Sumário: 1 Introdução. 2 Matéria que pode ser abordada na exceção de pré-executividade. 3 Efeitos da exceção de pré-executividade. 4 Recursos cabíveis. 5 Considerações finais.
I Introdução
A principal e talvez a única utilidade prática da exceção de pré-executividade é a de proporcionar o direito de defesa como alternativa de embargos à execução fiscal que, na generalidade dos casos, não pode prescindir da prévia garantia do juízo, por meio de penhora de bens do devedor, ou depósito em dinheiro, ou ainda, por meio de fiança bancária [1]
Esse meio processual de defesa não tem previsão legal. Ele é uma criação pretoriana dos tribunais para, em determinados casos, dispensar a formalidade da penhora para exercer o direito de defesa por meio da ação de desconstituição do título executivo, sempre dispendioso para o executado que, muitas vezes, não dispõe de bens suficientes para oferecer à penhora, restando o dispendioso recurso da fiança bancária.
2 Matéria que pode ser abordada na exceção de pré-executividade
A jurisprudência foi pouco a pouco definindo o campo de abrangência da execução de pré-executividade, sendo certo que em qualquer hipótese descarta-se a matéria que exija dilação probatória. Limita-se, assim, à questão de direito. Quando se tratar de abordagem de matéria fática há que estar acompanhada de prova pré-constituída, a exemplo do que ocorre na impetração de mandado de segurança. É o caso de execução de crédito tributário já satisfeito anteriormente.
Neste caso, o executado deverá comprovar a identidade do crédito tributário sob execução e aquele extinto pelo seu pagamento. É hipótese rara!
Na maioria dos casos, conforme jurisprudência em vigor, resume-se à alegação de prescrição e de decadência que são matérias conhecíveis de ofício.
Dispõe a Súmula 393 do STF:
“A exceção de pré-executividade é admissível na execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de ofício que não demandem dilação probatória.”
Além dessas duas matérias, à luz da Súmula 393 do STJ, pode-se incluir a alegação da nulidade da certidão de dívida ativa, por ausência de elementos enumerados no § 5º, do art. 2º da LEF (Lei 6.830/1980), ou aqueles previstos no art. 202 do CTN.
Só que, neste caso, a jurisprudência do STJ está permitindo a emenda da CDA a qualquer tempo.
A ilegitimidade passiva ad causam, também, é matéria que dispensa a dilação probatória. A pessoa cujo nome não consta da CDA, por exemplo, não é pessoa legitimada a figurar no polo passivo da execução.
Nesta hipótese, o STJ, igualmente, está permitindo o aditamento da CDA a qualquer tempo, o que prejudica o exercício ao direito de impugnar a execução fiscal por meio de exceção de pré-executividade.
N’uma e n’outra hipótese há violação do devido processo legal ao permitir que uma das partes altere a situação fática após a apresentação da impugnação pela outra parte.
Alguns julgados do STJ permitem o redirecionamento da execução fiscal para sócios que sequer constam da CDA, desobedecendo, em bloco, os requisitos previstos nos arts. 134 e 135 do CTN.
Assim, na prática, a exceção de pré-executividade limita-se às hipóteses de prescrição e de decadências tributárias.
3 Efeitos da exceção de pré-executividade
Como dissemos na parte introdutória, a principal utilidade da exceção de pré-executividade, talvez a única, é a de substituir os embargos à execução que exigem prévia garantia do juízo.
A interpretação sistemática da LEF conduz claramente à existência do efeito suspensivo tanto dos embargos à execução [2], quanto da apelação interposta contra sentença que rejeita os embargos. Não é de se aplicar, portanto, o art. 919 do CPC a pretexto de aplicação subsidiária. Se assim fosse deveria, também, dispensar a penhora prévia para admissão de embargos à execução fiscal por aplicação subsidiária do art. 936 do CPC.
O que não é possível juridicamente, sob pena de quebra do princípio de paridade das partes, em nome da teoria do diálogo das fontes, é aplicar subsidiariamente as disposições genéricas do CPC que favorecem a Fazenda, e não invocar a mesma aplicação subsidiária das normas do CPC naquilo que favorece o contribuinteexecutado.
Concluindo esse tópico, a exceção de pré-executividade tem o condão de suspender a execução.
Atenta contra o princípio da razoabilidade a continuidade da execução na pendência de exceção de pré-executividade.
De fato, a execução fiscal não pode prosseguir sobrevindo os embargos à execução mediante prévia garantia do juízo. E se o juízo estiver garantido não faria sentido ao executado defender-se pela estreita via processual da exceção de pré-executividade. A exceção de pré-executividade atua como sucedâneo aos embargos à execução fiscal que exigem a garantia do juízo surtindo o mesmo efeito destes.
Autores que sustentam o contrário, mediante a invocação do art. 151 do CTN, que enumera em seus incisos I a VI as hipóteses de suspensão de exigibilidade do crédito tributário, laboram, data vênia, em equívoco. Não há que se buscar na ordem jurídica positivada casos de suspensão da exigibilidade de crédito tributário e, por conseguinteda suspensão da execução fiscal se a exceção de pré-executividade, como a dissemos de início, é figura processual criada pela jurisprudência. Ela não tem previsão quer na LEF, quer no CPC pelo que não se cogita em hipótese legal de suspensão de exigibilidade do crédito tributário e, por conseguinte, do processo de execução.
Por isso, soa estranho alguns raros exemplos de decisões do STJ que não conhecem do Resp por ausência de indicação do dispositivo legal que autorize a impetração da execução de pré-executividade.
4 Recursos cabíveis
Por ser matéria não normalizada no nosso ordenamento jurídico, a jurisprudência vem decidindo por meio de aplicação analógica dos dispositivos do CPC os recursos cabíveis em cada caso:
a) Em caso de rejeição, por impertinência, ou qualquer outra razão que leve à extinção da ação sem exame do mérito, o recurso cabível é o de agravo de instrumento pela aplicação subsidiária do art. 1015 do CPC (Resp nº 792.767/RS e Resp nº 889082/RS);
b) Em caso de procedência da exceção apresentada, o recurso cabível é o de apelação por aplicação do art. 1009 do CPC (Resp nº 613.702/PA). De igual forma, cabe o recurso de apelação no caso de rejeição da exceção pelo exame do mérito.
5 Considerações finais
A evolução da jurisprudência do STJ no sentido de favorecer a Fazenda, às vezes, mediante inovação da ordem jurídica vigente, tem restringido bastante o uso dessa medida excepcional de defesa do contribuinte, sem se sujeitar à penhora de seus bens. Praticamente ficou limitada às hipóteses de prescrição e de decadência.
O certo seria estender a regra do art. 914 do CPC às execuções fiscais possibilitando os embargos à execução sem prévia garantia do juízo, quando, então, a exceção de pré-executividade perderia a razão de sua existência.
SP, 13-12-2021.
[1] Art. 16, § 1º da LEF: “Não são admissíveis embargos do executado antes de garantida a execução.
[2] At. 8º; § 1º, do art. 16; art. 19; art. 24, I; e § 2º, do art. 32 da LEF. Tanto assim é que PL nº 406/2012 em tramitação no Congresso Nacional acrescenta o § 4º ao art. 16 da LEF prevendo a não suspensão da execução pela superveniência dos embargos. Na Comissão de Direito Tributário da Fecomércio que coordenamos apresentamos um substitutivo àquele dispositivo acrescido nos seguintes termos: “§ 4º. Os embargos terão efeito suspensivo”.
* Texto publicado no Migalhas, edição nº 5.246, de 10-12-2021.
Por Kiyoshi Harada