 – Ao funcionário é proibido:
I – Referir-se depreciativamente, em informação, parecer ou despacho, ou pela imprensa, ou qualquer meio de divulgação, às autoridades constituídas e aos atos da administração, podendo, porém, em trabalho devidamente assinado, apreciá-los sob o aspecto doutrinário e da organização e eficiência do serviço.”
Em outras palavras, o inciso legal sob comento está a permitir expressamente a publicação pela imprensa de artigo assinado desde que revestido de cunho doutrinário e diga respeito à organização e eficiência do serviço público. Só não é permitido referir-se às autoridades constituídas e aos atos da administração de forma depreciativa. Pergunta-se, onde a depreciação das autoridades constituídas ou do órgão fazendário? O Governador? O Secretário? A Coordenação da Administração Tributária? A averiguação feita pela CORFISP no processo nº 24329-1171236 de 2016 não aponta, nem se descobre.
Não há sentido lógico em extrair a existência de dano à imagem do órgão público baseado no fato de que a empresa Folha de São Paulo promoveu imediato direito de resposta à Secretaria da Fazenda em 25-11-16, um dia após a publicação do artigo do Agente Fiscal de Rendas, …. Tem-se a impressão que a douta comissão de averiguação inferiu a ofensa à imagem diretamente do direito de resposta concedida pela Folha. O equívoco é manifesto.
O direito de resposta que está consagrado no art. 2º da Lei nº 13.188/15 insere-se no âmbito do direito fundamental de que decorre a liberdade de expressão. Não significa o reconhecimento do dano à imagem de quem quer que seja. Mesmo uma critica construtiva, de cunho didático, como é o caso sob exame, se publicada pela imprensa pode ensejar o direito de resposta para se contrapor à crítica formulada externando a sua opinião.
Ademais, no caso em tela não há o que se falar em danos à imagem do órgão público, partindo-se da premissa que é natural que seus atos sejam publicamente questionados, criticados, mal interpretados e, inclusive, divulgados de maneira equivocada. Cediço que essas circunstâncias são inerentes a todos os atos praticados por qualquer órgão público, não configurando abalo à imagem ou honra objetiva. Nesse sentido:
“EMENTA. RESPONSABILIDADE CIVIL – MATÉRIA SUPOSTAMENTE FALSA E OFENSIVA PUBLICADA EM SITE DA PREFEITURA – AUTOR REQUEREU A EXCLUSÃO DA MATÉRIA E “DIREITO DE RESPOSTA” – PROCEDÊNCIA EM PARTE – INCONFORMISMO DAS PARTES – CAUTELAR ADMISSÍVEL – INSTRUMENTALIDADE DO PROCESSO – AUTOR É POLÍTICO – É NATURAL QUE ATOS PRATICADOS POR POLÍTICOS SEJAM PUBLICAMENTE QUESTINADOS, CRITICADOS, MAL INTERPRETADOS E, INCLUSIVE, DIVULGADOS DE MANEIRA EQUIVOCADA – INEXISTÊNCIA DE DANO QUE JUSTIFIQUE A RETIRADA DO AR DA MATÉRIA – GARANTIA DO “DIREITO DE RESPOSTA” QUE NO CASO SE MOSTRA SUFICIENTE – SENTENÇA MANTIDA – RECURSOS DESPROVIDOS.”
(Apelação nº 1004064-85.2015.8.26.00624, TJ/SP, 8ª Câmara de Direito Privado, Des. Rel. Grava Brazil, DJ de 29-03-2017).
Finalmente, transcreve-se a judiciosa decisão do STJ a respeito de danos morais relacionados à violação da honra ou imagem da pessoa jurídica de direito público:
“EMENTA. DIREITO CIVIL-CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INFORMAÇÕES VEICULADAS EM REDE DE RÁDIO E TELEVISÃO. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANO MORAL AJUIZADA POR MUNICÍPIO CONTRA O PARTICULAR. IMPOSSIBILIDADE. DIREITOS FUNDAMENTAIS. PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO. RECONHECIMENTO LIMITADO.
- A tese relativa à indenização pelo dano moral decorrente de ofensa à honra, imagem, violação da vida privada e intimidade das pessoas somente foi acolhida às expressas no ordenamento jurídico brasileiro com a Constituição Federal de 1988 (artigo 5º, incisos V e X), que o alçou ao seleto catálogo de direitos fundamentais. Com efeito, por essa ótica de abordagem, a indagação acerca da aptidão de alguém sofrer dano moral passa necessariamente pela investigação da possibilidade teórica de titularização de direitos fundamentais, especificamente daqueles a que fazem referência os incisos V e X do art. 5º da Constituição Federal.
- A inspiração imediata da positivação de direitos fundamentais resulta precipuamente da necessidade de proteção da esfera individual da pessoa humana contra ataques tradicionalmente praticados pelo Estado. É bem por isso que a doutrina vem entendendo, de longa data, que os direitos fundamentais assumem “posição de definitivo realce na sociedade quando se inverte a tradicional relação entre Estado e indivíduo e se reconhece que o indivíduo tem, primeiro, direitos, e, depois, deveres perante o Estado, e que os direitos que o Estado tem em relação ao indivíduo se ordenam ao objetivo de melhor cuidar das necessidades dos cidadãos” (MENDES, Gilmar Ferreira [et. al.]. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 222-223).
- Em razão disso, de modo geral, a doutrina e jurisprudência nacionais só têm reconhecido às pessoas jurídicas de direito público direitos fundamentais de caráter processual ou relacionados à proteção constitucional da autonomia, prerrogativas ou competência de entidades e órgãos públicos, ou seja, direitos oponíveis ao próprio Estado e não ao particular. Porém, ao que se pôde pesquisar, em se tratando de direitos fundamentais de natureza material pretensamente oponíveis contra particulares, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal nunca referendou a tese de titularização por pessoa jurídica de direito público. Na verdade, há julgados que sugerem exatamente o contrário, como os que deram origem à Súmula n. 654, assim redigida: “A garantia da irretroatividade da lei, prevista no art. 5º, XXXVI, da Constituição da República, não é invocável pela entidade estatal que a tenha editado”.
- Assim, o reconhecimento de direitos fundamentais – ou faculdades análogas a eles – a pessoas jurídicas de direito público não pode jamais conduzir à subversão da própria essência desses direitos, que é o feixe de faculdades e garantias exercitáveis principalmente contra o Estado, sob pena de confusão ou de paradoxo consistente em se ter, na mesma pessoa, idêntica posição jurídica de titular ativo e passivo, de credor e, a um só tempo, devedor de direitos fundamentais, incongruência essa já identificada pela jurisprudência do Tribunal Constitucional Alemão (BVerfGE 15, 256 [262]; 21, 362. Apud. SAMPAIO, José Adércio Leite. Teoria da Constituição e dos direitos fundamentais. Belo Horizonte: Del Rey, 2013 p. 639).
- No caso em exame, o reconhecimento da possibilidade teórica de o município pleitear indenização por dano moral contra o particular constitui a completa subversão da essência dos direitos fundamentais, não se mostrando presente nenhum elemento justificador do pleito, como aqueles apontados pela doutrina e relacionados à defesa de suas prerrogativas, competência ou alusivos a garantias constitucionais do processo. Antes, o caso é emblemático e revela todos os riscos de se franquear ao Estado a via da ação indenizatória.
- Pretende-se a responsabilidade de rede de rádio e televisão local por informações veiculadas em sua programação que, como alega o autor, teriam atingido a honra e a imagem da própria Municipalidade. Tal pretensão representa real ameaça a centros nervosos do Estado Democrático de Direito, como a imprensa livre e independente, ameaça que poderia voltar-se contra outros personagens igualmente essenciais à democracia.
- A Súmula n. 227/STJ constitui solução pragmática à recomposição de danos de ordem material de difícil liquidação – em regra, micro danos – potencialmente resultantes do abalo à honra objetiva da pessoa jurídica. Cuida-se, com efeito, de resguardar a credibilidade mercadológica ou a reputação negocial da empresa, que poderiam ser paulatinamente fragmentadas por violações a sua imagem, o que, ao fim e ao cabo, conduziria a uma perda pecuniária na atividade empresarial. Porém, esse cenário não se verifica no caso de suposta violação à imagem ou à honra – se existente – de pessoa jurídica de direito público.
- Recurso especial não provido.” (REsp nº 1.258.389-PB, STJ, Quarta Turma, Min. Rel. Luis Felipe Salomão, DJE de 15–04-2014)
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Neste quadrante, de modo geral, a doutrina e jurisprudência só têm reconhecido às pessoas jurídicas de direito público os direitos fundamentais de caráter processual e direitos oponíveis ao próprio Estado (autonomia e prerrogativas), e não ao particular.
Não cabe, pois, cogitar-se de atentando à imagem de autoridades ou de órgão públicos que pudesse desencadear a incidência dos incisos legais apontados pela CORFISP, quais sejam, os incisos XIII e XIV, do art. 241 da Lei nº 10.261/08 e o inciso V, do art. 15 da Resolução SF, nº 51/07.
Outrossim, é disparatada a acusação de dupla usurpação da função pública pelo Agente Fiscal Gustavo Theodoro:
Primeiro porque exerceu atividade privativa da área de Comunicação da Assessoria do Gabinete do Secretário.
Em segundo lugar porque o averiguado autointitulou-se Coordenador da Administração Tributária.
Evidente a confusão entre divulgação oficial do Agente Público de qualquer informação ou de atividades da Administração Tributária utilizando-se de meios do poder público, com a divulgação privada feita individualmente pelo SINAFRESP em nome do Agente Fiscal …., sem utilização de qualquer recurso público, material ou pessoal.
Quanto ao segundo aspecto já foi suficientemente esclarecido que o Agente Fiscal … não firmou o artigo como Coordenador da Administração Tributária, mas, simplesmente inseriu no final do texto uma referência ao fato dele ter sido eleito para o aludido cargo na primeira lista tríplice elaborada pelo SINAFRESP.
Indubitável que … não atuou na condição de agente público, mas sim como particular. O artigo “A crise paulista bate à porta” foi veiculado pela imprensa particular e em seu nome próprio. Em nenhum momento o Agente Fiscal se valeu de atos oficiais ou de quaisquer outros meios disponibilizados ou financiados pelos cofres públicos.
Trata-se de ato exclusivamente particular, não tendo o Sr … agido em nome do Governo do Estado de São Paulo e tampouco investido como agente público, cargo que titulariza.
Corroborando com tal entendimento, encontramos no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, um caso que, mutatis mutandis, muito se assemelha ao apresentado pelo Consulente. Vejamos:
“EMENTA. RESPONSABILIDADE CIVIL – DANOS MORAIS – EMBATE POLÍTICO – INOCORRÊNCIA.
I – Autora que pleiteia indenização por danos morais em razão de supostos atos ofensivos perpetrados por secretário do município.
II – Réu que não atuou na condição de agente público, mas sim como particular. Ilegitimidade passiva da Municipalidade.
III – Supostas ofensas lançadas pelo réu contra a autora – Resposta a artigo publicado na imprensa local – Ausência de ofensas ou palavras de baixo calão – Embate político comum e natural em cidades do interior – Potencial lesivo não constatado. Sentença de improcedência mantida. Recurso improvido.
…………………………………………..
III – Correta a exclusão da Municipalidade.
A resposta proferida pelo réu Luis José se deu através da imprensa particular e em seu nome próprio. Não se valeu de atos oficiais ou de outros meios disponibilizados ou bancados pelos cofres públicos.
Logo, tratou-se de ato exclusivamente particular, não tendo agido em nome da Municipalidade ou investido como agente público. Não merece assim ser acionada para este fim. (Apelação nº 0008399-25.2010.8.26.0053, TJ/SP, 5ª Câmara de Direito Público, Des. Rel. Nogueira Diefenthäler, DJ de 17-09-2012).
Finalmente, sem sentido algum a tentativa de enquadrar o articulista nas condutas tipificadas no art. 299 e 328 do CP.
O crime de falsidade ideológica tem caráter doloso consistente na inserção de falsa declaração ou diversa da que deveria estar escrita, ou na omissão de declaração de que deveria constar do instrumento, com o fito de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sob fato jurídico relevante. Não houve omissão, nem inserção de falsa declaração, muito menos dolo.
Quanto ao art. 328 do CP, também não se caracteriza simplesmente porque o Agente … em momento algum exerceu de fato as atribuições correspondentes ao cargo/função de Coordenador da Administração Tributária. Qualquer manual de Direito Administrativo traz o conceito de “exercer o cargo ou a função publica”. Outrossim, divulgar texto pela imprensa não é e nunca foi atribuição do Coordenador da Administração Tributária. Como falar-se em usurpação de atribuição que o próprio titular do cargo não tem?
O que o averiguado fez outra coisa não é senão o de exercer o seu sagrado direito de expressar livremente o seu pensamento, trazendo à luz relevantes considerações de ordem doutrinária e prática em texto por ele assinado que vêm de encontro aos princípios que regem a administração pública insertos no art. 37 da Constituição Federal.
No que tange às medidas de contenção de política tributárias que esvaziam parcialmente as receitas públicas derivadas – bem público essencial –, o artigo incriminado chama atenção para a observância, na hipótese de eventual renúncia fiscal, dos requisitos previstos no art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF, para preservar os requisitos essenciais da responsabilidade na gestão fiscal de que cuida o art. 11 da mesma Lei.
Finalmente, a publicação de texto sobre matéria debatida entre os Agentes Fiscais de Rendas do Estado levada a efeito pelo averiguado, por intermédio do SINAFESP, atende ao princípio da transparência da gestão fiscal que está consagrado no art. 48 da LRF:
“Art. 48. São instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos.”
Conforme salientado em nossa obra, “o art. 48 cuida de dar absoluta transparência ao controle e fiscalização da execução orçamentária, através das três modalidades, o controle interno, o controle externo e o controle privado, articulado com o princípio da publicidade, que confere eficácia e moralidade aos atos de execução. É de fundamental importância para o exercício da cidadania, por exemplo, a divulgação do parecer prévio sobre as contas do Chefe de Executivo, cuja aprovação ou rejeição fica na dependência exclusiva do Poder Legislativo, que pode decidir até politicamente.” [9]
RESPOSTAS AOS QUESITOS
- O autor do artigo está exercendo o seu direito de expressão garantido pela Constituição Federal?
R: Sim. A liberdade de expressão está prevista no inciso IV, do art. 5º da CF que apenas veda o anonimato. O § 2º, do art. 74 da CF, por sua vez, assegura a qualquer cidadão denunciar irregularidade ou ilegalidade perante o Tribunal de Contas competente.
- Na condição de servidor público da Secretaria da Fazenda do Estado, pode o autor do artigo manifestar críticas contra aquele órgão que digam respeito à forma de trabalho, planejamento, arrecadação tributária e outros assuntos?
R: Sim, a ressalva está prevista no próprio inciso I, do art. 243 da Lei nº 10.261/68 que enumera as proibições do funcionário.
- O artigo escrito pelo Agente Fiscal de Rendas … diz respeito a interesse público?
R: Sim, contém posicionamento doutrinário de interesse da administração tributária do Estado apontando objetivamente as causas da queda de arrecadação noticiada pela mídia com relativa frequência. Aponta a situação do Rio, cuja falência financeira não é mais segredo de ninguém.
- A produção e publicação de artigos por parte de agente fiscal de rendas, servidor público estadual, depende de prévia autorização de superior hierárquico, ou do Secretário da Fazenda? Existe proibição contida no Estatuto dos Servidores Públicos Civis do Estado de São Paulo (Lei 10.261/68)?
R: A publicação feita pelo servidor público em caráter individual e à suas expensas independe de prévia autorização de seu superior hierárquico. Essa faculdade está contida no já citado inciso I, do art. 243 da Lei nº 10.262/68.
- Ao se identificar como “Coordenador da Administração Tributária eleito pela lista tríplice” o autor cometeu alguma ilegalidade? Houve algum prejuízo para a administração pública ou ao interesse público? Houve crime de falsidade ideológica?
R: O autor do artigo, como se depreende do corpo deste parecer, quis referir-se ao fato verídico de que ele havia sido eleito para figurar na lista tríplice elaborada pelo SINAFRESP. Nenhum dano material ou moral resultou para a Administração Pública. A conduta narrada pela CORFISP é atípica. Não preenche os requisitos do art. 299 que tipifica o crime de falsidade ideológica.
- O autor cometeu alguma ilegalidade ao deixar de comunicar suposta irregularidade?
R: Não. A política tributária do Estado criticada pelo averiguado era e é do conhecimento de todos os servidores vinculados à Secretaria da Fazenda do Estado, inclusive, do Secretário que implementa essa política.
- Na apuração preliminar houve levantamento de suposto cometimento de crime de falsidade ideológica, pelo fato de autor não ter atualizado seu domicílio perante a Secretaria da Fazenda. Esta situação configura o mencionado ilícito penal?
R: Não. Inconfundível do ponto de vista jurídico o conceito de domicílio e de residência. Aquele expressa animus definitivo de se fixar em determinado local; este significa simplesmente o local em que mora sem aquele animus.
- A publicação do artigo na Folha de São Paulo atingiu a imagem e a honra da entidade política e de seus órgãos?
R: Não. O artigo limitou-se a divulgar, de forma didática, fatos públicos e notórios veiculados pela mídia. Outrossim, consoante pronunciamento pacífico da doutrina e da jurisprudência de nossos tribunais não cabe a cogitação de dano à imagem ou à honra de órgãos públicos e de seus agentes, porque na seara dos direitos fundamentais as pessoas jurídicas de direito público são apenas titulares daqueles direitos de caráter processual e daqueles oponíveis ao próprio Estado (autonomia e prerrogativas), nunca ao particular.
É o nosso parecer.
São Paulo, 06 de julho de 2017.
_________________________ _______________________
Kiyoshi Harada Marcelo Kiyoshi Harada
OAB/SP 20.317 OAB/SP nº 211349
[1] “Artigo 25 – A Assessoria do Gabinete do Secretário tem as seguintes atribuições:
………
VI – na área de comunicação:
- a)as previstas no artigo 8º do Decreto nº 52.040, de 7 de agosto de 2007;
- b)zelar pela imagem e credibilidade da Secretaria diante da opinião pública por meio do relacionamento com os órgãos de comunicação e da divulgação de suas atividades;
- c)promover e coordenar a comunicação institucional no âmbito interno e externo da Secretaria;
- d)desenvolver, atualizar e garantir a observância do Plano de Comunicação da Secretaria;
- e)assessorar os dirigentes da Secretaria no relacionamento com os órgãos de comunicação,
além de participar como facilitador e incentivador dessa interação;
- f)acompanhar a posição da mídia com respeito ao campo de atuação da Secretaria;
- g)promover, de forma clara e transparente, a difusão de informações referentes a direitos do cidadão, serviços públicos, programas colocados à disposição da Secretaria, bem como a ações de responsabilidade fiscal;
- h)disponibilizar ao público, no sítio da Secretaria, as informações atualizadas pertinentes ao campo funcional da Pasta;
- i)divulgar e acompanhar informações da Pasta nas diferentes mídias do Governo do Estado;
- j)orientar e prestar apoio ao Secretário e demais autoridades da Pasta sobre assuntos relativos às relações públicas e institucionais;
- k)promover a contratação, bem como gerenciar e acompanhar o trabalho de agências e consultorias de propaganda e comunicação no desenvolvimento de demandas relacionadas à Secretaria;
- l)elaborar, produzir e padronizar material visual de suporte às atividades internas e externas da Secretaria, obedecidas as normas do Governo do Estado;
- m)estabelecer normas, organizar e executar serviços protocolares e de cerimonial;
- n)organizar eventos propostos pelo Gabinete do Secretário, com a presença do Titular da Pasta;
- o)executar serviços relacionados com as audiências e representações do Titular da Pasta;
- p)dar apoio ao Secretário em assuntos relacionados à sua área de atuação;”
[2] “Artigo 143 – O Secretário da Fazenda, além de outras que lhe forem conferidas por lei ou decreto, tem as seguintes competências:
…..
II – em relação às atividades gerais da Secretaria
:…..
- j)autorizar:
entrevistas de servidores da Secretaria à imprensa em geral sobre assuntos da Pasta;
2. a divulgação de assuntos da Secretaria, quando não tornados públicos, em congressos, palestras, debates ou painéis;”
[3] “Usurpação de função pública
Art. 328 – Usurpar o exercício de função pública:
Pena – detenção, de três meses a dois anos, e multa.
Parágrafo único – Se do fato o agente aufere vantagem:
Pena – reclusão, de dois a cinco anos, e multa.”
[4] “Falsidade ideológica
Art. 299 – Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante:
Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, se o documento é particular.
Parágrafo único – Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de registro civil, aumenta-se a pena de sexta parte.”
[5] “Artigo 302 – Quando ao funcionário se imputar crime, praticado na esfera administrativa, a autoridade que determinou a instauração do processo administrativo providenciará para que se instaure, simultaneamente, o inquérito policial. (NR)
Parágrafo único – Quando se tratar de crime praticado fora da esfera administrativa, a autoridade policial dará ciência dele à autoridade administrativa. (NR)”
[6] “Artigo 241 – São deveres do funcionário:
……………………….
II – cumprir as ordens superiores, representando quando forem manifestamente ilegais;”
[7] “XIII – estar em dia com as leis, regulamentos, regimentos, instruções e ordens de serviço que digam respeito às suas funções; e”
[8] No dia 1º de junho de 2011 o STF julgou 14 ADIs considerando inconstitucionais os incentivos fiscais concedidos unilateralmente por diversos Estados da Federação sem modulação de efeitos, causando gravíssimos problemas financeiros aos contribuintes envolvidos nas operações incentivadas. Até hoje diversos projetos legislativos estão sendo discutidos no Congresso Nacional para a solução dos problemas decorrentes de incentivos fiscais invalidados pelo Supremo Tribunal Federal com efeito ex tunc.
[9] Cf. nosso Responsabilidade fiscal. São Paulo: Juarez de Oliveira,2002, p. 206-207.