Em todo condomínio é indispensável a figura do síndico para zelar pelo bem-estar dos condôminos, propiciando-lhes a indispensável segurança e tranquilidade, nos limites do regimento interno aprovado pela Assembleia Geral dos condôminos.
Ele deve atuar para coibir o mau uso das áreas comuns, das garagens, bem como prática de quaisquer atos que perturbam a tranquilidade e o sossego dos demais condôminos.
Deve o síndico contar com a colaboração de um zelador para cuidar da supervisão geral da limpeza geral das áreas comuns, adotar providências para reparação de equipamentos e instalações do prédio, assim como exercer o controle da recepção do prédio.
Desde que a Covid-19 chegou ao nosso País tem sido muito grande a preocupação dos condôminos ou usuários de prédios condominiais com o item relacionado à salubridade, a fim de preservar ao máximo a saúde dos moradores ou usuários do condomínio.
Assim é que, independentemente de regulamentação legal específica, muitos síndicos de vários prédios já vinham implementado, sem oposição dos moradores ou usuários, medidas restritivas como, por exemplo, a interdição de uso das piscinas, dos salões de jogos, dos salões de festas, da quadra de esportes, do fitness Center, assim como limitação de uso das áreas de lazer. Alguns síndicos chegaram a vedar a utilização do mesmo elevador por pessoas de famílias diferentes. Ouros limitaram o uso das garagens por familiares ou pessoas amigas que não residem no prédio condominial.
Quando há bom-senso de todos, essas restrições são aceitas com naturalidade e todos os moradores as respeitam.
Acontece que o bom-senso não é algo inato à criatura humana. O egoísmo, o individualismo que jaz no interior das pessoas faz com que as regras de uma boa convivência social não sejam observadas, às vezes, nem mesmo quando houver imposição legal, dando origem a inúmeras demandas judiciais, que se multiplicam ao longo do tempo. Tamanhos são os comportamentos antissociais apresentados por certos condôminos que em alguns condomínios há a necessidade de contratar um síndico profissional, devido à recusa dos condôminos em assumir esse cargo ingrato.
Em época de pandemia esses conflitos entre os condôminos tendem a aumentar. Pessoas existem que promovem comemorações de datas natalícias, reunindo em espaço apertado parentes e amigos pela madrugada adentro. Circulam nas áreas comuns, sem observar os protocolos previstos nas instruções médicas (uso de máscaras).
Pois bem, tendo em vista a situação excepcional causada pela pandemia, decorrente da Covid-19, o Congresso Nacional, por iniciativa do Senado Federal, aprovou a Lei nº 10.010, de 10-6-2020, dispondo sobre o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das Relações Jurídicas de Direto Privado no período de pandemia do coronavírus (Covid-19).
Essa legislação, que fixa o dia 20 de março de 2020, data de decretação do estado de calamidade pública pelo Decreto Legislativo nº 6/20, como sendo o termo inicial dos eventos derivados da pandemia vigorará até o dia 30 de outubro de 2020, quando se presume o fim do isolamento social.
No que pertine a condomínios edilícios esta lei sob comento dispõe dos arts. 11 a 13 adiante comentados.
Apesar do título dado a esse artigo “Podres excepcionais do Síndico”, na verdade, trata-se de ex poder excepcional por conta do infeliz veto aposto pelo Executivo ao art. 11, como mais adiante veremos.
O art. 12 da lei em questão permite a realização de Assembleia Geral, até o dia 30 de outubro de 2020, por meio virtual, caso em que a manifestação de vontade de cada condômino será equiparada, para todos os efeitos jurídicos, à sua assinatura presencial. Essa Assembleia Geral poderá deliberar, por maioria absoluta de seus membros (metade mais um) sobre a destituição do síndico que tiver praticado irregularidades, que não prestar contas, ou não administrar convenientemente o condomínio.
Essa Assembleia poderá, ainda, convocar o síndico para aprovar o orçamento das despesas, as contribuições dos condomínios, a prestação de contas e eventualmente eleger-lhe o substituo, bem como alterar o regimento interno. O seu parágrafo único prescreve que em caso de impossibilidade de Assembleia Geral pela forma virtual, os mandatos de síndico vencidos a partir de 20 de março de 2020 ficam prorrogados até o dia 30 de outubro de 2020.
O art. 13 versa sobre a obrigatoriedade do síndico de prestar contas regulares dos atos de administração sob pena de destituição, uma disposição desnecessária, pois isso já está contemplado pelas normas legais permanentes aplicáveis ao síndico.
O mais importante dispositivo, o único que motivou a iniciativa dos congressistas, porque relevante para a época de pandemia, foi equivocadamente vetado elo Chefe do Executivo. Refiro-me ao art. 11 que assim estava prescrito:
“Art. 11. Em caráter emergencial, até 30 de outubro de 2020, além dos poderes conferidos ao síndico pelo art. 1.348 do Código Civil, compete-lhe:
I – restringir a utilização das áreas comuns para evitar a contaminação pelo coronavírus (Covid-19), respeitado o acesso a propriedade exclusiva dos condôminos;
II – restringir ou proibir a realização de reuniões e festividades e o uso dos abrigos de veículos por terceiros, inclusive nas áreas de propriedade exclusiva dos condôminos, como medida provisoriamente necessária para evitar a propagação do coronavírus (Covid-19), vedada qualquer restrição ao uso exclusivo pelos condôminos e pelo possuidor direto de cada unidade.
Parágrafo único. Não se aplicam as restrições e proibições contidas neste artigo para casos de atendimento médico, obras de natureza estrutural ou realização de benfeitorias necessárias.”
O infeliz veto presidencial está estribado nos seguintes termos:
“A propositura legislativa, ao conceder poderes excepcionais para os síndicos suspenderem o uso de áreas comuns e particulares, retira a autonomia e a necessidade das deliberações por assembleia, em conformidade com seus estatutos, limitando a vontade coletiva dos condôminos.”
Ora, o dispositivo vetado estava apenas positivando o que na prática já vinha acontecendo, baseado no bom-senso a exigir medidas excepcionais em momentos expressionais decorrentes da Covid-19. E também, não se pode sustentar que o art. 11 vetado representava uma inovação legislativa, pois, aquelas medidas restritivas decorrem tanto do Código Civil, como da Lei de Incorporação imobiliárias, Lei nº 4.591/64. Poder-se-ia sustentar que aquele art. 11 representava uma melhor explicitação do que está no ordenamento jurídico em vigor, por atinar com o bom-senso de que falamos no início. As próprias autoridades governamentais estão vetando a realização de reuniões e a realização de festejos que impliquem concentração de pessoas, mesmo em ambientes privados.
O Executivo, muito mal orientado, vetou o único dispositivo que justificava a edição de um diploma legal emergencial e temporário, visando à preservação da saúde, da segurança e da salubridade no recinto condominial. Não faz sentido exigir Assembleia Geral para a tomada de medidas urgentes e necessárias para a segurança dos condôminos.
Os artigos restantes, artigos 12 e 13, pouco ou nada têm a ver com o estado de calamidade pública decorrente da Covid-19. Esse veto ao art. 11 foi um verdadeiro tiro no pé. Revela a dissintonia existente entre o Parlamento e o Executivo. Não é porque uma boa lei foi de iniciativa do Poder Legislativo que ela deva ser vetada em seu dispositivo mais importante
SP, 22-6-2020.