Tributação da folha de pagamento e regime substitutivo

A substituição da contribuição social patronal incidente sobre a folha de remuneração, pela tributação incidente sobre a receita bruta deve ser facultativa, sob pena de ofensa aos princípios da isonomia, da capacidade contributiva e da livre concorrência.

Como se sabe, com fundamento no § 13, do art. 195 da CF a Medida Provisória nº 540/11, convertida na Lei nº 12.546/11, alterou o regime de tributação incidente sobre a folha de remuneração em relação a determinados setores da atividade econômica, para o regime de tributação com base na receita bruta.

Para clareza transcrevamos os §§ 13 e 12, do art. 195 da CF:

§13.Aplica-se o disposto no§ 12inclusive na hipótese de substituição gradual, total ou parcial, da contribuição incidente na forma doinciso I, a, pela incidente sobre a receita ou o faturamento.

§12.A lei definirá os setores de atividade econômica para os quais as contribuições incidentes na forma dosincisos I, b; eIV do caput, serão não-cumulativas.

Aquela lei ficou batizada como sendo medida de desoneração da folha, apesar de ter ido além do texto constitucional autorizativo que se refere a receita ou o faturamento. A qualificação bruta, dada pelo legislador ordinário, não tem matriz constitucional. Sucessivas alterações introduzidas vêm aumentando o rol de empresas enquadradas no novo regime, passando ultimamente a alcançar setores da atividade econômica voltados para a área de informática ou setores comerciais que operam com venda por meios eletrônicos.

É claro que em relação a essas últimas empresas, que praticamente dispensam o quadro de empregados, a substituição da tributação prevista nos incisos I e II, do art. 22 da Lei nº 8.212/91, pela tributação de 2% incidente sobre a receita bruta representa um impacto tributário de monta que pode até inviabilizar a continuidade dos seus negócios. Desoneração da folha não pode implicar sua substituição pelo regime mais gravoso, pois não é essa a intenção do legislador constituinte.

Embora o texto constitucional autorize a substituição gradual e por setores há que se respeitar os princípios tributários da isonomia e da capacidade contributiva, bem como o princípio econômico da livre concorrência.

O princípio de isonomia não permite tratamento desigual entre empresas sob as mesmas situações fáticas, nem tratamento igual entre empresas que se encontram sob pressupostos fáticos diferenciados. O princípio da capacidade contributiva é o desdobramento do princípio maior da isonomia tributária, à medida que igualar os desiguais implica tributação além do que é possível pagar.

Por isso, aquele § 13, c.c. § 12 não pode ser interpretado isoladamente, mas de acordo com o princípio da harmonia, princípio da concordância prática ou princípio da unidade constitucional.

A validade de um texto constitucional não pode ser extraída à custa do esvaziamento total ou parcial de outros textos constitucionais. A interpretação há de ser concorde com todos os dispositivos constitucionais pertinentes.

Conclui-se, dessa forma, que a substituição do regime de tributação da folha pelo da tributação da receita bruta é facultativa. Deve ser assegurado ao contribuinte o direito de permanência no regime tributário original enquanto ele subsistir.

Algumas decisões judiciais que determinam a exclusão do ICMS ou do ISS da base de cálculo da contribuição social sobre a receita bruta, além de incertas e sujeitas à suspensão pelas instancias superiores, não resolvem os problemas enfrentados pelas empresas que apresentam receitas brutas desproporcionais em relação ao custo da mão de obra, seja pelo emprego de tecnologias avançadas, seja pela peculiaridade da atividade econômica desenvolvida.

Em face das notórias dificuldades de acolhimento pelo Judiciário atual da tese da facultatividade do novo regime tributário resta apenas a solução legislativa.

Nesse sentido, bastaria acrescentar o § 8º ao art. ­­­7º, da Lei nº 12.546/2011, facultando expressamente a permanência no regime de tributação previsto nos incisos I e II, do art. 22 da Lei nº 8.212/91, enquanto subsistir essa modalidade de tributação. É, aliás, a medida que deveria ter constado desde o início para fazer jus à ideia de desoneração tributária ventilada pelo governo por ocasião da elaboração da Medida Provisória de nº 540/11.

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